Facturas sem papel: empresas decidem se (e quando) aderem

Projecto do fisco avança no início de 2019. É voluntário para lojas e consumidores. Quem quiser, continua a pedir as facturas em papel.

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As empresas poderão disponibilizar as facturas digitais através de aplicações, por exemplo Nuno Ferreira Santos

O projecto “Factura sem papel” vai arrancar no início do próximo ano, mas cada empresa terá liberdade de decidir se quer ou não aderir — e quando — à nova iniciativa do fisco, garante ao PÚBLICO o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes.

A medida vai permitir que as empresas comuniquem à administração fiscal e aos consumidores as facturas de forma digital e em tempo real. Mas cada vendedor continua a estar obrigado a ter as máquinas de impressão dos comprovativos, porque em última instância são os consumidores que decidem, em cada compra, se querem receber a factura em papel (como hoje acontece) ou através de um meio digital (que caberá a cada loja disponibilizar).

Como o projecto é de adesão voluntária, os vendedores decidem entrar quando entenderem que têm condições para isso (as empresas terão de mexer nos sistemas informáticos e pagar pela adaptação dos programas de facturação, mas algumas – como as cadeias de distribuição – já estarão a preparar-se).

O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais confirma que o Governo está a ultimar o diploma para o aprovar até ao fim de 2018. A expectativa é a de que a medida esteja no terreno no início do próximo ano. Mas o Governo não se compromete com uma data fixa para a entrada do diploma em vigor (dependerá da aprovação e da promulgação).

A partir desse momento, as empresas terão liberdade para decidir quando passam a disponibilizar a factura digital, ou seja, as que estiverem mais preparadas para dar esse passo poderão fazê-lo a partir daí. “Há muitos prestadores de serviços, nomeadamente na grande distribuição, que já gostariam de ter esta possibilidade”, afirma Mendonça Mendes, reforçando que a medida avança “em função da capacidade dos operadores económicos”.

É uma espécie de “Factura 2.0”: o que se espera é que a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) receba as facturas digitais depois de uma compra acontecer numa loja.

O Governo de António Costa previa, inicialmente, que as facturas enviadas ao fisco passassem a discriminar exactamente o que uma pessoa comprou ou consumiu numa loja (a autoridade tributária passaria a saber se uma pessoa bebeu um chá ou um sumo), mas, afinal, isso não vai acontecer.

Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) apontou críticas severas a essa norma, alertando para um retrocesso nos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. E o Governo recuou: o tipo de informação que o fisco vai conhecer é semelhante ao que hoje lhe chega (em que os detalhes das facturas não são transmitidos na íntegra).

Mendonça Mendes garante: “A AT vai continuar a receber o que já recebia antes. Qual é a diferença? Vai receber em tempo real (no momento em que a factura é emitida é automaticamente comunicada à autoridade tributária)”.

Lojas-consumidores

Será assim a relação empresas-fisco. Já entre os vendedores e os consumidores, caberá a cada empresa decidir o meio pelo qual faz chegar a factura digital. Aí, o consumidor continua a poder ver exactamente o que comprou.

“As empresas terão a liberdade de apresentar a factura [por outro meio] que não através do papel”. Tudo “dependerá da solução que cada operador tenha para disponibilizar, seja através de uma aplicação, seja através do email. Há muitas soluções tecnológicas que hoje o permitem”, diz o secretário de Estado da equipa do ministro Mário Centeno.

Na prática, a legislação vem dar resposta àquilo que algumas empresas já têm condições para fazer. É expectável que haja uma diminuição da quantidade de papel impresso e, também aí, uma poupança para as maiores cadeias de distribuição.

O diploma, diz Mendonça Mendes, assegura que o projecto avança “de forma gradual e progressiva, criando as condições dentro da própria autoridade tributária para receber os dados em tempo real; por outro lado, permitindo às empresas que possam adaptar-se, tendo os sistemas preparados para fazerem o reporte em tempo real”.

Só numa segunda fase deverá avançar uma outra funcionalidade do mesmo projecto, o código conhecido como QR Code. Mais para a frente, o fisco vai possibilitar que os contribuintes usufruam do benefício fiscal de IRS sem terem de indicar o Número de Identificação Fiscal (NIF) numa loja.

Com uma aplicação das Finanças, os contribuintes podem associar o código e, por sua iniciativa, comunicar a operação ao fisco, sem que a loja conheça o número de contribuinte do comprador. Como qualquer cidadão o pode fazer sem o vendedor saber, a medida tem uma componente de prevenção da evasão fiscal, por criar essa incerteza nos vendedores.

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