O deplorável exemplo de Tomás Correia

Tomás Correia é o sobrevivente dessa espécie que não olha a meios para sobreviver às feridas abertas na banca que em boa parte curámos com os nossos impostos.

Tomás Correia, candidato à conquista de um novo mandato na Associação Mutualista Montepio Geral, queixa-se de que está a ser alvo de uma campanha de notícias negativas. Não percebeu, ou não quis perceber, que a culpa de tantas notícias sobre negociatas mal explicadas, empréstimos duvidosos, investimentos insanos ou contratos irresponsáveis é sua e não da imprensa. Não percebeu que a multiplicação de notícias apenas traduz o levantamento de operações duvidosas e manobras questionáveis que o transformam no único sobrevivente de um tempo abjecto que o país julgava ter definitivamente enterrado sob os escombros do resgate da troika: o tempo em que a alta finança se aliou ao poder político para criar uma cultura de impunidade talhada para servir interesses pessoais. Uma cultura que causou a maior destruição de valor da economia portuguesa em muitas décadas.

Ver Tomás Correia sobreviver a esse tempo é mais uma prova de que em Portugal é o dinheiro que alimenta uma corte detentora de um poder paralelo e o certificado de que a memória é um bem que se compra com um cheque mais ou menos chorudo. Tomás Correia emprestou o dinheiro ao construtor José Guilherme, que logo a seguir deu uma prenda generosa a Ricardo Salgado, comprou títulos especulativos da PT quando se sabia que a empresa se desmoronava no mercado, é investigado pelo Ministério Público e pelo Banco de Portugal, recebe numa associação mutualista um salário de banqueiro, levou o Montepio a ter de pedir ajuda ao Estado, obrigando o Governo a envolver-se na busca de soluções. E, perante este desfile de horrores, o que lhe acontece? Nada.

Tomás Correia é autor de uma história que suscita uma mistura de falta de credibilidade com falta de vergonha. Dele e da rede de interesses pessoais que o ampara, desde Maria de Belém Roseira ou Jorge Coelho até personagens imprevistas como Vítor Melícias ou Manuela Eanes. Protestar contra a possibilidade de um homem com o currículo de Tomás Correia voltar a ser eleito para o Montepio não representa apenas a recusa de um prémio a quem não o merece: representa também uma oposição ao regresso do país videirinho e interesseiro alicerçado no poder de distribuir montanhas de dinheiro entre os apaniguados. Tomás Correia não é o DDT, mas é o sobrevivente dessa espécie que não olha a meios para sobreviver às trevas do seu próprio passado e às feridas abertas na banca que em boa parte curámos com os nossos impostos.

Sugerir correcção
Ler 21 comentários