PSOE vai vencer sem maioria as eleições menos andaluzes de sempre na Andaluzia

À direita disputa-se o segundo lugar, que ainda pode sorrir à esquerda. Cada partido vai usar o resultado andaluz para perceber o que devem fazer a seguir. Em Maio há europeias, autonómicas e municipais.

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Este domingo há eleições regionais na Andaluzia Jon Nazca/Reuters

Susana Díaz quer ser “o dique de contenção da direita para que o PSOE volte a ganhar o país quando chegarem as eleições gerais”. Pablo Casado apela à vitória do PP nas eleições deste domingo na Andaluzia para começar a derrubar um “presidente de Governo ilegítimo”. Albert Rivera pede aos andaluzes que ajudem “a dizer basta aos nacionalistas catalães”: “No dia 2 de Dezembro também é preciso dizer stop a Pedro Sánchez”, reclamou o líder do Cidadãos.

Os andaluzes nunca terão visto tanto os líderes nacionais dos partidos espanhóis durante uma campanha para as eleições na sua comunidade. Casado e Rivera mudaram-se para Sul nas últimas semanas – o segundo ainda levou consigo Inés Arrimadas, a andaluza que é presidente do Cidadãos na Catalunha e ali conseguiu ser a mais votada há um ano (aliás, o candidato à Junta da Andaluzia aparece em todos os cartazes ladeado por Arrimadas e Rivera).

O primeiro-ministro socialista, Pedro Sánchez, numa altura de muitos compromissos internacionais, só esteve em alguns momentos chave da campanha e foi o único a falhar os comícios de encerramento.

Teresa Rodríguez, a candidata de Adelante Andalucía (Podemos mais Esquerda Unida), pediu para que estas eleições não fossem uma “pré-temporada das gerais” e criticou repetidamente o PP e o Cidadãos por aproveitarem a campanha “para falar da Catalunha, ignorando os problemas dos andaluzes”, muito mais graves porque afectam “o que têm para comer”. Ainda assim, não impediu o líder do Podemos, Pablo Iglesias, de estar com ela em alguns comícios – e de afirmar que aqui “se está a jogar o futuro de Espanha”.

Díaz, a baronesa socialista que desde 2013 governa a Andaluzia, uma das maiores comunidades autónomas de Espanha e a primeira em população, com 8,4 milhões de habitantes, decidiu pela segunda vez antecipar as eleições com a justificação de não querer ver a região transformada em palco de luta da política nacional. Se em 2015, quando aqui se realizou o primeiro teste ao fim do bipartidarismo anunciado pelas sondagens, isso já foi difícil, este ano era de todo impossível.

Quase tudo mudou nos últimos meses em Madrid e ainda nenhuma dessas mudanças foi a votos. Mesmo que os eleitores queiram decidir de acordo com as propostas para a Andaluzia, não têm como ignorar que no escrutínio está em causa mais do que isso. Cada partido vai usar o resultado andaluz para tentar perceber como é que os espanhóis avaliam as suas estratégias recentes e o que devem fazer a seguir. Mesmo porque a campanha vai continuar a caminho das eleições europeias, autonómicas e municipais de Maio.

Com seis meses de Governo cumpridos no sábado, Sánchez está à espera de um sinal. Se Díaz vencer com um bom resultado (a vitória está garantida) e os populares sofrerem uma derrota pesada, o primeiro-ministro pode decidir que tem margem para continuar a governar mesmo sem apoios suficientes no Congresso e sem um orçamento próprio. Talvez a legislatura não chegue ao fim (2020), mas prolongar-se-á pelo menos até ao Outono de 2019, ou mais se os resultados de Maio ajudarem.

O tabuleiro nacional

Sánchez surpreendeu quando aproveitou uma sentença que condenou o Partido Popular como agente de corrupção para avançar com uma moção de censura contra o Governo de Mariano Rajoy. Aparentemente sem votos para a fazer aprovar conseguiu somá-los, juntando o apoio do Podemos ao dos nacionalistas bascos e catalães. Isto num momento em que as sondagens punham o PSOE em quarto e sugeriam que o Cidadãos poderia ser primeiro numas eleições gerais – grande vencedor da crise catalã entre os anti-soberanistas, Rivera queria ir a votos o mais depressa possível.

Caiu Rajoy, o Podemos passou de estar na oposição a viabilizar um Governo socialista e o Cidadãos, ultrapassado pelas circunstâncias, ficou sozinho a exigir eleições para substituir um primeiro-ministro que considera “ilegítimo” e “traidor” por ter chegado ao poder com o apoio dos independentistas catalães (os mesmos que agora recusam aprovar o Orçamento por continuarem a ter os seus principais dirigentes na prisão). O PP elegeu Pablo Casado para a liderança e a necessidade que este tem de se impor fez com que eclipsasse o seu próprio candidato, Juanma Moreno, na campanha andaluza.

Díaz, que já queria antecipar a ida a votos, teve a ajuda do Cidadãos, com o líder do partido na Andaluzia, Juan Marín, a rasgar o acordo de governo que com ela assinara em 2015 (oficialmente, por incumprimento da socialista, na prática, para se distanciar de um PSOE que passara a estar no poder em Madrid).

O que daqui resultou foi a menos andaluza de todas as campanhas no único bastião que sobra aos socialistas no país. PP e Cidadãos, em disputa pela liderança à direita, criticaram a gestão de Díaz e os 36 anos de governação socialista mas estiveram mais concentrados nos ataques directos a Sánchez, rivalizando, ao mesmo tempo, pela distinção de partido mais duro com os independentistas da Catalunha. O PP ainda apresentou um programa e falou do seu modelo de governo; o Cidadãos nem isso, limitando-se a sublinhar que é um partido sem casos de corrupção.

A extrema-direita

Díaz passou a campanha a atacar os dois por não discutirem a Andaluzia nem se distanciarem do Vox, o partido de extrema-direita que usou a polarização provocada pela crise catalã para se lançar numa ofensiva mediática e deixar de ser irrelevante. Entretanto, ia defendendo o que tem feito pela região até que, quase na recta final, lá acabou por assumir que na Andaluzia está também em causa o futuro nacional dos socialistas.

“O PSOE representa a Andaluzia boa, que não ofende, o socialismo útil, responsável, que respeita o Estado de direito, que respeita a igualdade”, afirmou no último comício, em Sevilha, onde tentou recentrar o discurso nos problemas andaluzes. Invocou a defesa da autonomia, frente à ameaça recentralizadora do PP, e terminou a reivindicar “o acento andaluz” (sotaque) que diz ter marcado toda a sua campanha.

PP e Cidadãos despediram-se com mais do mesmo. Casado falou durante 50 minutos no comício em que se esperava que fosse Moreno a brilhar. “Não merecemos Pedro Sánchez, que quer destruir Espanha e é cúmplice dos batasunos [referência ao partido ilegalizado em 2003 por ser considerado o braço político da ETA] e independentistas que querem partir o país”, denunciou o líder dos conservadores.

Se fechassem os olhos, os apoiantes do PP poderiam pensar que estavam no comício de encerramento do Cidadãos. “Consta-me que muitos eleitores do PSOE vão dizer basta a Sánchez, não compram pactos com os separatistas”, afirmou Rivera, sublinhando a defesa da unidade de Espanha, a mensagem que mais explorou na Andaluzia. “Se acreditam que somos todos iguais, este é o projecto.”

Cada voto conta

Teresa Rodríguez, fiel a si mesma, insistiu em apresentar-se como alternativa de esquerda ao “susanismo”, atacando Díaz por “ter feito metade da campanha da extrema-direita” (acusação que repete desde que a presidente andaluza passou o último debate a tentar, sem êxito, forçar Cidadãos e PP a prometer que não se aliarão ao Vox), isto sem nunca mencionar explicitamente a formação que recusou nomear em toda a campanha.

A média de todas as sondagens só garante que o PSOE será vencedor e que Díaz não terá os 55 lugares que asseguram a maioria absoluta. PP e Cidadãos podem ambos ficar em segundo, mas também é possível, embora muito menos provável, que esse seja o lugar de Adelante Andalucía. Possível é que Díaz possa negociar tanto com o Cidadãos como com a aliança de esquerdas para governar – como é quase impossível que os dois partidos da direita somem votos suficientes para destronar a socialista.

Com PP, Cidadãos e Adelante Andalucía muito próximos nos inquéritos, há círculos em que os candidatos serão eleitos por pouquíssimos votos (como já aconteceu em 2015). A importância de cada boletim é real, tanto para definir a formação que fica em segundo como se o Vox entra no parlamento autonómico. Rodríguez foi a única que não esqueceu esse pequeno grande pormenor ao encerrar a campanha: “Os resultados decidem-se por centenas de votos. Não poupeis esforços, que ninguém fique sem votar em Adelante Andalucía”.

Uma dirigente especial do Podemos, Rodríguez, negociou a sua coligação sem intervenção da liderança, algo que a outros custou a expulsão do partido, e exige ser ela a definir as estratégias na Andaluzia. Mas estas eleições também são um teste ao futuro da aliança nacional entre o Podemos e a Esquerda Unida – o que terá consequências importantes na definição de possíveis alianças de governação à esquerda, quando se realizarem, por fim, eleições gerais. Por enquanto, na Andaluzia parece que esse dia já chegou.

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