Ex-advogado de Trump declara-se culpado de mentir ao Congresso

Michael Cohen está a colaborar com a equipa do procurador especial Robert Mueller, que investiga as suspeitas de conluio entre a campanha de Donald Trump e a Rússia.

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Michael Cohen (ao centro) LUSA/JUSTIN LANE

O advogado norte-americano Michael Cohen, que foi durante vários anos um dos mais próximos e leais colaboradores de Donald Trump, declarou-se culpado de mentir ao Congresso sobre as negociações de um projecto imobiliário em Moscovo. Esta declaração, que acontece de forma inesperada para o grande público, é mais um sinal de que as investigações do procurador Robert Mueller estão a chegar à fase final.

Cohen apareceu esta quinta-feira num tribunal em Manhattan para admitir que prestou falsas declarações às comissões de inquérito do Senado e da Câmara dos Representantes que investigam as suspeitas de interferência da Rússia nas eleições presidenciais de 2016 nos EUA.

Esta declaração de culpa surge depois de meses em que Cohen foi colaborando com os investigadores da equipa de Robert Mueller, de forma não oficial (até esta quinta-feira não se conhecia qualquer acordo entre as duas partes), em troca de uma possível recomendação de redução de pena assim que for conhecida a totalidade da acusação.

O advogado foi acusado em Agosto noutro processo, em Nova Iorque, mas esta é a primeira vez que é acusado formalmente pela equipa do procurador Robert Mueller.

Para além das investigações no Congresso sobre a Rússia, as suspeitas estão também a ser investigadas pelo FBI e pelo Departamento de Justiça, sob as ordens do procurador especial Robert Mueller.

Em cartas enviadas no ano passado às comissões do Congresso, o advogado admitiu que esteve envolvido em negociações para a possível construção de um projecto imobiliário em Moscovo, em Setembro de 2015, em representação da empresa de Donald Trump, mas disse que esse processo parou em Janeiro de 2016, antes de Trump ter sido nomeado candidato do Partido Republicano à Casa Branca.

Agora, a acusação diz ter provas de que essas negociações prolongaram-se, pelo menos, até Junho de 2016.

"Em finais de Janeiro de 2016, eu determinei que a proposta não era exequível por uma variedade de questões empresariais e que não deveria continuar. Com base na minha determinação, a empresa abandonou a proposta", disse Cohen nas cartas enviadas ao Congresso no ano passado, citadas nos documentos entregues pela equipa do procurador Mueller ao tribunal de Manhattan, publicados esta quinta-feira no blogue Lawfare.

Nas mesmas cartas ao Congresso, Michael Cohen disse que nunca discutiu a proposta imobiliária com o "Indivíduo 1" (Donald Trump), nem com ninguém da sua família.

Para além disso, a equipa de Robert Mueller acusa Michael Cohen de mentir quando disse ao Congresso que nunca aceitou viajar até à Rússia para discutir o projecto, nem tentou convencer o "Indivíduo 1" a fazer a mesma viagem, com a mesma finalidade.

Por fim, Cohen declarou-se culpado de mentir ao Congresso quando disse que não se lembrava de mais nenhuma resposta do Governo russo sobre esse projecto a partir de Janeiro de 2016.

"Para ser leal"

Para a acusação, essas declarações de Cohen são falsas e tinham como objectivo passar a mensagem de que qualquer possível envolvimento de Trump no negócio limitou-se a um período anterior à sua campanha eleitoral, pelo que cairia fora do mandato do procurador Mueller.

No tribunal, Cohen disse que prestou declarações falsas ao Congresso "para ser consistente com a mensagem política do Indivíduo 1 e para ser leal ao Indivíduo 1".

Em Setembro de 2015 (quando o projecto imobiliário em Moscovo começou a ser discutido, segundo disse Cohen ao Congresso), Trump tinha apenas participado num debate na televisão entre os pré-candidatos do Partido Republicano; e em Janeiro de 2016 os mesmos pré-candidatos preparavam-se para a primeira votação nas eleições primárias, no estado do Iowa. Só no Verão, em Julho de 2016, Trump viria a ser nomeado candidato oficial do Partido Republicano.

Nesse Verão de 2016, Trump negou que tivesse qualquer interesse imobiliário na Rússia – uma declaração que voltaria a repetir em 2017 no Twitter: "Não conheço Putin, não tenho negócios na Rússia, e os meus inimigos estão a perder a cabeça. No entanto, Obama pode fazer um negócio com o Irão, o n.º1 no terrorismo, sem problemas!"

Mas a equipa do procurador Mueller afirma que as discussões com vista à aprovação do projecto pelo Governo russo continuaram muito depois de Janeiro de 2016, e que Michael Cohen informou o "Indivíduo 1" e a sua família sobre as negociações. Para além disso, o advogado admite agora, perante o tribunal, que aceitou viajar até Moscovo e que "tomou medidas para garantir uma possível viagem do Indivíduo 1 à Rússia".

Michael Cohen admite agora que se recorda de telefonemas e trocas de email em finais de Janeiro de 2016 com o Governo russo sobre o projecto em causa, tendo recebido uma resposta "do gabinete do secretário de imprensa do Presidente da Rússia".

"O potencial significado da colaboração de Cohen é imenso" para o Presidente Trump, disse à ABC News Kendall Coffey, antigo procurador da Florida. "Não se pode saber se essa colaboração vai levar a acusações criminais, mas para a maioria dos empresários com negócios complexos, o facto de os seus advogados pessoais serem a principal testemunha é o pior pesadelo possível."

Trump desmente Cohen

Em declarações nos jardins da Casa Branca, esta quinta-feira, o Presidente Trump disse que o seu antigo advogado pessoal "está a ser uma pessoa fraca e está a tentar garantir uma sentença reduzida mentindo sobre um projecto que era do conhecimento de toda a gente". Trump disse ainda que não aceitou a proposta de negócio em Moscovo.

Na mesma declaração nos jardins da Casa Branca, o Presidente norte-americano disse que as declarações de Cohen não põem em causa a sua Presidência: "Mesmo que ele tivesse razão, isso não importa porque eu podia fazer tudo o que quisesse durante a campanha."

"Quando eu me candidato a Presidente, isso não significa que não posso continuar a fazer negócios. Havia uma forte hipótese de eu não ser eleito, e nesse caso teria voltado à minha empresa. Não havia razões para perder essas oportunidades", disse o Presidente dos EUA.

Em Agosto, Michael Cohen deu-se como culpado de fraude fiscal e bancária nos seus negócios pessoais, e de violação das leis de financiamento de campanha num processo em que é acusado de pagar o silêncio de duas mulheres que dizem ter mantido relações amorosas com Donald Trump (a acusação diz que esses pagamentos foram, na prática, financiamentos de campanha porque tinham como objectivo melhorar as hipóteses de Trump de vencer as eleições, e as contribuições individuais estão limitadas a menos de três mil dólares).

O actual Presidente disse que só soube desses pagamentos depois de eles terem sido feitos, e por iniciativa de Cohen, mas o advogado disse em tribunal que agiu sob as ordens de Trump.

A sentença de Cohen no processo de fraude fiscal e bancária e financiamento ilegal de campanha vai ser anunciada no dia 12 de Dezembro. O antigo advogado de Trump espera beneficiar de uma redução da pena por ter colaborado com os procuradores do processo em causa, mas também com a equipa do procurador especial Robert Mueller.

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