Aberto inquérito disciplinar a procuradora do ataque em Alcochete

Em causa está o tom utilizado pela procuradora Cândida Vilar em alguns interrogatórios. Ministério Público abriu inquérito-crime à divulgação de áudios de inquirições pela CMTV.

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Academia do Sporting, em Alcochete, ocorreu a 15 de Maio. LUSA/MÁRIO CRUZ

A Procuradoria-Geral da República (PGR) anunciou esta sexta-feira a abertura de um inquérito disciplinar à procuradora titular do processo da invasão à academia do Sporting, em Alcochete, e um inquérito-crime à divulgação de áudios de interrogatórios a arguidos. 

Em causa está o tom agressivo utilizado pela magistrada Cândida Vilar em alguns interrogatórios realizados em Junho passado, no âmbito do ataque na academia do clube leonino, que foram divulgados publicamente.

"Foi determinada a abertura de um inquérito para averiguação de eventual responsabilidade disciplinar da magistrada. Este inquérito encontra-se previsto no art.º 211º do Estatuto do Ministério Público e tem por finalidade a averiguação de factos determinados. Na sequência do resultado deste inquérito, será decidida a instauração ou não de processo disciplinar", refere a PGR, em resposta escrita enviada ao PÚBLICO.

Em relação aos áudios de interrogatórios a arguidos, divulgados esta semana pela estação televisiva CMTV, a PGR determinou "a instauração de inquérito criminal", uma vez que o processo se encontra em segredo de justiça. 

Com um longo currículo no combate à criminalidade violenta, a procuradora Cândida Vilar, do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa, deduziu acusação este mês contra 44 arguidos por envolvimento no ataque à academia do Sporting, a 15 de Maio, que resultou em agressões à equipa técnica e aos jogadores do clube leonino. Num excerto do interrogatório ao ex-líder da Juve Leo Fernando Mendes fica patente o tom acintoso com que a magistrada lida com o arguido, que tenta, por mais de uma vez, responder às perguntas que lhe são colocadas. Sem sucesso: Cândida Vilar não o deixa falar, preferindo ser ela a tecer considerações sobre alguns aspectos do ataque aos jogadores em Alcochete. 

"Posso falar?", pede a certa altura Fernando Mendes, um arguido com antecedentes criminais, e sobre o qual impendem há anos suspeitas de ligações ao movimento skinhead. "Ninguém lhe perguntou nada", responde-lhe a procuradora. O episódio ocorreu no mesmo dia em que Cândida Almeida, de 62 anos, se viu ameaçada no Tribunal do Barreiro, local onde decorreram os interrogatórios, pelo irmão de outro suspeito do caso de Alcochete. 

"Os magistrados têm dever de urbanidade e não podem fazer comentários deselegantes", observa um dos advogados deste caso, Melo Alves, que já viu a mesma magistrada comportar-se de forma semelhante noutros processos. Para Melo Alves, cabia ao juiz de instrução que dirigia os trabalhos, Carlos Delca, impedir que o interrogatório prosseguisse naquele tom. Como não o fez, devia ter sido a advogada de Fernando Mendes, Sandra Martins, a chamar a atenção para o problema. 

A advogada não o terá feito logo naquele momento, mas num recurso que apresentou ao Tribunal da Relação de Lisboa no mês seguinte pede aos juízes a ouvirem o interrogatório, e em especial as perguntas. Fala na forma como os tribunais devem tratar as pessoas, com correcção e urbanidade. Sandra Martins deverá ainda pedir ao Conselho Superior da Magistratura e ao Conselho Superior do Ministério Público que se pronunciem sobre esta questão. 

Dos 44 arguidos do processo, 38 viram o juiz de instrução criminal do Barreiro manter-lhes a medida de coacção de prisão preventiva. Os restantes seis, incluindo o ex-presidente do Sporting Bruno de Carvalho e o líder da claque Juventude Leonina, Nuno Mendes, encontram-se em liberdade, sendo que estes dois últimos tiveram de pagar uma caução de 70 mil euros cada um, e estão obrigados a apresentações diárias às autoridades. 

Cândida Vilar vai recorrer da decisão do juiz de manter Bruno de Carvalho e Nuno Mendes em liberdade. 

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