Os seis casos judiciais que ainda ameaçam as relações com Angola

Alguns já foram mais incómodos, outros tem potencial para se tornarem numa nova pedra no sapato das relações diplomáticas entre Portugal e Angola. Seis casos que envolvem o Estado angolano ou a elite daquele país

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Ex-vice-presidente de Angola, suspeito de corrupção, pode nunca ser sequer julgado. MICHAEL REYNOLDS

O “irritante” diplomático

Foi o famoso “irritante” das relações diplomáticas entre Portugal e Angola e esvaziou-se com a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa de remeter uma parte do caso para a Justiça daquele país africano. Mesmo que no próximo ano algum dos três arguidos da chamada Operação Fizz venha a ser condenado em tribunal, não há qualquer garantia que o mesmo possa vir a suceder ao ex-vice-presidente de Angola, Manuel Vicente – que é suspeito de ter pago luvas ao procurador do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) Orlando Figueira para que este arquivasse um inquérito que tinha em mãos sobre a origem dos 3,8 milhões com que comprou um apartamento de luxo no Estoril, há quase dez anos. Contrariando todos os entendimentos da justiça portuguesa até aí, em Maio a Relação de Lisboa enviou para Angola a parte do processo que diz respeito a Manuel Vicente. Que pode nem vir a ser julgado. Isto porque beneficiará de imunidade até 2022.

Elite angolana ainda sob investigação

Perto de duas dezenas de personalidades angolanas, incluindo duas filhas do ex-presidente angolano, José Eduardo dos Santos, e vários empresários portugueses com quem mantinham parcerias foram alvo de duas queixas-crime em 2011 feitas pelo antigo embaixador angolano, Adriano Parreira. Em causa estava o desvio de fundos do erário público angolano e o seu envio para Portugal. O caso, que envolve igualmente Manuel Hélder Vieira Dias Júnior – conhecido como general Kopelipa, o poderoso ministro de Estado e Chefe da Casa Militar de Eduardo dos Santos –, já foi arquivado parcialmente pelo procurador Paulo Gonçalves em Agosto de 2014, tendo no mês seguinte sido reaberto pelo director do DCIAP, Amadeu Guerra. A defesa do general Kopelipa recorreu para o juiz de instrução Ivo Rosa, que anulou o despacho de Amadeu Guerra e declarou nulos todos os actos praticados após a reabertura. O Tribunal da Relação de Lisboa acabou por reverter a decisão, que após recurso da defesa terminou em Março passado com o aval do Supremo para a investigação continuar. Entre os angolanos visados há várias figuras ligadas às presidências de Eduardo dos Santos, como o antigo vice-presidente Fernando da Piedade Dias dos Santos ou Aguinaldo Jaime, antigo governador do Banco Nacional de Angola. Mas na lista também surgem nomes ligados à presidência de João Lourenço, como Victor Fonseca Lima, nomeado pelo actual presidente para secretário para Assuntos Diplomáticos de Cooperação Internacional ou o general Fernando Miala, que chefia os Serviços de Inteligência e Segurança do Estado. As filhas do ex-presidente angolano denunciadas neste caso são Isabel dos Santos e Tchizé dos Santos.  

O buraco do BES Angola

O buraco de cerca de três mil milhões de euros que o Banco Espírito Santo (BES) Angola terá provocado nas contas da casa-mãe em Portugal está a ser investigado pelo Ministério Público português no âmbito da investigação ao colapso do BES. Uma figura incontornável nestes inquéritos é o empresário luso-angolano Álvaro Sobrinho, que foi durante mais de uma década CEO do BES Angola. Sobrinho  – que também foi investigado no caso da megaburla ao Estado angolano e acabou ilibado – é, neste caso, suspeito de ter desviado mais de 600 milhões de dólares do BESA, simulando empréstimos avultados, que aprovou, sem garantias bancárias a empresas-fantasmas, cujos donos se desconhecem. O dinheiro terá acabado por ir parar a contas suas ou de familiares seus.

Megaburla ao Estado angolano

A falsificação de vários ofícios do Ministério das Finanças angolano em genuíno papel timbrado do ministério e com o selo branco da instituição fez com que o governador do Banco Nacional de Angola ordenasse 17 pagamentos no montante global de 136 milhões de dólares (actualmente perto de 119 milhões de euros) entre 2007 e 2009. O dinheiro saiu de uma conta do BES, em Londres, usada habitualmente para pagar bens e serviços adquiridos pelo Estado angolano no estrangeiro, sem qualquer contrapartida. Em 2010, após uma queixa do Estado angolano, o DCIAP abriu um processo, que devido ao número de suspeitos envolvidos foi dividido em sete inquéritos. O primeiro terminou arquivado no início deste ano, após sete anos de investigação. Mas os restantes continuam. E mesmo no que foi arquivado mantém-se em aberto quem receberá os perto de cinco milhões de dólares apreendidos nas contas de uma empresa portuguesa, cujo empresário foi ilibado, mas que não terá vendido bens nem prestado qualquer serviço ao Estado angolano.

Uma lavagem que envolveria a TAP 

Na origem deste processo estão mais de 25 milhões de euros que a transportadora aérea angolana Sonair, do universo da petrolífera Sonangol, pagou à TAP durante cerca de quatro anos, até 2013, para que esta lhe fizesse a manutenção aos aviões. Segundo a acusação, a Sonair nunca exigiu à transportadora portuguesa que lhe prestasse qualquer serviço: o contrato firmado entre as duas empresas servia para várias figuras da elite de Angola desviarem dinheiros públicos daquele país para as suas contas bancárias, entre as quais dois antigos administradores da petrolífera, Mirco Martins, enteado do ex-vice-presidente de Angola Manuel Vicente, e Zandre Finda, dado como ligado aos negócios do general Vieira Dias, mais conhecido por Kopelipa. Aguarda-se uma decisão da Relação de Lisboa para saber se os suspeitos portugueses serão julgados, uma vez que os angolanos nunca foram arguidos.

A fraude na compra do Banif

Em Junho de 2008, o Estado angolano apresenta queixa contra dois empresários e um advogado portugueses por alegada burla na intermediação da compra de 49% do Banco Internacional do Funchal (Banif), entretanto alvo de um processo de resolução. O Estado angolano dizia ter entregado aos três 143,3 milhões de euros para comprar mais de 8,5 milhões de acções, operação que não chegou a concretizar-se. O caso foi arquivado menos de dois anos depois, em 2010, após as autoridades angolanas terem retirado a queixa-crime, após terem sido restituídos os valores em causa.

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