Como destruir um partido em dez meses

Rui Rio aguarda por um milagre político que não virá em 2019. O pior resultado do PSD desde 1976 é cada vez mais provável.

A Lusa colocou na terça-feira em linha uma notícia sobre uma reunião que Rui Rio teve com militantes de Viseu. Essa notícia afirmava, citando apenas relatos da reunião e sem identificar fontes, que Rio teria dito aos militantes sociais-democratas, a propósito do caso José Silvano, que “não deixa cair os amigos”. A declaração deu origem ao burburinho esperado, com mais trocadilhos entre “banho de ética” e “banhada”, e a recuperação de velhas declarações, contraditórias com a actual. Várias vergastadas depois, o PSD, e o próprio Rui Rio, vieram desmentir a notícia, garantindo “peremptoriamente” que em momento algum tal frase foi proferida na reunião, e classificando-a mesmo como uma “inequívoca mentira”.

Esta sequência de acontecimentos demonstra duas coisas, ambas péssimas para o PSD. A primeira é que o partido está num clima de guerra civil, e que todas as oportunidades são boas para – utilizando a famosa metáfora santanista – dar um pontapé na incubadora de Rui Rio. O enorme desconforto da direcção de Rio em relação ao caso Silvano não se deveu apenas ao facto de ser o segundo secretário-geral apanhado em más práticas. O desconforto adveio da altíssima probabilidade de a notícia do Expresso ter tido origem na própria bancada parlamentar do PSD, e de vários deputados sociais-democratas estarem manifestamente interessados em dinamitar a vida de Rui Rio, quem sabe à espera que alguém lhe faça aquilo que António Costa fez a António José Seguro em véspera de eleições.

A segunda coisa que o caso demonstra é que Rui Rio não acerta uma. Porque se ele não disse aquilo que a Lusa diz que disse (e eu acredito em Rui Rio), aquilo que ele diz que disse é quase tão mau como aquilo que ele diz que não disse. Segundo o comunicado do PSD, Rio acredita que o caso Silvano foi sobrevalorizado, e assim sendo ele jamais iria “aproveitar-se oportunisticamente da condenação mediática de alguém” para fazer boa figura ética, pois o “cumprimento dos princípios éticos” é “ter a coragem de ser justo na apreciação dos factos”. Ou seja, este rebuscado argumento, que em termos de compreensibilidade só está um pouco acima da sua intervenção em alemão, apenas prova que a famosa teimosia de Rui Rio começa a aproximar-se perigosamente do autismo. Rio tem dificuldades em perceber que as pessoas não são estúpidas, e que não é a aldrabice em si, mas sim a sucessão de explicações mal dadas e desculpas mal-enjorcadas, que transformou o caso numa bola de neve.

Rui Rio aguarda por um milagre político que não virá em 2019. A direita vai estar partida entre a Aliança de Santana Lopes, o Chega de André Ventura e alguns partidos liberais que podem conquistar votos – e boas cabeças – a uma pequena elite cosmopolita que até há bem pouco teria no PSD o seu poiso natural. O PSD está completamente dividido, até em termos geracionais, entre a velha guarda social-democrata e os jovens turcos passistas. E aquilo que parece ter sobrado para Rio construir a sua equipa são os Salvadores Malheiros, os Felicianos Barreiras Duartes, os José Silvanos, as Elinas Fragas e as Emílias Cerqueiras desta vida. Ah, esperem, sobra ainda isto: pela primeira vez na vida, vejo a esquerda elogiar um líder do PSD com desvelo. Tanto desvelo, aliás, que qualquer eleitor do partido só pode desconfiar. Quando Rui Rio é protegido por aqueles que não pensam votar nele estamos conversados. Convém também estarmos preparados: o pior resultado do PSD desde 1976 é cada vez mais provável.

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