May não consegue consenso dentro do Governo para acordo do “Brexit”

Aprovação da proposta da primeira-ministra pelos ministros tem sido sucessivamente adiada por falta de consenso. Trabalhistas dizem que ainda é possível reverter o “Brexit” e a lista de partidários de um novo referendo continua a aumentar.

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Theresa May, primeira-ministra do Reino Unido Reuters/SIMON DAWSON

Nova semana apontada como decisiva para o “Brexit”, o mesmo impasse em Downing Street. A falta de consenso dentro do Governo britânico em volta da estratégia de Theresa May para a saída do Reino Unido da União Europeia obrigou-a a cancelar a reunião extraordinária desta segunda-feira, que serviria para os ministros aprovarem a sua proposta para um acordo com Bruxelas.

Os membros do executivo juntam-se assim a conservadores eurocépticos e pró-europeus, trabalhistas, liberais, nacionalistas escoceses e unionistas norte-irlandeses, entre outros, numa lista de opositores aos planos da primeira-ministra que não pára de aumentar.

Entre hesitações sobre aspectos concretos da proposta de May ou dúvidas sobre se a mesma passará na Câmara dos Comuns, tal como está, o Conselho de Ministros está longe de lograr um consenso – já é a segunda vez, num espaço de uma semana, que se adia a reunião de aprovação do plano. 

A BBC cita fontes do Governo para noticiar que o pessimismo no cabinet se arrasta desde Julho, altura em que May apresentou o seu “plano Chequers” – que propunha uma zona de comércio livre com a UE apenas para a transacção de bens industriais e produtos agrícolas.

Uma proposta menos disruptiva do que a facção “hard-‘Brexit’” do Partido Conservador gostaria e, ao mesmo tempo, pouco ambiciosa para uma ala pró-UE preocupada com o impacto negativo que a manutenção de alguns sectores da economia britânica sob as regras europeias pode vir a ter na capacidade do Reino Unido para negociar acordos de comércio a partir do dia 29 de Março de 2019 – a data oficial do divórcio.

Com Bruxelas a exigir clareza a Londres até ao final da próxima quarta-feira, para decidir se faz sentido manter de pé a cimeira europeia extraordinária deste mês, para a assinatura de um acordo, o Governo britânico está pressionado a entender-se durante as próximas 48 horas, sob pena de continuar a ver o tempo encolher e, com isso, a aumentar as hipóteses de um imprevisível “Brexit” sem acordo.

À Reuters, um diplomata europeu aponta a “trapalhada política” em que o Reino Unido se encontra, para concluir “ser muito difícil perceber como é que May pode lograr apoio para a sua proposta”.

Liam Fox (Comércio), Sajid Javid (Interior), Penny Mordaunt (Internacionalização) e Esther McVey (Trabalho) são alguns dos ministros pouco confortáveis com os planos da líder do Governo para “Brexit”, ainda que por razões distintas.

Acresce ainda que, do lado europeu, se mantém a posição de intransigência em relação à solução para evitar a reposição de uma fronteira física entre as duas Irlandas. Bruxelas propõe a manutenção da Irlanda do Norte na união aduaneira e sob a alçada das regras do mercado único, caso as partes não consigam acordar um plano alternativo para impedir a reposição dos controlos alfandegários na linha de separação com a República da Irlanda, e não aceita a contraproposta de Londres, que queria a permanência do Reino Unido, como um todo, na união aduaneira, mas a prazo.

“Não é segredo para ninguém que as propostas [de May] foram muito impopulares junto dos grandes brexiteers – a saídas dramáticas de David Davis e Boris Johnson são a prova disso. Mas o que é agora óbvio é o quão alargado o descontentamento se tornou e é manifestado, não apenas por eurocépticos, mas também por antigos remainers”, analisa a editora de política da BBC Laura Kuenssberg.

“Não estão apenas em causa os problemas da fronteira irlandesa, mas o plano favorito da primeira-ministra para o ‘Brexit’. As frustrações de há uns meses fazem inquestionavelmente parte dos motivos porque assistimos agora a este grande impasse”, assegura a jornalista.

Brown, Sánchez e Labour admitem nova consulta

Com a nuvem negra do “no deal” a ameaçar o Reino Unido, cresce também a lista de apoiantes de um segundo referendo ao “Brexit”. Esta segunda-feira Gordon Brown tornou-se no terceiro ex-primeiro-ministro britânico – depois de Tony Blair e John Major – a sugerir a possibilidade de uma nova consulta à população e em Espanha o presidente do Governo Pedro Sánchez fez o mesmo: “Se eu fosse Theresa May, convocaria um segundo referendo, sem dúvida”, disse à edição europeia do site Politico.

No Partido Trabalhista, até o próprio líder foi desautorizado sobre o assunto. Jeremy Corbyn tinha rejeitado essa possibilidade, numa entrevista à revista alemã Der Spiegel, publicada na sexta-feira, mas ouviu a ministra-sombra dos Negócios Estrangeiros Emily Thornberry, no domingo, e o ministro-sombra para o “Brexit” Keir Starmer, na segunda-feira, a defenderem que essa opção, como “todas as outras”, “continua em cima da mesa”, mesmo não sendo prioritária. “O ‘Brexit’ ainda pode ser travado”, admitiu Starmer.

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