De Londres para o Porto para fundar uma rádio de portas abertas ao público e ao mundo

Fundada por um casal de britânicos em Maio deste ano, a Portal Radio foi inspirada num circuito de rádios online colaborativas europeias que funcionam sem fins lucrativos. As sessões bissemanais são transmitidas online e feitas com a porta aberta ao público.

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Numa sexta-feira à noite de chuva que não mata mas mói, prepara-se num edifício numa esquina de Cedofeita mais uma sessão de festa, de trabalho, de networking e de música endereçada ao mundo. Não é um clube ou uma discoteca, nem um negócio lucrativo. Pode ser confundido com qualquer um destes conceitos, mas por princípio não é nenhum deles.

Lá dentro estão dois ingleses e uma inglesa. Enquanto um deles prepara o equipamento que vai usar para um alinhamento de cerca de duas horas de música electrónica, os outros dois asseguram-se de que nada vai falhar na transmissão online que chegará a todo o mundo.

Com uma câmara apontada para si, o DJ vai testando os primeiros sons. Ainda não está em modo de difusão, mas poucos minutos faltam para do teste passar à prática. Dentro do espaço com pouco mais do que 40 metros quadrados as luzes baixam e a porta abre-se para quem se quiser juntar ao evento. Começou mais uma transmissão à escala global. Do Porto para o mundo, a Portal Radio está no ar.

Todas as sextas-feiras e sábados o ritual repete-se. Desde Maio deste ano, quando a rádio online abriu, já passaram por lá mais de duas dezenas de DJs. À excepção do que lá estava na noite em que lá fomos, quando Daniel Swann de Nottigham, radicado na Invicta, passava música, todos os DJs que ali estiveram são portugueses. Não é um requisito. Aconteceu por mero acaso. Durante a difusão o público que passa na rua é convidado a entrar para assistir e para se juntar à festa. Futuramente pretende alargar-se as sessões a outros dias da semana.

Foi essencialmente para isto, pelo menos por agora, que este projecto nasceu: difundir em tempo real, numa rádio online que também recorre à imagem, sessões ao vivo de música electrónica manipulada em tempo real. Com recurso a projecção de imagens na parede por trás do convidado da noite e ao som de malhas que convidam à dança, assim se faz a programação deste projecto que em Portugal terá poucos parentes próximos – encontramos mais dois projectos semelhantes, um em Lisboa e outro em Coimbra.

Ao Porto chegou pelas mãos de um casal de britânicos dos arredores de Londres. Sian Baker, 28 anos, e Dan Sheffield, 38 anos, importaram para a cidade onde vivem há dois anos um modelo que começa a ganhar expressão no resto da Europa.

Servem-se das novas tecnologias (depois de todos estes anos ainda faz sentido chamar-lhes assim?) para pôr em prática um projecto que, em teoria, a partir de qualquer lugar, pode chegar a todo o mundo.

Porto foi uma decisão lógica

Fazê-lo a partir do Porto foi uma opção lógica – é ali que os dois moram. Porém, não assentaram arraiais na cidade por acaso.

Sian Baker, que também é DJ, explica-nos que, ainda antes de pensar co-fundar a rádio com o namorado, assinalou este destino no mapa com um propósito: “Já passava música em clubes de Londres, mas sabia que o Porto tinha uma cena electrónica activa. Queria fugir a um circuito mais comercial. Aqui o circuito é mais genuíno”.

Antes disso já tinha trabalhado no Algarve. Quando se mudou para onde está hoje, cedo, começou a passar música em clubes da cidade.

Para Sheffield foi uma decisão fácil: “Já tinha estado em Lisboa, mas o Porto é uma cidade mais fria, o que para mim é perfeito. À parte disso, é aqui que passam os meus artistas de eleição do circuito electrónico mais underground”.

Tenta ser mais poético, como o próprio refere, e diz que foi a música que o chamou para ali. Sian concorda.

Até montarem a Portal Radio passaram dois anos. Explica-nos a londrina que o projecto surgiu inspirado por um circuito de rádios online do género, das quais destaca a Red Light Radio, de Amesterdão. No Porto, apesar de existiram outras rádios colaborativas, como é o caso da Manobras, fundada em 2011, não existia uma com este conceito. Diz-nos Sian que em Portugal conhece apenas mais duas além da que fundou: a Quantica, na capital, e a Rádio Baixa, em Coimbra.

Com Dan avançou com este projecto para criar uma plataforma de encontro. Por isso mesmo, é uma rádio de portas abertas. “Não é um clube, nem é uma discoteca, nem queremos fazer disto um negócio”, sublinha. Serve este meio para alargar a rede de contactos e para agregar uma cena dispersa. Esta aposta também já lhe proporcionou chegar a outros sítios onde actua como DJ.

Actualmente estão no número 612, na zona onde Cedofeita já não é pedonal, num espaço de proporções reduzidas, onde anteriormente estava um sapateiro. “Tem as proporções ideias ou pelo menos tinha quando o encontramos”, diz Dan.

Sian já pensa em expandir. Prestes a constituírem uma associação sem fins lucrativos, já tem outro lugar debaixo de olho. “É um espaço maior e servirá também para alargar o âmbito da rádio a outras expressões artísticas”, afirma. Se esse passo for alcançado, assegura que continuará a não ser o lucro que a moverá.

Mercado global

Este projecto seria impossível de realizar se não houvesse uma fonte de rendimento que o permitisse. Sian, como já foi referido, é DJ e trabalha noutros espaços e Dan é designer gráfico. Está no Porto, mas trabalha para todo o mundo. “Hoje é perfeitamente possível estar em qualquer sítio a trabalhar para outra parte do globo”, diz. Não é dos clientes portugueses que depende. Trabalha essencialmente com clientes ingleses e australianos.

A Portal Radio diz existir por motivos muito claros: “Fazemos isto porque queremos criar um espaço de networking, mas também porque queremos e podemos”.  

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