Morreu Amal Hussain, a menina símbolo da crise humanitária do Iémen

Amal Hussain, a menina de sete anos cujo retrato ilustra uma reportagem do New York Times, morreu no campo de refugiados onde vivia com a família.

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Estima-se que pelo menos 1,8 milhões de crianças estejam gravemente subnutridas no Iémen epa/YAHYA ARHAB

A menina iemenita de sete anos que foi fotografada pelo repórter do New York Times e que se tornou o rosto da fome provocada pela guerra, morreu na quinta-feira. A notícia foi avançada pela família da criança ao jornal nova-iorquino.

O retrato de Amal Hussain foi usado para ilustrar uma peça sobre a fome e as consequências da guerra civil, com o envolvimento de uma coligação liderada pela Arábia Saudita e pelos Emirados Árabes Unidos, que já se arrasta há quatro anos e que é responsável pela maior crise humanitária do mundo.

A publicação da fotografia despertou respostas muito diferentes por parte dos leitores, o que obrigou o New York Times a justificar a decisão de mostrar os retratos das crianças afectadas pela fome num artigo.

“Esta reportagem, A tragédia da guerra da Arábia Saudita, foi escrita por Declan Walsh e as fotografias foram tiradas por Tyler Hicks. Para a escreverem, tiveram não só de atravessar um país devastado pela guerra, mas também de lidar com o próprio trauma emocional”, justificaram Eric Nagourney, editor de saúde, e Michael Slackman, editor de internacional, num texto conjunto.

Apesar de terem tentado escolher imagens que não fossem demasiado gráficas, escolheram fotografias que fizessem jus ao sofrimento das “vítimas desta guerra”. Publicar “imagens higienizadas", defende David Furst, editor de fotografia internacional, "não reflecte de todo o seu sofrimento”.

Amal Hussain, a menina de sete anos que ilustra a reportagem dos jornalistas do New York Times, morreu no campo de refugiados onde vivia com a família. Foi fotografada num centro de saúde de Aslam, a 144 quilómetros da capital. Estava deitada numa cama ao lado da mãe – também ela doente, a recuperar de um episódio de dengue – e estava a ser alimentada com leite a cada duas horas, como tratamento para os episódios de vómitos e diarreia de que sofia.

A médica responsável pela criança, Mekkia Mahdi, quando falou ao jornal norte-americano, agarrou-lhe num dos braços e disse: “Não tem carne, são só ossos”.

Amal teve alta na semana passada, apesar de ainda estar doente. De acordo com a médica que a acompanhava, os médicos precisavam de espaço para tratar outros doentes. “Esta é uma criança deslocada que sofre de doença e deslocamento”, disse Mahdi. “Temos muitos mais casos como o dela.”

A médica pediu à mãe de Amal que a levasse a um hospital dos Médicos Sem Fronteiras em Abs, uma cidade a 24 quilómetros de distância, mas a família não teve dinheiro para cobrir a viagem. “Não tinha dinheiro para a levar para um hospital”, disse a mãe de Amal. “Por isso trouxe-a para casa.”

1,8 milhões de crianças subnutridas

A história de Amal, uma criança obrigada a deixar a sua casa em Saada, nas montanhas a norte do país junto da fronteira com a Arábia Saudita devido à guerra, não é única. E as consequências começam a sentir-se. Os alimentos escasseiam e estima-se que pelo menos 1,8 milhões de crianças estejam gravemente subnutridas no Iémen. Fazem parte dos oito milhões de iemenitas que dependem de rações de emergência. De acordo com as estimativas das Nações Unidas, este número pode subir para os 14 milhões – cerca de metade da população actual do país.

Nos últimos dias foram vários os intervenientes que pediram um cessar-fogo na região. Nesta quinta-feira, o secretário da Defesa norte-americano, James Mattis, pediu o fim das hostilidades no país. O apelo surgiu numa altura em que as relações entre Riad e a comunidade internacional se distanciaram devido ao assassínio do jornalista Jamal Khashoggi no consulado saudita na cidade turca de Istambul.

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