Crise da ferrovia já está a contaminar a linha do Norte

Depois das automotoras a diesel do Oeste, Alentejo e Algarve, chegou a vez das automotoras eléctricas que fazem os regionais na linha do Norte ficarem paradas e deixarem passageiros em terra, na sequência de várias supressões de comboios.

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FERNANDO VELUDO / NFACTOS

A falta de pessoal da EMEF (empresa da CP que faz a manutenção e reparação dos seus comboios) está a provocar um excesso de imobilizações de material eléctrico nas suas oficinas, obrigando a CP a suprimir comboios ou a pô-los a circular com metade da capacidade.

Esta sexta-feira foram suprimidos dois comboios entre Entroncamento e Coimbra depois de, nesta semana, terem já sido suprimidos dois regionais entre Aveiro e Coimbra e uma circulação entre Coimbra e Coimbra B. Na quarta-feira, o regional entre Vilar Formoso e Guarda avariou e partiu da estação fronteiriça com 57 minutos de atraso.

Estes comboios têm em comum serem feitos com UTE (Unidades Triplas Eléctricas) que constituíam até há pouco tempo uma frota fiável da CP que circula por todas as linhas electrificadas do país, com excepção da linha do Sul. No entanto, também estas automotoras começam a avariar ou a ficar retidas nas oficinas em manutenções prolongadas por falta de pessoal e de peças.

Como consequência, a CP acaba por se ver obrigada a realizar alguns regionais só com uma unidade tripla em vez de duas, o que reduz de seis para três o número de carruagens. O resultado é que acabam por circular sobrelotadas, deixando, por vezes, passageiros em terra.

Foi o que aconteceu com o regional de Tomar para Lisboa, no dia 3 de Outubro, que provocou protestos dos passageiros que não puderam entrar. No dia 19 de Outubro, pelas mesmas razões, a PSP foi obrigada a intervir na gare do Oriente porque um regional para o Entroncamento circulava só com metade das carruagens e os passageiros protestaram por não poder entrar. E na passada segunda-feira houve também uma UTE que partiu do Entroncamento sobrelotada.

A situação deverá piorar nos próximos meses porque a EMEF continua com falta de pessoal (as contratações para os anunciados 102 novos trabalhadores só agora começaram) e a frota precisa de manutenção. A CP possui 57 UTE, mas cinco estão fora de serviço por motivo de acidente e servem de fornecedoras de peças sobressalentes. Das restantes 52, há oito imobilizadas, das quais cinco só estão paradas porque aguardam peças para reparação.

O mais grave, porém, é que as UTE precisam em 2019 de fazer uma revisão geral aos bogies (rodados), o que obriga a um maior tempo de imobilização nas oficinas do Entroncamento, as únicas onde esse trabalho é executado. Para evitar o agravamento da falta de material que isso provocará – ainda por cima em ano de eleições - a administração da CP pondera estender o ciclo de manutenção das automotoras, no que tem sido contrariada pela sua estrutura técnica, preocupada com a quebra de fiabilidade e de segurança do material. É que os bogies são um dos componentes mais sensíveis dos comboios em termos de segurança e a sua revisão atempada uma forma de evitar acidentes.

Para a transportadora pública, as supressões na linha do Norte têm maior visibilidade porque os comboios vão mais cheios e qualquer anomalia provoca maior contestação. A situação piora quando as supressões atingem os comboios de longo curso, o que até agora tem sido evitado. No entanto, é muito frequente que os Alfa Pendulares para Braga se quedem por Porto Campanhã, seguindo os passageiros numa UTE até ao destino final.

Já para Évora quase desapareceram os comboios Intercidades, substituídos por vulgares automotoras UTE que não têm o mesmo grau de conforto dos comboios de longo curso.

Passageiros menos reivindicativos do que na linha do Norte são os do Algarve que por estes dias é a linha campeã das supressões sem que, por isso, tenha havido muita contestação. Na segunda-feira foram suprimidos três comboios entre Vila Real de Sto. António e Faro e um entre Faro e Lagos. Na terça-feira foram suprimidos cinco comboios (três a Sotavento e dois a Barlavento), na quarta-feira foi suprimido um comboio e na quinta-feira, quatro. Ontem, sexta-feira, foram suprimidos pelo menos dois comboios.

Seguem-se a linha do Alentejo onde a CP tem evitado as supressões, mas o serviço anda todo desregulado, com grandes atrasos, porque não há automotoras a diesel suficientes.

No Oeste, onde desde 5 de Agosto a CP reduziu o serviço a mínimos (de 28 para 18 comboios em toda a linha), tem havido, mesmo assim, supressões. A empresa promete, contudo, trazer duas automotoras espanholas do Douro para o Oeste a fim de aumentar a oferta a partir de 4 de Novembro.

Além da falta de material, tem havido motivos exteriores à CP que prejudicaram nos últimos tempos o serviço ferroviário. Registou-se nas últimas semanas um número elevado de colhidas (acidentais e suicídios) e até o serviço mais nobre da empresa – o Alfa Pendular – sofreu um incidente na passada terça-feira, perto da Azambuja, quando um objecto arremessado à linha danificou uma conduta que imobilizou o comboio. Este ficou parado em plena via e os passageiros tiveram que ser transbordados para outra composição. Em virtude disso, vários comboios regionais e Intercidades sofreram atrasos entre 25 a 60 minutos.

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