Pinho vai ser ouvido no Parlamento a 20 de Dezembro

Castro Guerra, ex- secretário de Estado de Manuel Pinho, explicou na comissão de inquérito que era sua a pasta da energia, mas que o antigo ministro da Economia avocou todos os dossiês a partir de 2006.

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Miguel Manso

A audição do antigo ministro da Economia Manuel Pinho na comissão parlamentar de inquérito às rendas excessivas da energia está prevista para 20 de Dezembro, após a suspensão dos trabalhos devido ao Orçamento do Estado para 2019.

Em Setembro, os deputados da comissão de inquérito (CPI) decidiram que queriam ouvir Manuel Pinho já nesta quarta-feira, mas o antigo ministro da Economia do governo de José Sócrates explicou não ter disponibilidade para essa data, uma vez que, como trabalha fora do país, nos Estados Unidos, esta seria incompatível com as suas actividades profissionais.

Manuel Pinho disponibilizou-se para que a audição fosse por videoconferência – tal como aconteceu com outros intervenientes que também estavam fora do país –, cumprindo assim a data pedida, mas a comissão preferiu ouvi-lo presencialmente.

O antigo governante propôs as datas de 18, 19 e 20 de Dezembro e a comissão parlamentar de inquérito às rendas excessivas da energia escolheu a última.

"Vamos suspender os nossos trabalhos, hoje é a última audição que realizamos. Suspendemos os nossos trabalhos da comissão de 19 de Outubro a 10 de Dezembro, inclusive, para podermos acompanhar mais intensamente o Orçamento e não colidir com o Orçamento do Estado para 2019 o trabalho desta comissão", disse, no final da audição de hoje, a presidente da comissão, a deputada do PSD Maria das Mercês Borges. Os trabalhos desta comissão parlamentar de inquérito retomam no dia 11 Dezembro, estando as audições para esse período ainda por marcar.

Em 17 de Julho, o antigo ministro da Economia do Governo socialista esteve a ser ouvido na comissão parlamentar de Economia, Inovação e Obras Públicas, no mesmo dia em que, de manhã, tinha estado a ser interrogado no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP).
Durante as dezenas de perguntas dos deputados relativas aos eventuais pagamentos que terá recebido pelo Grupo Espírito Santo (GES) enquanto ministro da Economia do governo de José Sócrates, Manuel Pinho recusou sempre responder por serem matérias "em avaliação judiciária", deixando bem claro que tinha previamente imposto as regras para aceder "ao convite", resultante do requerimento do PSD.

Em Maio, em comunicado, o advogado de Manuel Pinho, Ricardo Sá Fernandes, revelou que o ex-ministro, que deixou de ser arguido no caso EDP, estaria disposto a prestar "todos os esclarecimentos" aos deputados, mas só depois de ser interrogado pelo Ministério Público.
Em 19 de Abril, o jornal online Observador noticiou as suspeitas de Manuel Pinho ter recebido, de uma empresa do GES, entre 2006 e 2012, cerca de um milhão de euros.

Pinho “agarrou” os dossiês da energia

Esta terça-feira, o antigo secretário de Estado Adjunto, da Indústria e Inovação Castro Guerra revelou na CPI que, no final de 2006, o então ministro da Economia "ganhou maior vontade de agarrar os dossiês da energia", tendo-os avocado para si.

António Castro Guerra começou por adiantar que foi convidado, "de forma inesperada", para o XVII Governo Constitucional por Manuel Pinho, e que, apesar de a palavra energia não constar da designação do seu cargo como secretário de Estado, "era responsável" por essa pasta.

"O ministro [Manuel Pinho] ganhou maior vontade de agarrar os dossiês da energia e eu achei isso normal. As minhas competências são delegadas e dediquei-me a outras áreas pesadas", revelou Castro Guerra.

A partir de Outubro de 2006, explicou o antigo governante, "o centro operacional da energia passou gradativamente para o gabinete do ministro da Economia", um processo que garante que foi feito de "forma pacífica" e "sem conflito", deixando claro que até aquele momento tinha trabalhado "com grande autonomia". "O ministro foi avocando os dossiês", detalhou.

Castro Guerra admitiu que, em Outubro de 2006, "teve uma frase infeliz" a propósito do aumento de 15,7% das tarifas da electricidade então proposto pelo regulador, explicando que foi a partir daí que começou "o envolvimento mais intenso" de Manuel Pinho.

"[Este processo] Ficou simbolicamente marcado com a exoneração dos meus dois assessores para a energia", recordou, saída que aconteceu em 17 de Abril de 2007.

Questionado pelo deputado do CDS-PP Hélder Amaral, Castro Guerra admitiu que havia problemas de estilo entre ele e Manuel Pinho, tinham "estilos diferentes" de actuação, mas assegurou que nunca "esteve em causa o abandono do Governo" na sequência desta perda de responsabilidade sobre a energia.

O antigo secretário de Estado achou "natural" que o ministro da Economia quisesse "avocar os dossiês da energia" uma vez que eram da sua tutela ministerial. "Havia muita coisa a fazer em outras áreas que tinham sido penalizadas devido à minha dedicação à energia", acrescentou.

Castro Guerra, no final da sua intervenção inicial, avisou, desde logo, que a sua "memória factual e de datas não é grande". "Eu posso responder muitas vezes 'não me lembro', mas se eu responder nesse sentido não estou a mentir, nem a dizer que não aconteceu. É só mesmo que não me lembro", antecipou, o que se veio a confirmar durante toda a audição, levando a críticas dos deputados.

Na sua passagem pela CPI, o antigo ministro do Ambiente Nunes Correia considerou haver um "mal-entendido basilar" quando se fala de extensão das concessões das barragens à EDP, contrapondo que se tratou apenas de uma "delimitação de um prazo" até então indefinido.

"Mal-entendido" no prazo das barragens

O ex-ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, do XVII Governo Constitucional liderado por José Sócrates, foi ouvido na terça-feira à tarde na CPI e trouxe uma visão completamente distinta das anteriores audições naquilo que diz respeito ao domínio hídrico.

"A palavra extensão [da concessão das barragens à EDP] é uma palavra que me surpreendeu quando a ouvi dita por várias pessoas, várias entidades, várias declarações, porque não é esse o filme que eu tenho do processo. O filme que eu tenho do processo é que houve uma limitação temporal. É surpreendente. É quase o contrário, embora eu compreenda porque é que se gera esse mal-entendido", disse.

Francisco Nunes Correia insistiu, ao longo de toda a audição e perante a contraposição dos deputados, que não se pode falar de extensão em relação aos contratos de 27 barragens da EDP, decididos em 2007, explicando que é preciso dar um "passo atrás", aos anos 70, quando aconteceu a nacionalização da eléctrica e as concessões que estavam em vigor ficaram com um prazo indeterminado.

"Se havia um prazo indefinido e de repente passou a haver um prazo, chama-se a isso extensão ou chama-se a isso uma delimitação? Eu chamo a isso uma delimitação", respondeu ao deputado do PSD Cristóvão Norte, deixando claro que se trata do "mal-entendido basilar por trás disto".

O antigo ministro do Ambiente foi peremptório: "Não houve uma extensão, houve um retomar dos prazos anteriores. Apenas isso. Foi limitado, não foi prolongado".

"Quando se reestabelece um prazo não se está a fazer uma extensão, está-se a fazer uma delimitação. Parece-me um dos mal-entendidos maiores aos meus olhos, do filme que eu tenho do Ministério do Ambiente, daquilo que eu tenho visto nas notícias dos jornais sobre esta questão", criticou.

A sua preocupação enquanto ministro foi relativa "às taxas de recursos hídricos", explicou aos deputados.

"A EDP não é nem mais nem menos do que os outros. E vai pagar. E pagou e julgo que foi muito bem utilizado nos projectos da Polis Litoral", lembrou.

Sobre se esta era a avaliação partilhada pelo restante Governo, Nunes Correia afirmou que a memória que tem "é que quando foi posto em cima da mesa que a EDP tinha de pagar uma taxa de recursos hídricos pelo período em que ia utilizar o domínio hídrico, isso causou estupefacção e uma certa contrariedade do próprio sector que tutela a energia".

"Admito que houve uma surpresa inicial", insistiu, mas garantiu que esta foi cobrada em "total sintonia com o Ministério das Finanças que reservou esse dinheiro para utilizar no Polis do Litoral".

Sobre o porquê de a EDP ter que pagar mais de 700 milhões de euros para beneficiar de algo a que já tinha direito, o antigo ministro do Ambiente explicou que "uma coisa é ter direito, outra coisa é pagar uma renda pela exploração de um bem".

"Mas isso são contas que a energia saberá explicar melhor", disse apenas, remetendo, assim, para o ministério então liderado por Manuel Pinho.

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