OE2019: uma oportunidade perdida

Este é um Orçamento repleto de medidas com impacto limitado para agradar a gregos e troianos.

No ano passado argumentei que o Orçamento apresentado era um orçamento à esquerda, com cedências que beneficiam maioritariamente a função pública à custa de medidas que a todos – público e privado – afetam. Este ano, quando Mário Centeno diz que “aumentos na função pública são um enorme esforço do Orçamento do Estado” (que é de todos), penso que um ano passou e nada mudou.

Mas este ano não é só um Orçamento à esquerda, é uma oportunidade perdida. É um Orçamento repleto de medidas com impacto limitado para agradar a gregos e troianos: aumentos e descongelamento das carreiras na função pública, aumento extraordinário das pensões, redução das propinas, passes sociais, descida do IVA. E mudanças estruturais? E a aposta no investimento? E a dívidas dos hospitais? Pormenores... Importante são os longos abraços de despedida que António Costa deu aos seus ex-ministros, no âmbito de uma remodelação num timing que não poderia ter sido melhor pensado.

Numa fase em que nos podemos congratular por termos o défice mais baixo da história da democracia, as políticas propostas ficam aquém do potencial gerado por uma execução orçamental controlada e um crescimento económico que em muito tem sido benéfico para colmatar o aumento (superior ao orçamentado) da despesa pública. A economia portuguesa continua a crescer, ótimo. Mas somos dos países que menos cresce na Europa. E quando a Europa estagnar? Qual vai ser a trajetória da economia portuguesa?

A saúde parece continuar a não ser uma prioridade política para o Governo. São opções, mas que têm de ser assumidas. O Orçamento para 2019 prevê um aumento de 5% (523 milhões) das verbas. Mas só os pagamentos em atraso dos Hospitais EPE ainda ascendem a 773 milhões. Este aumento não parece, assim, suficiente para não agravar a situação de suborçamentação a que assistimos há tempo suficiente na saúde. Qual é a estratégia para saldar esta dívida? Neste campo, temos algumas novidades: “a implementação de um novo modelo de financiamento em 11 Hospitais EPE, (...) e a introdução de alterações no modelo de gestão hospitalar em 2019.” É importante que estas alterações sigam, de facto, para a frente. Porque, tal como já vimos da experiência dos anos passados, não são os reforços de capital – também previstos neste Orçamento – que ajudam a alcançar uma melhor gestão orçamental que permita criar uma situação sustentável de equilíbrio financeiro.

Relativamente ao investimento público, já nem se pede uma “forte aposta” como a prometida (e esquecida) em 2018. Apenas uma aposta credível e adequada. O Orçamento prevê que o investimento ascenda a 3811 milhões. Tal significa que, para cumprir o que está orçamentado, se tenha de registar uma variação positiva de 48% face ao previsto para 2018... Realista? A média de variação homóloga do investimento público em 2018 tem sido apenas na ordem dos 6%.

Ficamos, com expectativa, mais um ano à espera de medidas que, apesar de poderem implicar gastos adicionais no curto prazo, ponderem a resolução de problemas e reformas mais estruturais que não podem ser consecutivamente adiadas, que fomentem o crescimento da economia portuguesa no longo prazo, e que melhorem a qualidade dos serviços públicos. Se não é quando Portugal apresenta o seu melhor desempenho económico e financeiro de há várias décadas, quando é que é a altura ideal para esta aposta?

Research fellow do Institute of Public Policy Lisbon. As opiniões aqui expressas vinculam somente a autora e não reflectem necessariamente as posições do IPP, da Universidade de Lisboa ou de qualquer outra instituição

A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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