Furacão Leslie no Centro: “20 minutos de destruição completa” e um balanço por fazer

Efeitos do furacão Leslie deixaram mais marcas na zona Centro e devem perdurar. Cerca de 60 mil casas estavam ontem sem energia eléctrica e 39 mil registavam dificuldades nas comunicações.

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José e Isaura Figueiredo estão emigrados nos Estados Unidos da América, mas vêm a Portugal todos os anos. Desta vez, levam de volta um grande susto. A moradia que têm na Cova Gala, uma praia do Sul da Figueira da Foz, foi atingida por uma estrutura de madeira que estava instalada à beira-mar na noite de sábado. Para ali chegar, as tábuas e barrotes que compunham um coreto tiveram que passar por cima de três linhas de casas. 

José, de 85 anos, conta que o casal estava a ver televisão por volta das 22h de sábado, quando começou a “vir vento forte”. Ouviu um estrondo e os estores corridos e o vidro duplo pouco fizeram para amenizar o impacto. O octogenário levanta o boné para mostrar as mazelas: teve que receber assistência médica por ferimentos causados pelos estilhaços. Quanto aos danos materiais, a casa “vai ter que levar um telhado, chaminé e painéis solares novos”, prevê, além das janelas da fachada, que ficaram destruídas. No interior da habitação, o casal tenta limpar o que é possível. Já a meio da tarde de segunda-feira, nem água nem energia eléctrica tinham sido reestabelecidas. 

Esta foi apenas uma das marcas que o furacão Leslie deixou em vários pontos da zona Centro, provocando 28 feridos ligeiros e 61 desalojados. Ao segundo dia depois da passagem da tempestade, ainda são muitos os sinais de destruição, principalmente nos concelhos mais litorais do distrito de Coimbra, mas também em algumas zonas dos distritos de Leiria, Aveiro e Viseu. Em municípios como Cantanhede, Coimbra, Condeixa-a-Nova, Figueira da Foz, Mealhada, Mira, Montemor, Pombal ou Soure, houve escolas que não abriram nesta segunda-feira, estando encerrados alguns serviços públicos e lojas. A Administração Regional de Saúde do Centro diz que não houve fecho de centros de saúde, mas regista interrupções da energia em várias unidades do Baixo Mondego. 

60 mil sem energia

Ao fim da tarde desta segunda-feira, cerca de 60 mil casas maioritariamente no distrito de Coimbra e na zona do Louriçal, Pombal, continuavam sem energia eléctrica. Entre o final da manhã e este último balanço, a EDP Distribuição repôs a energia a 10 mil clientes.

A situação mais grave verificou-se ao início da manhã de domingo quando mais de 300 mil clientes ficaram às escuras. A EDP Distribuição alocou, por isso, mais de 750 funcionários para identificar "as situações mais críticas” e instalar geradores. Cerca de 70 linhas de Alta e Média Tensão permanecem inoperacionais, “em particular nas localidades abastecidas pelas subestações de Louriçal e Soure", diz a empresa em comunicado.

A EDP Distribuição colocou os seus meios em estado de emergência para o distrito de Coimbra, admitindo recorrer a meios internacionais para repor a normalidade e reparar estragos.

Já a Altice adiantou ao final da tarde desta segunda-feira que cerca de 39 mil clientes da rede fixa continuavam com serviços de voz, Internet e televisão afectados. A empresa de telecomunicações, no mais recente balanço, garante que o trabalho de reconstrução da rede de fibra e cobre “está em curso”, evoluindo ao ritmo que as condições meteorológicas e de acessibilidade permitem – as falhas de energia, os cabos, traçados e infra-estruturas danificadas estão dificultar a reposição dos serviços. No domingo, 70 mil pessoas de sete concelhos da região Centro foram afectadas, especialmente em Coimbra, Aveiro, Leiria e Viseu.

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Também desde domingo, fez saber a Altice, os cerca de 500 funcionários que a empresa alocou para esta tarefa recuperaram cerca de 150 antenas da rede móvel, o que permitiu repor parte das comunicações nas zonas afectadas.

Estrondo enorme”

Na aldeia de Simões, concelho de Soure, a cobertura do pavilhão da associação cultural e recreativa local foi parar ao quintal de Manuel Gonçalves, de 62 anos, depois de voar cerca de 100 metros. Estava em casa na noite do temporal e conta que, por volta das 22h30, ouviu “um estrondo enorme”, como “um trovão prolongado. Refugiou-se na cave da casa em que vive com mulher e filha e, quando saíram, apercebeu-se do que se tinha passado: “saiu de lá tudo, como um chapéu, e desintegrou-se no ar. Passou por cima da casa e partiu uma chaminé”. O resultado são quase 300 metros quadrados de cobertura de chapa e metal retorcido pelo seu terreno e danos no telhado de casa. A fase mais agreste do furacão durou meia hora, refere Manuel Gonçalves. 

No centro da vila de Soure, por onde passou Marcelo Rebelo de Sousa nesta segunda-feira, havia ainda sinais do mau tempo, que deixou árvores derrubadas e telhas partidas no pavimento de várias ruas. O presidente do município, Mário Nunes, conta que só a meio da tarde de segunda-feira foi reposta a energia eléctrica na sede de concelho, estando a autarquia a tentar distribuir geradores pelas restantes localidades. “Em Soure, ninguém se recorda de algo semelhante. Houve uma tempestade em 2013, mas esta foi mais severa e muito mais rápida”. Desta vez, “foram 20 minutos de destruição completa”, relata. Quanto aos prejuízos em equipamento municipal, diz que já ultrapassam o milhão de euros, mas ainda há estragos por contabilizar. 

Em relação às escolas, que estiveram encerradas nesta segunda-feira, o autarca prevê que oito delas reabram até quarta-feira “o mais tardar”, sendo que três outras estão em condições “mais complicadas”. 

A cidade de Coimbra também sentiu os efeitos do fenómeno meteorológico, com queda de árvores, corte de estradas e a rede de transportes públicos urbanos condicionada, muito pelos danos na rede que suporta os tróleis. A Universidade de Coimbra (UC) registou igualmente estragos, principalmente nos tectos do Colégio das Artes e no Colégio de S. Jerónimo, na Alta Universitária. O director do Jardim Botânico da UC, António Gouveia, explica ao PÚBLICO que o espaço vai estar encerrado pelo menos até ao final da semana para trabalhos de recuperação e balanço. Várias árvores ficaram danificadas e outras foram derrubadas, incluindo uma araucaria columnaris, plantada em 1868 e rara em Portugal. O balanço final ainda está por fazer.

Também no sector agrícola houve registo de estragos. O secretário de Estado da Agricultura e Alimentação, Luís Vieira, foi a Montemor-o-Velho anunciar que, na reposição do potencial produtivo, o Governo vai fazer uso de um mecanismo idêntico ao utilizado no caso dos incêndios florestais. O governante lembrou que as culturas anuais estão abrangidas pelo seguro de colheitas, um mecanismo em que o Estado coloca 11,5 milhões de euros anualmente. Com Margarida David Cardoso

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