Obesidade e preconceito

Atualmente, a taxa de discriminação pelo excesso de peso é comparável às taxas de discriminação pela raça e pela idade.

A obesidade representa uma sobrecarga cada vez maior para os sistemas de saúde, dado que afeta mais de 20% das populações ocidentais. Em Portugal, na última década, a sua prevalência passou de cerca de 14% para 28%. Esta duplicação é assustadora, porque a obesidade aumenta significativamente o risco de desenvolver diabetes tipo 2, hipertensão, dislipidemia, doença hepática da obesidade (fígado gordo, na gíria popular). Muitas destas situações passam despercebidas durante anos, sem complicações clínicas evidentes, pelo que a consciencialização, tanto dos doentes como dos profissionais de saúde, é essencial para que sejam desenhadas estratégias de diagnóstico e possam ser realizados rastreios adequados. A obesidade está ainda associada a outras patologias, como a doença cardíaca coronária, acidente vascular cerebral, demência, apneia obstrutiva do sono e diversos tipos de cancro. Cada vez mais reconhecemos que a noção de distribuição de gordura, em vez do Índice de Massa Corporal (relação peso/estatura ao quadrado), está subjacente ao risco de doenças metabólicas em indivíduos obesos. A obesidade abdominal é o problema real. Costumo dizer aos meus doentes: diga-me o número das suas calças (saias) e digo-lhe que risco corre.

Mais do que tratar a obesidade, precisamos de a prevenir através de mudanças no estilo de vida. Para isso, precisamos de mudanças na sociedade: mais atividade física e melhoria nos hábitos alimentares.

A obesidade traz também consigo um estigma e um preconceito. Atualmente, a taxa de discriminação pelo excesso de peso é comparável às taxas de discriminação pela raça e pela idade, especialmente entre as mulheres. Em 1995-1996, a discriminação por excesso de peso foi relatada por 7% dos adultos dos EUA. Em 2004-2006, essa percentagem subiu para 12%.

A discriminação está associada à estigmatização, ou seja, estereótipos negativos e preconceitos endossados por empregadores, prestadores de cuidados de saúde, professores, colegas, familiares e pela comunicação social. A discriminação assume comportamentos e formas diferentes, incluindo tratamento injusto, como despedimento de um emprego por causa do excesso de peso, ter salários inferiores, ou até a nível médico não receber tratamento médico adequado (recusa de uma cirurgia até atingir um peso predefinido).

Estudantes com excesso de peso e obesos estão sujeitos a estigmatização por colegas e educadores. Os professores têm perceções preconcebidas sobre as capacidades dos jovens com excesso de peso ou obesidade, considerando que possuem menores competências sociais, de raciocínio, físicas e de cooperação do que os alunos com peso dito normal.

Apesar do preconceito generalizado em relação a essa população, muitas dúvidas permanecem sobre a natureza, extensão e impacto da estigmatização baseada no peso e experimentada por muitos. Estas importantes questões só podem ser adequadamente ultrapassadas pelo aumento da consciência da sua existência, por debates alargados e por campanhas de promoção da literacia em saúde.

Termino com um exemplo do que pode ser um preconceito, citando Cristina Cairo em A linguagem do Corpo:

“A gordura é o casulo que a pessoa cria, inconscientemente, para se proteger e se esconder dos problemas externos. [...]

Muitas vezes a gordura é uma forma convenientemente usada para se conseguirem certos benefícios, como atrair a compaixão de outras pessoas, deixar de trabalhar naquilo que não gosta, escapar de certas obrigações que limitam sua liberdade e até mesmo testar o amor e a fidelidade do cônjuge.

Mais uma vez vemos que o perigo está em nossa mente, não no mundo em que vivemos, e nem nos alimentos que comemos.”

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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