Lula e o PT ofereceram o Brasil a Bolsonaro

Bolsonaro é uma erva daninha que foi diariamente regada por um PT profundamente corrupto, que os brasileiros (à excepção dos nordestinos) querem hoje ver para trás das costas.

Neste momento, é mais provável encontrar o Cristo Redentor a caminhar sobre as águas da Guanabara do que Fernando Haddad vir a ser eleito presidente do Brasil. Está feito. O Palácio do Planalto é de Jair Bolsonaro. Haddad conseguiu apenas adiar o inevitável durante três semanas. Com 46% dos votos na primeira volta e um país totalmente polarizado, ninguém acredita que o candidato do PT consiga ir buscar mais 20 milhões de votos no segundo turno e Bolsonaro se mostre incapaz de arrebanhar os cinco que lhe faltam. Sei que a esquerda portuguesa tem o exemplo de Mário Soares para se animar (em 1986, Freitas obteve 46,3% na primeira volta e Soares 25,4%), mas nem Portugal é o Brasil, nem Bolsonaro (ao contrário de Freitas) esgotou todos os votos da direita brasileira.

Aquilo que eu penso do senhor Bolsonaro já ficou escrito no sábado (“Bolsonaro: um fascista é um fascista”), e acho extraordinário que boa parte do eleitorado proceda a uma limpeza de carácter do candidato contra as suas próprias palavras. Nós já tínhamos visto isto nos Estados Unidos com Donald Trump, e é uma nova e desconcertante forma de olhar para a política, que ficou bem definida na famosa máxima: “The press takes him literally, but not seriously; his supporters take him seriously, but not literally.” Com Bolsonaro acaba de acontecer o mesmo: boa parte da imprensa e toda a oposição agarraram-se a uma literalidade que os seus apoiantes recusam – Bolsonaro, dizem estes, não é tão preconceituoso, racista e homofóbico como parece; não é tão selvagem quanto as suas palavras indicam; a postura fascista e troglodita é apenas um caminho necessário para chegar ao poder, que ele depois tratará de exercer com equilíbrio e ponderação. Pois bem: eu não compro. Não resultou com Trump, não resultou com Duterte, não resultou com Orbán, muito menos há-de resultar com Bolsonaro ou com os mini-Bolsonaros (incluindo os seus dois filhos eleitos, que parecem, como nas piores famílias, tirados a papel químico do pai) que de repente pululam pelo Brasil.

Significa isto que vem aí golpe militar? Claro que não. Como aqui dizia ontem Jorge Almeida Fernandes, “os golpes estão fora de moda”. A golpada século XXI consiste em encontrar “formas mais ‘institucionais’ de autoritarismo e controlo social”. Não se estrangula – vai-se diminuindo aos poucos o oxigénio no ar. Um leitor, discordando do texto em que chamei fascista a Bolsonaro, alertava para a ideologia do PT e para o seu comportamento desde a prisão de Lula, utilizando um bom argumento: “Penso que, apesar de todos os defeitos de Bolsonaro, o risco de deriva totalitária é maior com o PT. O Brasil enfrenta o risco de venezuelização, mais do que o de mussolinização.” Eu percebo isto. Discordo de qualquer limpeza de imagem de um cavernícola como Bolsonaro, mas percebo o medo do PT e a crítica ao seu comportamento. Não há como negá-lo: a linguagem da esquerda na fase Lava-Jato foi um ataque constante à separação dos poderes e, nesse sentido, à própria Constituição.

Bolsonaro é uma erva daninha que foi diariamente regada por um PT profundamente corrupto, que os brasileiros (à excepção dos nordestinos) querem hoje ver para trás das costas. A esquerda brasileira demorou muito tempo a perceber isso. A portuguesa ainda não percebeu. A corrupção mata os regimes democráticos. Está a acontecer no Brasil. Era bom que não viesse a acontecer em Portugal. Mais sobre isto na quinta-feira.

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