Serralves: PS só toma posição depois de ver exposição de Mapplethorpe

Requerimentos do Bloco e do PS para audições da administração de Serralves e do director demissionário foram aprovados. Deputados visitam exposição dia 4 a convite de Ana Pinho mas só questionam os envolvidos na semana seguinte.

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Nelson Garrido

A administração da Fundação de Serralves e o director demissionário só deverão ser ouvidos no Parlamento na segunda semana de Outubro sobre a polémica em torno da exposição dedicada ao fotógrafo Robert Mapplethorpe. Antes disso, os deputados da Comissão de Cultura vão primeiro visitar a exposição.

A decisão sobre a visita motivou discussão dentro da comissão já que a ida a Serralves foi pedida pelo PS no mesmo requerimento em que propunha a audição das duas partes da polémica. Porém, esse pedido dos socialistas entrou nos serviços da comissão já depois de um convite formal da própria presidente da fundação de Serralves, Ana Pinho, que está debaixo de fogo neste caso.

A mostra está sob polémica depois do layout expositivo ter sido alterado alegadamente sem o consentimento do curador, e por ter inicialmente duas salas interditas a menores de 18 anos (que o curador garantira ao PÚBLICO não ir acontecer) e até terem sido retiradas algumas das obras. Está por explicar que tipo de restrições foi ou não decidido, quem decidiu, quando e quem aceitou ou recusou.

Bloco desagradado com calendário

Este calendário de fazer primeiro a visita e só depois a audição não agrada ao Bloco de Esquerda, o primeiro partido a anunciar a intenção de chamar à Assembleia da República a administração liderada por Ana Pinho, e o director demissionário do Museu e curador da exposição em causa, João Ribas. O partido defende que a visita prévia pode ser entendida como a opção por uma das partes da contenda. Até porque essa visita decorre de um convite.

Na missiva que enviou na segunda-feira à tarde à comissão, Ana Pinho refere-se à “situação desagradável” noticiada no fim-de-semana nos media e propõe que, “com o objectivo de melhor poder esclarecer qualquer dúvida que as notícias possam suscitar”, a Comissão de Cultura visite a exposição. Depois de realçar que a Fundação de Serralves “tem pautado a sua conduta por princípios de transparência e rigor em prol da cultura para todos”, Ana Pinho garante que é assim que a instituição “continuará”.

Edite Estrela desvaloriza

Questionada pelo PÚBLICO, a presidente da Comissão de Cultura, a socialista Edite Estrela, desvaloriza a questão do convite de Ana Pinho e de uma possível parcialidade dos deputados na análise do assunto por serem convidados da administração de Serralves e prefere argumentar que o PS também propôs a visita e que ela foi aprovada pelos deputados.

O deputado Jorge Campos, eleito pelo Porto, contou ao PÚBLICO que depois da entrada do requerimento do Bloco para as audições, chegou à comissão um convite da administração da fundação para que os deputados visitassem a exposição, no Porto. Um convite raro, aponta o bloquista, que só se lembra de outro do género por parte de Serralves para a mostra dedicada a Miró.

O PS, por seu lado, requereu à presidente da comissão que "perante as contradições e polémicas" sobre a apresentação da obra de Mapplethorpe, agende uma visita à exposição Roberth Mapplethorpe: Pictures, "para que os deputados desta comissão possam conhecer as obras que estão no centro da polémica, o seu roteiro expositivo e a também polémica sinalética da exposição". A seguir, os socialistas requeriam ainda a audição da administração e do director demissionário.

PS exigiu visita prévia à exposição

O problema, aponta Jorge Campos, é que na reunião da comissão o PS fez depender as audições da visita prévia à exposição. "Isso iria legitimar uma situação que está por explicar e que queremos esclarecer — e seria tomar uma posição que não cabe ao Parlamento tomar. A visita à exposição cabe nas atribuições da comissão, mas podemos fazê-la noutra altura", argumenta o deputado, que votou contra o requerimento do PS. Este, porém, foi aprovado com os votos do PSD e CDS - o PCP não estava na reunião, mas fez saber que aprovava todos os requerimentos. Já o requerimento do Bloco foi aprovado por unanimidade.

Jorge Campos realça que o Museu de Serralves é hoje um dos mais importantes museus de arte contemporânea da Europa e uma referência em todo o mundo e o caso, que envolve acusações de censura, já teve repercussão na imprensa internacional. O deputado insiste na necessidade de escrutínio do que aconteceu acrescentando que a instituição tem "participação e financiamento do Estado", que ronda a anualmente pelo menos quatro milhões de euros.

"A decisão de alterar a organização da exposição, retirando algumas obras da exposição e, noutros casos, juntando numa mesma sala obras classificadas por critérios desconhecidos como 'para maiores de 18 anos', é inédita em Serralves e suscita a maior perplexidade. Os museus são espaço de conhecimento e liberdade. O respeito pelos visitantes faz-se pela informação clara sobre a natureza das exposições", defende o Bloco no requerimento.

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