Uma Europa que protege precisa de uma força de polícia de fronteiras, defende Juncker

Presidente da Comissão Europeia faz o seu derradeiro discurso do Estado da União esta quarta-feira em Estrasburgo.

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Dario Pignatelli/REUTERS

O detalhe das propostas concretas ainda não é conhecido, mas não há grande mistério sobre qual será o conteúdo político do derradeiro discurso de Jean-Claude Juncker sobre o Estado da União, esta quarta-feira no plenário do Parlamento Europeu em Estrasburgo. “Podem esperar um grande ênfase na narrativa sobre a Europa que protege”, avançou o porta-voz do presidente da Comissão Europeia, sem confirmar que Juncker se prepara para propor o fortalecimento das competências e do mandato da Guarda Costeira e de Fronteiras, para a converter numa verdadeira força de polícia europeia.

Sem abrir muito o jogo, fontes que participaram nas discussões preparatórias do discurso com Juncker disseram ao PÚBLICO que, na sua intervenção, o presidente da Comissão insistirá na necessidade — e urgência — de ver aprovadas medidas para resolver aquele que constitui, no momento, o principal desafio e a maior dor de cabeça da Europa: a gestão das fronteiras externas e o acolhimento e integração de refugiados. Essas são as duas faces de uma moeda que também simboliza as crises migratória e política, cujo impacto tem estado a alterar profundamente a paisagem política europeia.

Nos seus esforços para acalmar o ímpeto dos populistas, a estratégia da Comissão parece basear-se no princípio de que se não podes vencê-los, junta-te a eles: sob a pressão dos líderes que, do Norte ao Sul da Europa, parecem alimentar-se da reacção popular à entrada de migrantes, e em contra-relógio para as eleições europeias de Maio de 2019, as maiores novidades têm a ver com as questões migratórias e com a democracia europeia — o combate à difusão de fake news nas redes sociais, a salvaguarda da integridade dos processos eleitorais e a reforma das regras de funcionamento das instituições, por exemplo com o fim das decisões por unanimidade.

Como avançou o diário espanhol El País, Juncker vai defender a federalização da actual guarda costeira e de fronteiras, para que esta passe a operar num sistema único “com capacidade de vigilância em território europeu, possibilidade de intervir em países terceiros e poderes para participar nas operações de devolução de irregulares”. A ideia não é nova, mas a Comissão nunca tinha insistido nela por causa da feroz oposição de alguns dos Estados membros (que continuam a ser contra esta hipótese).

Maria João Rodrigues, a política portuguesa que tem estado presente nos principais momentos da construção europeia, não encara o último debate sobre o Estado da União desta legislatura como um, mas avisa que “estamos numa corrida contra o tempo” em termos do desenvolvimento do projecto da UE. “Este último debate é um momento chave para se poder definir até onde as instituições podem levar por diante as ambições europeias até as eleições em Maio”, diz a eurodeputada socialista, em conversa com o PÚBLICO.

Rodrigues acredita que as instituições europeias ainda têm tempo, até às eleições europeias, de concluir os principais dossiers que têm em mãos, e em especial aqueles cujas soluções “já foram trabalhadas ao pormenor” mas continuam a arrastar-se, como por exemplo a reforma da união económica e monetária, com a constituição de uma capacidade orçamental própria da zona euro para suportar reformas estruturais. “Estamos numa situação em que só falta a vontade política”, notou.

O que pediu a Juncker dias antes do debate, revelou, foi para que ele cuidasse para que todos os esforços nesta recta final do mandato fossem no sentido de “dotar a UE de instrumentos mais fortes de influência sobre o quadro global mundial”, sobretudo em temas que são vitais para os europeus, como a resposta às alterações climáticas, a negociação de acordos comerciais e a governação democrática da Internet.

A previsível tónica nas questões ligadas à gestão da imigração é, para Maria João Rodrigues, ajustada, e a eurodeputada espera que a Comissão “apareça com soluções mais precisas para concretizar uma estratégia de conjunto sem a qual este problema não tem solução”. Nessa estratégia coloca a promoção do desenvolvimento dos países de origem de imigração, nomeadamente a cooperação com África, a gestão — ao nível europeu e não nacional — das fronteiras externas da UE, e a criação de um sistema de asilo europeu para além de Dublin. “Ele é imprescindível e tem de ser criado”, defende.

Para além de oferecer propostas concretas, o discurso do Estado da União servirá para fazer um balanço da agenda política da Comissão, projectando os desafios do futuro. Será nesse momento que Juncker tentará contrariar o discurso negativo sobre a Europa, e devolver confiança e esperança aos eleitores europeus.

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