Pela terceira vez, extrema-direita volta a sair à rua em Chemnitz

Polícia mobilizou mais agentes para garantir que violência não se repete. Um funcionário da polícia foi suspenso por ter alertado grupo extremista para a nacionalidade dos autores do homicídio da semana passada.

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Manifestantes de extrema-direita voltaram a marchar em Chemnitz MARTIN DIVISEK

Pela terceira vez numa semana, grupos de extrema-direita voltaram a marchar pelas ruas da cidade alemã de Chemnitz na tarde de sábado, em protesto contra a entrada de imigrantes e requerentes de asilo no país. Uma contramanifestação foi também convocada, mas desta vez a polícia montou um forte dispositivo de segurança para evitar os episódios de violência de há uma semana.

A cidade do estado federado da Saxónia voltou a ser o local de encontro de duas visões radicalmente diferentes da sociedade: uns defendem uma Alemanha multicultural e tolerante, apoiantes da política de portas abertas aos refugiados fixada no Verão de 2015 pela chanceler Angela Merkel; outros reagem ao que dizem ser uma “invasão” que põe em risco a segurança dos alemães e têm Merkel como alvo.

Na manifestação convocada pelo partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AfD) era possível ver cartazes em que Merkel e a CDU eram acusados de “traição” ao país. “Onde está ela?”, questionava um homem que discursava para uma pequena multidão, de acordo com a Reuters. “Está a viajar em África. Ela devia estar aqui e enfrentar os cidadãos”, acrescentou, referindo-se à viagem de três dias da chanceler logo após as manifestações anteriores.

A tensão é elevada em Chemnitz, cidade de 250 mil habitantes próxima de Dresden, desde a madrugada de sábado passado, quando um alemão de origem cubana de 35 anos morreu esfaqueado na sequência de uma altercação com dois requerentes de asilo. A notícia do homicídio, acompanhada de boatos como o de que a vítima estava a proteger uma mulher de ser violada, espalhou-se em poucas horas e acendeu um rastilho difícil de conter. Logo no domingo, cerca de 800 pessoas juntaram-se no centro da cidade com o objectivo de identificar e perseguir os estrangeiros que encontrassem, enquanto faziam saudações nazis.

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Memorial em honra do alemão de origem cubaba assassinado no fim-de-semana passado Hannibal Hanschke/REUTERS

No dia seguinte, uma nova manifestação convocada pela extrema-direita juntou oito mil pessoas, um número surpreendente, apesar de a Saxónia ser uma das regiões com maior implantação de organizações neonazis na Alemanha. A escassa presença policial não impediu confrontos entre elementos de extrema-direita e contramanifestantes que se encontraram a certa altura, tornando o centro da cidade num autêntico campo de batalha campal.

Polícia alertou neonazis

O clima de tensão foi aprofundado nos últimos dias com a divulgação das suspeitas de que os grupos de extrema-direita foram informados por fontes nas forças de segurança de que os autores do homicídio eram requerentes de asilo. Um funcionário da administração penitenciária admitiu ter divulgado o teor dos dois mandados de detenção a um grupo de neonazis “em nome da verdade”, acabando por ser suspenso de funções.

Para as manifestações deste sábado, a polícia decidiu não correr riscos e montou um forte contingente, contando com mais de 1200 agentes, incluindo alguns de estados vizinhos. O jogo da segunda divisão de futebol entre o Dynamo Dresden e o Hamburgo foi mesmo adiado para que os recursos policiais se concentrassem nas manifestações.

Para a forte afluência à manifestação da extrema-direita contribuiu uma aliança de conveniência entre grupos neonazis, a Alternativa para a Alemanha (AfD) e o Pegida, um grupo criado há quatro anos em Dresden declaradamente anti-Islão. “A mistura entre extremistas de direita e eleitores da AfD é nova”, disse ao New York Times o professor da Universidade Livre de Berlim, Hajo Funke. O partido alcançou 27% dos votos na Saxónia nas eleições federais do ano passado, tornando-se na segunda força política no estado.

Apesar das afinidades, a AfD insiste em distanciar-se dos movimentos neonazis. No sábado, convocou uma “manifestação silenciosa” em Chemnitz apenas para homenagear a vítima do homicídio de há uma semana. O silêncio da marcha foi por vezes quebrado por palavras de ordem contra a imprensa, apelidada pelos manifestantes de “Lügenpresse”, um termo amplamente utilizado pelo Partido Nazi para se referir pejorativamente ao que dizia ser “imprensa mentirosa”.

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