Ainda não é o fim da história para a Grécia

É muito tentador ver a saída da Grécia do seu terceiro e último programa a 20 de Agosto como o fim de uma longa e desagradável história. Porém, na verdade, é apenas a conclusão de um capítulo e o final feliz desta história continua uma ilusão.

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Miguel Manso

A economia grega, que teve um crescimento recorde no primeiro trimestre, permanece frágil, a taxa de desemprego ainda está acima dos 20%, apesar de o emprego ter aumentado, os impostos em dívida continuam a aumentar e já ultrapassaram a marca dos 100 mil milhões de euros, mais de 20% da população continua em risco de pobreza, os impostos e as contribuições para a segurança social estão entre as mais altas da União Europeia e as fragilidades das instituições do país ainda não foram alteradas através de reformas estruturais.

Ao mesmo tempo, o acordo celebrado no Eurogrupo no fim de Junho não resolve o problema da dívida grega. Em termos de sustentabilidade de longo prazo, simplesmente houve uma reafirmação do compromisso da zona euro em intervir se necessário. A médio prazo, foi feita uma tentativa de definir uma trajectória para os próximos 10 a 15 anos ao tornar geríveis os custos do serviço da dívida e as necessidades de financiamento.

O prolongamento por 10 anos do período de carência para o pagamento de juros e amortização dos mais de 95 mil milhões de euros emprestados à Grécia como parte do segundo resgate, juntamente com a extensão das maturidades por mais dez anos, significa que o actual governo e os seguintes não deverão estar sob muita pressão para pedir empréstimos a investidores a partir deste momento e até 2032, permitindo ao país que reentre no mercado de obrigações.

Além disso, o retorno de 4,8 mil milhões de euros em lucros das obrigações gregas detidas pelos bancos centrais da zona euro (através dos instrumentos ANFA e SMP) e o desembolso de mais de três mil milhões de euros para comprar de volta alguns dos 10,4 mil milhões de euros que Atenas deve ao Fundo Monetário Internacional ajudam a aliviar o fardo nos próximos anos. Com uma almofada de liquidez de 24 mil milhões de euros, Atenas deverá estar completamente financiada até ao Verão de 2020, gerando um pouco mais de espaço para respirar enquanto sai do programa este Verão.

Não é o ideal mas a zona euro tem demonstrado ao longo dos últimos oito anos que negoceia com o que é politicamente alcançável e não com o melhor cenário possível.

O acordo conseguido no Luxemburgo foi feito para permitir a todos os envolvidos alguma folga e mantém a forma fragmentada como os decisores da zona euro têm abordado os problemas, por muito frustrante e dispendiosa que seja para os países abrangidos, como a Grécia e Portugal.

Porém, existe um entendimento geral de que a questão da dívida grega terá de ser revisitada no futuro. As consequências de manterem as actuais intervenções a um nível aceitável para todos os estados-membros e os seus públicos domésticos significa que um novo grupo de decisores terá de regressar ao tema quando os pagamentos do empréstimo do segundo pacote de resgate começarem em 2033. Outra extensão, ou outra forma de ajuda, será provavelmente necessária, permitindo a Atenas ter mais tempo para cumprir os seus compromissos.

É igualmente claro que, apesar de a Grécia ser provavelmente capaz de, no máximo, gerar excedentes primários de 3,5% do PIB até 2022, atingir excedentes primários do de 2,2% do PIB até 2060 é impossível.

A redução destas metas orçamentais terá também de fazer parte de qualquer discussão que envolva o futuro da Grécia.

Se mais intervenções serão feitas no futuro depende do tipo de ambiente político que prevalecer na zona euro nessa altura e de a moeda única fazer algum tipo de progresso ao tentar resolver as suas fraquezas, que foram sendo expostas desde que a Grécia se tornou o primeiro estado-membro a pedir um resgate em Maio de 2010.

Entretanto, a Grécia terá de se focar nos elementos que pode controlar, que incluem criar um ambiente mais favorável às empresas, utilizando qualquer margem de manobra orçamental sabiamente e completando as reformas estruturais mais importantes, incluindo as que se referem à administração pública e judiciária, e que não foram devidamente abordadas nos anos anteriores.

Muitos comentadores e políticos, incluindo o primeiro-ministro Alexis Tsipras, vêem Portugal como um exemplo do que pode ser alcançado quando o programa chega ao fim. A grande diferença, porém, é que a crise da Grécia foi muito mais longa e profunda e a sua economia não é tão orientada para o exterior como a economia portuguesa.

A Grécia também está a sair do programa numa altura difícil política e economicamente. Nas últimas semanas, o rendimento das suas obrigações foi significativamente afectado pela crise política em Itália, enquanto o valor das acções bancárias gregas foram afectadas pelo nervosismo sobre a situação da Turquia.

O governo esperava emitir obrigações de longo prazo, provavelmente uma emissão a dez anos, antes do fim do programa, como parte do esforço que iniciou o ano passado para restabelecer uma relação com investidores, mas teve de adiar estes planos uma vez que as condições do mercado não têm sido favoráveis.

Foi um lembrete de como a Grécia estará vulnerável quando sair do resgate e de como continuará a haver alguma incerteza sobre o que os próximos anos terão reservado para o país.

Além de restaurar a confiança entre os hedge fund (fundos de alto risco) e outros mercados, existe também o problema de atrair investimento directo estrangeiro nos próximos anos. No seu mais recente Artigo IV sobre a Grécia, o FMI sugeriu que a economia grega não pode esperar, realisticamente, crescer mais do que 1% em média a longo prazo, mesmo que as restantes reformas urgentes sejam cumpridas. Crescimento de 1% não será suficiente para sarar as profundas feridas sociais que foram geradas pela crise e a má gestão, tanto a nível nacional como europeu.

Para alterar esta dinâmica, a Grécia terá de atrair níveis muito mais altos de investimento estrangeiro. Tal envolve uma mudança na mentalidade da classe política grega, que demonstrou muitos defeitos ao longo do desenvolvimento da crise e durante os últimos oito anos. É aqui que o material para o próximo capítulo da história será encontrado.

Nick Malkoutzis é o editor de temas económicos e políticos do site MacroPolis, e um dos analistas económicos mais influentes no jornalismo grego, tendo ganho notoriedade global durante a cobertura da crise grega, que culminou na intervenção da troika naquele país.

Tradução de Ana Silva

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