Situação mantém-se "complexa". Fogo avança para Silves e Portimão

Fogo no distrito de Faro entra esta terça-feira no seu quinto dia de actividade. Há mais bombeiros e meios aéreos no terreno desde o início da manhã, mas o combate está a ser dificultado pelo vento. Incêndio está sob investigação do Ministério Público e da PJ.

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O fogo em Monchique lavra deste sexta-feira
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O fogo em Monchique lavra deste sexta-feira LUSA/MIGUEL A. LOPES
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O incêndio de Monchique continua a apresentar "grande complexidade" e um "comportamento extremamente agressivo", declarou ao início desta noite a comandante nacional operacional adjunta da Protecção Civil, Patrícia Gaspar. A responsável afirmou em conferência de imprensa que as "condições meteorológicas adversas", a orografia da zona e a dispersão populacional continuam a implicar uma “necessidade quase constante de redefinição e readaptação da estratégia” de combate às chamas. E encarou como uma "opção perfeitamente normal" a passagem do comando das operações de combate para estrutura nacional da ANPC.

Às 20h, o balanço operacional era de cerca de 1200 bombeiros no terreno, apoiados por 412 veículos, 12 aeronaves e 25 máquinas de arrasto, auxiliados por 130 elementos das Forças Armadas, e ainda pela GNR, Cruz Vermelha e Segurança Social, que está a acompanhar 230 pessoas que tiveram de ser retiradas das suas casas. 

Esta terça-feira, e a juntar aos três Canadairs enviados pelo Governo de Espanha, era esperada a chegada de bombeiros do país vizinho para combater o incêndio de Monchique, que deflagrou na sexta-feira e continua fora de controlo. A informação sobre os meios vindos de Espanha foi avançada ao PÚBLICO pelo presidente da Câmara de Monchique, Rui André. “Este incêndio já dura tempo de mais e tem de acabar rapidamente”, diz o autarca, acrescentando que esta medida foi possível com a alteração do comando, que deixou de ser distrital para ser assumido directamente pela Protecção Civil nacional.

Por volta das 16h30 desta terça-feira, o fogo ardia em Marmelete e projectava-se em direcção a Portimão e Aljezur. O vento forte está a dificultar as operações de combate às chamas. No quartel da corporação de Monchique não há telefone nem Internet. O único meio de contacto com o exterior é um rádio fixo ligado ao satélite. Esta situação é resultado dos cabos que foram queimados ou partidos como consequência do fogo na zona envolvente à Fóia, onde se situam as antenas dos vários equipamentos de comunicação. Outra das consequências do fogo que continua a alastrar é o corte de água no centro da vila.

Entretanto, Ministério Público (MP) e Polícia Judiciária (PJ) estão a investigar o incêndio. “O Ministério Público do DIAP [Departamento de Investigação e Acção Penal] de Faro vai investigar os incêndios de Monchique, para determinar as suas causas e o seu eventual enquadramento legal”, refere a Procuradoria-Geral da República, numa resposta escrita à Lusa. Fonte oficial da PJ confirmou que a polícia “está a investigar” o incêndio, no âmbito desta investigação titulada pelo DIAP de Faro.

A Protecção Civil informou na manhã desta terça-feira que as operações de combate se mantêm de “elevada complexidade”. Várias localidades na serra de Monchique estão sem telecomunicações móveis, estando as operadoras a aguardar autorização da Protecção Civil para intervir no terreno e restabelecer a totalidade das comunicações, afirmaram as empresas esta terça-feira.

Contactada pela agência Lusa, fonte da Nos confirmou que o incêndio afectou “um site móvel e alguns dos serviços fixos”, estando a empresa a aguardar autorização para poder reparar os danos causados.

Fonte da Vodafone, por sua vez, disse à agência Lusa que desde a manhã desta terça-feira “há duas estações em baixo”, devido a falha de energia, que “poderão causar interrupções no serviço”. “Não conseguimos prever quando será solucionado o problema porque estamos dependentes do parceiro. Não se trata de serviços nossos queimados, mas sim de falta de energia que coloca as nossas estações em baixo”, afirmou. De acordo com a mesma fonte, as duas estações localizam-se nas Caldas de Monchique, no concelho de Monchique.

Contactada pela agência Lusa, fonte da Altice Portugal afirmou que “está activamente a colaborar com todas as autoridades“, tendo alocado a Monchique, desde sexta-feira, “cerca de uma centena de técnicos especializados que acompanham o evoluir da situação no terreno”. A mesma fonte confirmou que na madrugada de hoje foram “danificadas estruturas de comunicação móvel”, estando a ser feita a reposição do serviço.

A Altice Portugal informou ainda que se “mantém atenta à operacionalidade da rede SIRESP” (utilizada pelas forças de segurança e socorro), que “até ao momento se encontra operacional e sem falhas relevantes”. 

Segundo o site da Protecção Civil, consultado às 14h24, o incêndio mobilizava 1157 bombeiros, apoiados por 343 viaturas e 15 meios aéreos. Como não podem operar durante a noite, os meios aéreos retomaram o combate às chamas por volta das 7h30. 

Durante a noite, “extremamente activa, com reactivações muito violentas”, mais de 250 pessoas foram deslocadas para locais seguros, disse o comandante distrital de Faro, Vítor Vaz Pinto, durante uma conferência de imprensa por volta das 10h. As condições meteorológicas “continuarão desfavoráveis a quem tem de combater o incêndio”, acrescentou, havendo “um esforço direccionado para a salvaguarda das pessoas e habitações”. A temperatura máxima vai rondar os 35 graus Celsius nesta terça-feira.

Segundo a Protecção Civil, “regista-se em todo o perímetro [do incêndio] fortes reactivações que, associadas à intensidade do vento, tomam de imediato grandes proporções”. O combate tem sido dificultado pela intensidade e constantes mudanças de direcção do vento e pela dificuldade de acesso dos meios terrestres ao terreno devido à densa vegetação existente, disse fonte do Comando Distrital de Operações de Socorro de Faro (CDOS).

Monchique identificado como o concelho mais preocupante

José Miguel Cardoso Pereira, investigador no Centro de Estudos Florestais (CEF) do Instituto Superior de Agronomia (ISA) da Universidade de Lisboa e coordenador do estudo que apontava Monchique como o concelho do país com maior risco de incêndio este ano disse, esta terça-feira, que “ninguém tomou grandes medidas de limpeza da floresta” nesta área, que desde 2003 estava a acumular vegetação. “Nem o Governo nem os proprietários nem ninguém tomou, propriamente, grandes medidas de limpeza da floresta em Monchique", disse à agência Lusa. 

No âmbito de um estudo sobre as áreas de maior risco de incêndio este ano (divulgado em Maio), os investigadores do CEF identificaram Monchique como o concelho mais preocupante, já que “é um sítio onde há historial de haver grandes incêndios, tem uma grande percentagem da área coberta por floresta ou por matos e a última vez que ardeu foi em 2003”.

De acordo com José Miguel Cardoso Pereira, a serra de Monchique não ardia há 15 anos, pelo que “estava desde essa altura, gradualmente, a acumular vegetação, que fazia prever que estivessem reunidas condições problemáticas e de alta probabilidade para ocorrência de fogo”.

Em relação aos trabalhos de limpeza da floresta, o investigador considerou que o que se fez neste concelho do barlavento algarvio, tal como no resto do país, foi “limpar uma pequena área em torno das casas, em torno das povoações”, pelo que o trabalho nas dezenas de milhares de hectares florestais que foram já afectados pelo fogo “não foi feito, nem agora nem antes”.

“Houve planos de criar faixas largas com combustível reduzido para facilitar o combate e dificultar a propagação do fogo, mas só uma parte reduzida desses planos” é que passou para o terreno. “Portanto, estavam criadas as condições para que pudesse acontecer um incêndio de grandes proporções”, afirmou José Miguel Cardoso Pereira.

Corte da EN 266

O fogo saltou do concelho de Monchique para os concelhos de Portimão e de Silves. No ar, há pelo menos três aviões Canadair que andam incessantemente de um lado para o outro. Entre as 17 aeronaves que estão a operar, há ainda helicópteros-bombardeiros e dois aviões de avaliação e coordenação para apoio à decisão. 

O Exército e os bombeiros estão posicionados para defender as casas e resgatar as pessoas, evitando situações dramáticas. O incêndio lavra, potenciado por ventos fortes, podendo repetir-se em Silves um cenário semelhante ao que aconteceu em Mochique.

Durante a noite, o fogo que esteve às portas de Monchique fez com que ardesse a zona envolvente de um mosteiro conhecido como “Mosteiro do Desespero”, no Pomar Velho. A zona estava limpa, mas os restos de material vegetal estavam amontoados pelo terreno.

Os locais mais preocupantes são a zona da Fóia e o sítio da Cascalheira, ambos em Monchique, e a Barragem de Odelouca, já no concelho de Silves. Há ainda outra zona preocupante para as autoridades, nas Caldas de Monchique, onde o fogo também está a lavrar “com muita intensidade”, acrescentou a fonte do CDOS, referindo-se às termas, uma zona situada a cerca de quatro quilómetros da vila de Monchique e onde existem várias unidades hoteleiras, embora todas já tivessem sido evacuadas pelas autoridades no domingo. 

Este foco de incêndio obrigou ao corte da Estrada Nacional n.º 266, disse à Lusa fonte da GNR. Esta estrada liga Monchique a Porto de Lagos, de onde depois se segue até Portimão, via Estrada Nacional n.º 124. 

Corte de energia por segurança

A EDP teve de cortar o abastecimento nalgumas localidades na zona do fogo de Monchique por questões de segurança e abasteceu de madrugada outras localidades com geradores, segundo fonte oficial da empresa. De acordo com a directora de comunicação da EDP Distribuição, Fernanda Bonifácio, houve zonas em que o abastecimento de electricidade foi cortado por questões de segurança “e a pedido da Protecção Civil”, nomeadamente Fóia e Caldas de Monchique, distrito de Faro.

A mesma responsável adiantou ainda à agência Lusa que há zonas sem abastecimento porque houve estruturas que ficaram destruídas pelo fogo, tendo a EDP colocado geradores nalgumas vilas durante a madrugada.

O incêndio no distrito de Faro entra esta terça-feira no seu quinto dia de actividade e já causou, pelo menos, 29 feridos. O número de assistências médicas a pessoas na sequência do incêndio subiu para 95, dos quais 66 são pessoas que apenas receberam assistência e 29 são feridos, todos ligeiros, explicou o comandante operacional distrital da Protecção Civil de Faro, Abel Gomes.

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