“Há desorçamentação na conta da luz”, acusa Carlos Pimenta

É preciso resolver a desorçamentação da factura da luz e preparar a transição energética do país, defendeu esta sexta-feira Carlos Pimenta.

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LUSA/TIAGO PETINGA

O presidente da Generg, que também foi por duas vezes secretário de Estado do Ambiente e relator do Parlamento Europeu para o protocolo de Quioto, garantiu que "há desorçamentação na conta da electricidade", uma expressão que utilizou para a não contabilização dos "25% a mais de IRC que a eólica paga em relação ao resto do país" - através dos 2,5% de facturação que as empresas têm de pagar todos os anos às câmaras. O agora presidente da administração do grupo de energias renováveis Generg esteve esta sexta-feira na comissão parlamentar de inquérito ao pagamento de rendas excessivas aos produtores de electricidade

Nesta desorçamentação (omissão de despesas para evitar a sua contabilização) inclui também a taxa do audiovisual. Embora defensor de uma taxa para o serviço público de rádio e televisão, este responsável propõe que esta seja reflectida no Orçamento do Estado, por via de uma cobrança nas facturas de televisão por cabo. "É um terço do custo da eólica e não produz electrões".

Ao custo que os pequenos consumidores de electricidade suportam com as renováveis não chamou desorçamentação mas sim "o problema de metade do mercado de electricidade", representado pelos consumidores domésticos e pequenas empresas. Em causa está o facto de o custo das renováveis não se repercutir nos consumidores industriais. Admite que a opção política de competitividade, que diz compreender, visou evitar ser considerada ajuda de Estado, o que o seria se fossem apoios directos.

Numa sessão em que muitas foram as questões sobre os custos das renováveis, Carlos Pimenta defendeu que é "é preciso preparar a transição energética" do país, à luz das metas de energia e clima da União Europeia para 2030 e do compromisso de descarbonização da economia portuguesa até 2050. Um caminho que sustentou ter de ser feito com energia limpa renovável e com a atribuição real do custo ambiental das energias fósseis.

Dois aspectos passaram ainda nesta audição de Carlos Pimenta: a defesa de que o custo ambiental das energias fósseis “é para levar a sério” e que as renováveis têm, por isso, direito aos certificados verdes, como prémio ambiental que “tem de ser somado ao preço de mercado”; e o impacto do que foi o concurso da fase A das eólicas que obrigava à criação de uma nova fileira industrial.

“Em 2006 com o concurso eólico gerou-se uma Autoeuropa do vento, nunca tinha sido feito em nenhum sector da economia portuguesa. É uma indústria que não existia em 2008, era tudo importado e hoje exportamos. São mais de quatro mil postos de trabalho industriais sem subsídio público, e com uma indústria tudo de raiz”.

Ao efeito industrial somou o impacto territorial, com os 2,5% de receita para as câmaras e os benefícios económicos para as câmaras e também os benefícios para as associações de baldios. Para Carlos Pimenta, foi o consumidor de electricidade que “viabilizou isto, se não, o combustível [fóssil] continuava a ser uma despesa e não havia esta indústria”.

Concursos impediram rendas excessivas nas eólicas

 “Não há rendas excessivas nas eólicas, nos concursos não há rendas”, disse também esta sexta-feira Carlos Pimenta. À sexta audição desta comissão de inquérito, este responsável considerado o rosto da expansão da energia eólica no país, rejeitou a ideia de rendas excessivas face à forma como os produtores eólicos ganharam licenças nos quatro concursos feitos até agora: as tarifas eram equivalentes às de outros países nos mesmos momentos, eram definidas por concursos, foram baixando à medida que novos concursos abriram. E, continuou, ao projecto industrial exigido à primeira fase do grande investimento das eólicas “acresceram vantagens para o Estado e para o emprego que as empresas pagaram e que baixaram a sua rentabilidade”.

Na exposição com dados que transmitiu aos deputados, garantiu que “a tarifa nunca foi mais alta do que nos outros países” e adiantou que “o preço das máquinas não é diferente em Portugal”, embora tenha taxas de juro superiores. “Com níveis de remuneração definidos [por concurso], com condições definidas em caderno de encargo, tarifas equivalentes às de outros países, com contrapartidas para a criação de emprego, para as câmaras, para o Orçamento de Estado, onde estão as rendas?”, sublinhou. 

Às perguntas sobre a eventual revisão das tarifas bonificadas, considerou “não se poder aplicar retroactivamente a uma máquina velha, que custou o que custou”, alertando também para o risco de uma mudança. “Uma república que muda contratos tem uma percepção de risco que se paga caro e os primeiros prejudicados são os mais pequenos. E os que compram a desconto são os que têm capacidade de litigar”, disse, citando casos de pequenos produtores de energia eólica actualmente “a vender ao desbarato”.

Hoje, se fosse feito um novo concurso (o último foi em 2008) teria tarifas 20 euros abaixo, disse. Com os contratos mais antigos e mais caros a terminarem a partir de 2021 o custo das eólicas vai “cair a pique” e prevê que “o sobrecusto vai desaparecer nos próximos anos”, afirmou.

O sistema que defende hoje é o americano “à prova de bala do futuro, em que o incentivo é dado todo à cabeça”.

Os ganhos da EDP com as eólicas em Portugal entraram também na discussão. Carlos Pimenta disse desconhecer as contas da EDP, mas garantiu que o que “o grupo ganhou não pode ser feito com mais condições do que aquelas que têm todos em Portugal”.

Com o que os consumidores pagam na factura da luz, a solução não está em rever tarifas. O problema está nos encargos para “metade da electricidade”, que são as famílias e as pequenas empresas, que subsidiam os exportadores e estes ganham duplamente. Não pagam Custos de Interesse Económico Geral (CIEG) - os chamados "custos políticos" - na sua factura e beneficiam do impacto das renováveis no mercado grossista, que faz baixar o preço, uma medida política que, no entanto, “faz sentido”.

Adicionalmente, defendeu que o IVA da electricidade a 23%, a segunda maior receita, deve regressar à média europeia, e os CIEG de “coesão territorial” como a convergência dos Açores e Madeira deviam estar no Orçamento de Estado.

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