Comércio livre é a resposta da UE e Japão a Trump

Medidas proteccionistas nos EUA empurraram União Europeia e Japão a acelerar um acordo comercial que facilita as trocas entre duas das maiores economias mundiais.

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Jena-Claude Juncker, Shinzo Abe e Donald Tusk em Tóquio esta terça-feira LUSA/KOJI SASAHARA / POOL

Donald Trump é o grande responsável pelo regresso das políticas comerciais proteccionistas à economia mundial, mas ironicamente o seu nome surge em destaque entre as razões para que, esta terça-feira, tenha sido assinado o acordo bilateral de comércio livre de maior dimensão de sempre no mundo.

O Acordo de Parceria Económica concretizado agora entre a União Europeia e o Japão elimina quase na sua totalidade as taxas alfandegárias nas relações comerciais entre duas economias que representam cerca de um terço do PIB mundial. E, para além disso, UE e Japão assinaram esta terça-feira um outro acordo, de reconhecimento mútuo dos respectivos sistemas de protecção de dados, que permitirá a circulação segura de informação electrónica entre os dois blocos.

Os dois documentos, fundamentais para o aprofundamento das relações comerciais, estavam a ser negociados há anos (desde 2013) mas as conversações tinham caído no impasse. A conclusão do processo, em tempo recorde, deveu-se à entrada em cena de um outro actor: o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que com a sua retórica isolacionista e as suas medidas proteccionistas forçou os tradicionais aliados comerciais norte-americanos a entenderem-se entre eles para compensar o afastamento de Washington.

Em Janeiro de 2017, depois de Trump abandonar o acordo de parceria Transpacífico – TPP, que apostava nas relações comerciais entre os EUA e vários países asiáticos (não incluindo a China), o Japão viu-se forçado a encontrar outras soluções e o Governo de Shinzo Abe intensificou os contactos com os europeus. Em Bruxelas, os trabalhos decorreram em contra-relógio: um acordo preliminar foi fechado em Abril do ano passado, com as negociações a terminar em Abril deste ano. Depois da assinatura do acordo, esta terça-feira em Tóquio, a parceria económica ainda terá de ser aprovada pelo Parlamento Europeu — para que possa entrar em vigor no arranque de 2019.

No capítulo do comércio, aquilo que irá acontecer, garantem os signatários, é a criação de um mercado de comércio praticamente livre em duas economias onde vivem 600 milhões de pessoas. Numa primeira fase, o acordo elimina imediatamente 99% das taxas dos produtos japoneses importados pela UE e 94% dos produtos europeus importados pelo Japão, número que subirá também para 99% mais tarde. A explicação para esta diferença temporária nos números está no arroz, cujos produtores o Japão insiste em proteger.

Entre as exportações europeias que podem vir a ser beneficiadas estão, segundo os responsáveis da UE, o vestuário, cosméticos, vinhos, cervejas e produtos alimentares como os queijos ou as bolachas.

Portugal não será, pela dimensão relativamente reduzida da sua relação comercial com o Japão, dos países com maior impacto. Em 2017, as exportações portuguesas para o Japão foram de 145,7 milhões de euros, o que não ultrapassa os 0,26% do total da venda de bens feita pelo país para o estrangeiro. No ano passado, as exportações de bens para o Japão cresceram 5,2%, o que compara com 10,1% para o total das exportações nacionais.

Portugal registou ainda um défice comercial com o Japão, já que as importações foram mais do dobro das exportações, atingindo os 330 milhões de euros em 2017.

Ainda assim, nos sectores em que se concentram as exportações portuguesas para o Japão, como os têxteis, materiais de construção, bolachas e vinhos, irão sentir-se efeitos positivos da redução das taxas.

O presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, sublinhou a “enorme importância estratégica” da assinatura do acordo de parceria económica, não apenas por causa do peso do bloco comercial que agora se abre, mas em termos da mensagem clara de defesa de uma “ordem internacional assente em regras” e de rejeição do proteccionismo. “Acreditamos firmemente na abertura, na cooperação e no comércio livre. E partilhamos os valores da democracia liberal, dos direitos humanos e do Estado de Direito”, declarou.

O consenso entre os dois blocos vai além das questões de comércio e investimento, estendendo-se às áreas da segurança e defesa, energia e alterações climáticas. “No que diz respeito à política externa, estamos do lado do Japão e dos seus esforços para manter a pressão sobre Pyongyang com vista à desnuclearização completa, certificada e irreversível da Península da Coreia”, notou Donald Tusk. O entendimento político entre Bruxelas e Tóquio prolonga-se ainda no compromisso comum com a implementação do acordo nuclear internacional com o Irão, e no apoio à “soberania, independência e integridade territorial” da Ucrânia, acrescentou. Nestes temas, a posição norte-americana vai no sentido oposto.

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