"Irrita-me um bocado esta estratégia de dizer que a culpa é toda das Finanças"

Marta Temido explica que saiu da ACSS por considerar que "não iria haver coragem para fazer aquilo que o SNS precisa que seja feito".

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"Entendi que não iria haver coragem para fazer aquilo que eu acho que o SNS precisa", diz a ex-responsável da ACSS Pedro Granadeiro/NFactos

Fala-se muito da não existência de cativações na saúde. Outros dizem que elas existem mas estão encapotadas. Em ficamos?
Oficialmente, não existem.

E oficiosamente?
Oficiosamente tem existido uma forma de gestão dos dinheiros públicos que procura garantir que no final do ano as contas batem certo através da retenção de algumas verbas. Mais uma vez: um sentimento claro de alguma desconfiança de uns em relação aos outros.

Como é que a unidade de missão [para avaliar a dívida no sector, criada este ano] pode ser útil?
É evidente que precisamos de ajuda. Nessa perspectiva, toda a ajuda é boa. Agora parece-me que a unidade de missão tem competências que já estão descritas no Ministério da Saúde e na ACSS e que isso tem uma leitura: as entidades não estão a conseguir entregar o resultado das suas competências. É muito prática de muitas empresas e da Administração Pública. Há uma estrutura que devia fazer alguma coisa, mas não faz. Cria-se outra. Depois vamos ficando com camadas. Por que é que isso acontece? As respostas serão muitas... Falta de meios, falta de articulação, falta de foco... A nossa agenda é determinada pela comunicação social.

Porque é que saiu da ACSS ao final de dois anos?
Por um lado, o meu mandato terminou e por outro entendi, na avaliação que fazia daquilo que seriam mais três anos de um novo mandato, que não iria haver coragem para fazer aquilo que eu acho que o SNS precisa que seja feito para que se mantenha como eu acredito nele.

E falamos de coragem política do Governo em bater mais o pé e fazer-se ouvir mais?
Não só. Em explicar-se melhor, em ser mais transparente. Eu não considero que os ministérios possam viver em guerra. Acho que isso é mau. Além de que não me revejo num ambiente onde não exista confiança, optimismo, uma atitude positiva... Acreditei e acredito muito no trabalho da ACSS e no programa do Governo. De alguma forma penso que podemos fazer melhor. E eu não estava a conseguir. Eu fico muito irritada quando as coisas não são práticas. Acho que muito do que tem sido feito são coisas pouco práticas.

A minha preocupação é como é que melhoramos a dívida, claro, mas os tempos de espera. Aquilo que eu oiço quando falo com as pessoas e elas não sabem de onde é que venho é sobre os tempos de espera. Se não temos uma medida exacta, é nisso que temos de investir. Irrita-me um bocado esta estratégia de dizer que a culpa é toda das finanças. Nós já fizemos melhor. Já trabalhámos melhor em conjunto. O que eu sinto é que estamos a trabalhar muito cada um com a sua estratégia de sobrevivência.

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