Deputados do PSD receiam ordem para viabilizar OE e acenam com revolta

Fernando Negrão garantiu chumbo da proposta depois de confrontado por parlamentares.

Bancada do PSD receia votação no OE
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Bancada do PSD receia votação no OE Rui Gaudêncio
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Bancada do PSD receia votação no OE RG RUI GAUDENCIO

Com as tensões à esquerda do PS a agravarem-se em torno do próximo Orçamento do Estado (OE), a bancada do PSD começa a mostrar nervosismo com a possibilidade de haver uma indicação do líder do partido para viabilizar a proposta. Há deputados que garantem que preferem renunciar ao mandato do que assumir essa posição. Outros antevêem mesmo a hipótese de o partido não perdoar a Rui Rio tal decisão e de até ser convocado um congresso extraordinário para discutir essa votação parlamentar.

Em cima da mesa está o último orçamento da legislatura, a um ano de eleições legislativas, caso não sejam antecipadas. A proposta que o Governo vier a fazer será mais um teste à solidez da "geringonça", uma vez que terá de dar resposta a questões como a contagem do tempo da carreira congelada dos professores e a legislação laboral.

Por outro lado, o PSD de Rui Rio aproximou-se do PS e distanciou-se do CDS. É nesse contexto que há deputados sociais-democratas a defender que o partido devia clarificar já a sua posição e anunciar o voto contra o OE 2019, na linha do que sempre defendeu o anterior líder, Passos Coelho, ao remeter para PCP, BE e PEV o ónus de suportar o Governo de António Costa. Só que, até agora, a posição do PSD não foi assumida. Há vozes contraditórias e Rui Rio remete a questão para a altura em que o documento for conhecido.

Numa bancada em que muitos deputados não gostam da estratégia de colagem ao PS, há quem admita recusar-se a viabilizar o OE (seja com o voto a favor ou com uma abstenção), caso a esquerda falhe ao PS. “Eu vou-me embora. Com que cara é que apareço aos meus militantes”, desabafou um parlamentar que não se quis identificar, numa posição que é partilhada por mais sociais-democratas. Outros deputados consideram que uma decisão no sentido de ser o PSD a dar suporte ao Governo de António Costa – já que um chumbo do Orçamento levará a eleições antecipadas, como sugeriu o Presidente da República – pode incendiar o partido e levar a questão a um congresso extraordinário. “Bastam três mil assinaturas para o convocar”, lembra um social-democrata.

A questão da votação no OE é, neste momento, prioritária para os deputados do PSD e foi lançada esta quinta-feira pelo ex-líder parlamentar Hugo Soares na reunião da bancada parlamentar. Numa intervenção dura, segundo relatos feitos ao PÚBLICO, Hugo Soares defendeu que o partido deveria deixar de ter uma posição ambígua sobre o OE, por considerar que isso coloca o PSD numa situação difícil, ao mesmo tempo que permite ao PCP e ao BE “brincarem” sobre o assunto.

Em resposta, o líder parlamentar Fernando Negrão assegurou que o partido votará contra o OE2019, uma garantia que Rui Rio ainda não deu. No final, perante os jornalistas, Negrão não foi tão taxativo, afirmando que, “tendencialmente, o voto do PSD poderá ser contra”.

O líder da bancada reconheceu, tal como Rui Rio, que a proposta de OE ainda não é conhecida, mas que é elaborada “numa lógica de acordo com o BE e o PCP, que defendem políticas que são opostas” às do PSD. Questionado sobre se, na reunião, garantiu aos deputados o sentido de voto contra, Fernando Negrão respondeu negativamente: “Não, não vim garantir. Todos os sinais indicam que poderá ser contra”. Ao que o PÚBLICO apurou junto de várias fontes, os deputados entenderam que a declaração durante a reunião, e após a intervenção de Hugo Soares, foi veemente, no sentido de a bancada do PSD chumbar o OE2019.

Sim, não ou veremos

Na direcção de Rui Rio, a posição sobre o OE não tem estado afinada. David Justino, vice-presidente da comissão política e presidente do Conselho Estratégico Nacional, considerou, em entrevista ao PÚBLICO, em meados de Junho, que o voto contra será o “natural”.

Uma semana depois, as declarações de Silva Peneda, coordenador do PSD para a área da Solidariedade, foram em sentido contrário, alarmando o partido. O antigo ministro, que é próximo de Rui Rio, defendeu que o PSD deve estar ao lado da estabilidade política e do cumprimento dos mandatos, caso BE e PCP se recusem a viabilizar o Orçamento.

Na mesma semana, Fernando Negrão, em declarações ao Observador, arrumou o caso com um prudente “veremos” qual será o sentido de voto, depois de o documento ser conhecido, o que só acontece em meados de Outubro. E Salvador Malheiro, vice-presidente do PSD, também comentou o assunto para dizer que a opinião de Silva Peneda estava "longe de ser a do PSD".

A reunião da bancada desta quinta-feira foi a primeira depois do choque frontal entre Rui Rio e o líder parlamentar Fernando Negrão, há duas semanas, a propósito do voto a favor do projecto de lei do CDS sobre os impostos aplicados aos combustíveis. O tema veio a lume pela voz de vários deputados a criticar a posição da direcção de Rui Rio, ao tornar público o seu desagrado pelo voto a favor do projecto centrista “à revelia” do líder do partido. Miguel Morgado, ex-adjunto político de Passos Coelho, lembrou que a oposição ao Governo e à esquerda foi feita pela actual bancada, onde Rio não tem assento. O deputado defendeu que o PSD deve ser "uma AD", e não estar “sempre ao lado do PS”.

Hugo Soares considerou “desastrosa” a conferência de imprensa do secretário-geral José Silvano, na semana passada, em que demarcou a direcção de Rio da operação judicial Tutti frutti que envolve um deputado do PSD e outros sociais-democratas em alegados pagamentos irregulares.

Horas depois desta declaração, o líder do PSD saudou a investigação judicial noticiada pelo Correio da Manhã sobre o mesmo caso, mas defendeu que deveria ser feita “com mais recato, nos tribunais e não tanto em julgamentos na praça pública”.

"É a saúde da democracia que está em causa, temos de fazer alguma coisa e a Justiça também tem o seu papel", afirmou Rui Rio. O social-democrata lembrou que o pagamento de quotas de militantes por atacado "não é de agora" e que já tinha identificado e criticado situações daquelas nos partidos em geral e no PSD em particular "há vinte e tal anos", quando foi secretário-geral, altura em que as criticou, "com pouco apoio interno".

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