O assalto aos sentidos dos Chemical Brothers numa noite de homenagens

No dia em que políticos cantaram A Minha Casinha com os Xutos & Pontapés, em honra a Zé Pedro, o duo britânico e The Killers foram as grandes atracções.

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Zé Pedro, Katy Perry, Ivete Sangalo, Xutos
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“Mamã, isto é para ti”, explicava um Manel Cruz em tronco nu ao público, com uma orelha iluminada atrás dele e da banda, em cima do palco no encore do concerto no Music Valley, isto para introduzir Canção da Canção da Lua. “Somos mesmo umas putas”, tinha proferido antes, ao voltar após o público o ter pedido.

O Music Valley é um dos três palcos com programação musical mais pensada da oitava edição do Rock in Rio em Lisboa – os outros são o Palco Mundo, vulgo palco principal, e o EDP Rock Street, um mini-palco que anteriormente era dedicado a blues e rock e agora tem uma interessante programação de música africana; e também há ocasionalmente música ao vivo no Super Bock Digital Stage É por esse vale que passam “grandes ídolos” da música portuguesa, diz o apresentador responsável pela animação. Ao lado do palco há festas de piscina, antes de actuarem os Capitão Fausto, que entram em cena ao som de Stuck in the Middle with You, clássico dos anos 70 dos escoceses Stealers Wheel.

Vai chovendo, uma constante ao longo do penúltimo dia de festival, aquele que abre o segundo fim-de-semana, e não há um mar interminável de público nesse palco, mas há gente suficiente, e suficientemente entusiasmada, para não ser apenas queimar cartaz.

A caminhada entre os espaços do recinto é longa, com os visitantes a serem bombardeados a cada momento por publicidade, brindes e animação. É um centro comercial/centro de diversões, sempre com algo para se fazer, normalmente associado a uma marca, com passatempos que vão de jogos a modelos de dinossauros do Dino Parque da Lourinhã que se podem visitar. Indo do Music Valley para o Palco Mundo, por exemplo, passa-se da rua do EDP Rock Street, que tem lojas Fnac, e ver artistas como Moh! Kouyaté (natural da Guiné-Conacri mas radicado há muito em Paris), que mistura a tradição mandinga com blues, jazz e outras influências pop mais europeias. Atrai algum público, mas não é o foco do festival.

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Três políticos de primeiro plano no Rock in Rio: Ferro Rodrigues, presidente do Parlamento; Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República; e António Costa, primeiro-ministro MIGUEL A. LOPES/LUSA

De noite, a chuva que se faz sentir durante o concerto de Xutos & Pontapés, sem Zé Pedro mas com Marcelo Rebelo de Sousa e companhia, acaba por desaparecer. O concerto dos Killers, de Brandon Flowers, segue sem transtorno meteorológico para o público.

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Marcelo e a viúva de Zé Pedro, dos Xutos e Pontapés, Cristina Avides Moreira Miguel A. Lopes
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No palco, há um símbolo do género masculino em formato grande, composto por luzes, atrás do qual há um teclado e que Flowers, em modo pregador, usa como um púlpito, com as mãos no ar e movimentos de dança. Há ali algo de David Byrne, cujos Talking Heads são uma influência assumida. E há também um símbolo do género feminino atrás do qual estão as cantoras do coro.

“Percebem o que estou a dizer? Estamos na mesma página?”, pergunta o vocalista. Os Killers tocam cada canção, seja a remeter para a new wave dos anos 80 ou para Bruce Springsteen e um fascínio pela América em geral, como se fosse a grande canção americana e o concerto propriamente dito fosse salvar a vida das pessoas. A componente visual contribui: há, por exemplo, imagens do deserto atrás deles. Sabem, certamente, montar um espectáculo – a isso poderá ajudar o facto de serem oriundos de Las Vegas.

Enérgico e sorridente, Flowers salta e vende o que está a fazer com convicção, desfilando por canções como When you were Young, que tem uma cascata de faíscas a cair no palco, Human ou, sob luzes brilhantes, Mr. Brightside, que fecha o concerto. No fim, o baterista Ronnie Vannucci Jr. volta ao palco para atirar as baquetas ao público, enquanto atrás dele uma mensagem para a plateia “guiar com cuidado” e “contar a todos os amigos” sobre o concerto, uma frase que Vannucci repete.

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Tim Booth, dos James, no arranque do programa da tarde MIGUEL A. LOPES/LUSA

Como não pode não haver tempos mortos, há fogo-de-artifício e foguetes nesse palco enquanto The Chemical Brothers (Tom Rowlands e Ed Simons) não chegam. A montagem do equipamento do duo de big beat britânico, que envolve sintetizadores, efeitos, caixas de ritmos e uma parafernália de máquinas, faz-se ao som de clássicos de electro com feeling anos 80, com Chill Pill, de Sounds Of JHS 126 Brooklyn, ou Set if Off, de Strafe.

Já sem chuva, a música começa às 22h45, com luzes azuis – vão mudar muito de cor ao longo da actuação –, fumo e o público com bastões fluorescentes multicolores da EDP no ar. Mais especificamente, é uma versão de Tomorrow Never Knows, dos Beatles – não será o único clássico extra-Brothers da noite: a dada altura, Temptation, dos New Order, mantendo a voz original mas construindo uma nova base instrumental e toda uma nova estrutura, também faz parte do alinhamento.

Tal como The Killers, são uma máquina extremamente bem oleada e fazem todo o sentido num contexto destes. O domínio sobre o público e o assalto aos sentidos é total, com as vibrações dos baixos a sentirem-se na terra e luzes, vídeos sempre diferentes e inventivos, a desfilarem por detrás do duo Rowlands/Simons. Nos ecrãs, as caras deles não interessam, mesmo que saiam da bolha das máquinas de vez em quando para dançar um pouco ou elevem o punho no ar enquanto um sample de voz grita “I’m mad as hell”.

Seriam eficazes mesmo que o público não conhecesse um único tema, mas têm quase 30 anos de carreira e êxitos reconhecíveis acumulados ao longo de mais de duas décadas, de Galvanize, com a voz do rapper Q-Tip, de A Tribe Called Quest, a Block Rockin' Beats.

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