Turismo inglês está a recuar há sete meses em Portugal

O Reino Unido é o principal mercado emissor de turistas, mas o número de visitantes tem vindo a cair desde Outubro devido à concorrência de outros países, desvalorização da libra e perturbações nas ligações aéreas. Mesmo assim, as receitas continuam a subir.

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Algarve é a região portuguesa mais preferida pelos ingleses Vasco Célio
Boeing 737 Next Generation, Boeing 777, Boeing 767, Boeing 737, Família Airbus A320, Airbus, Airport avental
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Fim da Monarch afectou ligações entre o Reino Unido e Portugal EPA/NEIL HALL

O turismo tem batido vários recordes, mas há sinais de alerta, como a diminuição do número de visitantes do Reino Unido, principal mercado emissor para Portugal. O movimento de recuo persiste de forma ininterrupta há sete meses – de Outubro a Abril –, depois de uma primeira ameaça em Julho de 2017.

Olhando apenas para os primeiros quatro meses do ano (os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística sobre a actividade turística são de Abril), verifica-se uma quebra de 6,4% no número de turistas britânicos face ao mesmo período de 2017, quando a nível global o crescimento foi de 3,5%.

Assim, a subida de visitantes de países como França, Brasil e Estados Unidos acabou por minorar o impacto negativo da diminuição de quase 30 mil britânicos. Holanda e Bélgica também recuaram de forma clara (7,9% e 2,7%, respectivamente), mas é o mercado britânico é o que mais concentra as atenções pelo peso que representa nas contas do país em geral, e de duas regiões em particular, o Algarve e a Madeira.

Concorrência na costa

De acordo com os vários responsáveis ouvidos pelo PÚBLICO, não há uma, mas sim várias explicações para o recuo britânico. Umas mais conjunturais do que outras, como perturbações no sector da aviação – com destaque para o fim da Monarch, que fazia muitas ligações entre os dois países –, os efeitos do “Brexit” e o aumento da concorrência de mercados como a Turquia. “Desde o referendo ao ‘Brexit’, o euro valorizou 13% em relação à libra e valorizou 70% em relação à lira turca. Significa que nos tornámos mais caros para os ingleses, e os turcos bastante mais baratos. Acresce a isto, empreendimentos hoteleiros novos na Turquia e factores de operação como a renda por metro quadrado e o salário por hora bastante mais baixos do que os destinos europeus”, destaca Bernardo Trindade, administrador do grupo hoteleiro Porto Bay e ex-secretário de Estado do Turismo (no Governo socialista de Sócrates).

O presidente da Confederação do Turismo de Portugal (CTP), Francisco Calheiros, também realça os efeitos negativos do fim da Monarch (além de suspensão de alguns voos da Ryanair no ano passado, mas já resolvidos, e a falência da Air Berlin e da Nikki, entretanto compradas), e afirma que, devido às questões cambiais, “os turistas britânicos estão a viajar menos para o exterior, sobretudo para países da União Europeia”.

Os efeitos negativos não parecem ter chegado à Easyjet, a principal empresa de aviação a operar entre o mercado nacional e o Reino Unido (com 27% de quota dos lugares disponíveis, segundo dados do Turismo de Portugal). “Globalmente, transportámos este Inverno mais 100 mil passageiros nas nossas rotas britânicas para Portugal”, o que equivale a mais 12% face ao período homólogo, afirma José Lopes, responsável da empresa em Portugal.

Depois das várias perturbações no sector, diz o gestor, “é normal verificar-se a existência de um reajuste temporário da oferta em baixa, mas acreditamos que o mercado ajustar-se-á em breve para uma subida global”.

“Estamos a trabalhar para repor essa capacidade [perdida]”, diz fonte oficial da Secretaria de Estado do Turismo (SET), referindo-se ao impacto negativo provocado pela Monarch, ao mesmo tempo que diz estar a “acompanhar de forma permanente” a evolução do mercado britânico.

Boas receitas

“Há outros destinos a ressurgir, como o Egipto, Turquia ou Tunísia”, diz o Governo, referindo-se à concorrência crescente, “mas os indicadores mostram que Portugal continua a crescer, especialmente nas receitas turísticas”, com uma subida de 11,8% no acumulado do início do ano até Abril. “Estamos a crescer, por exemplo, o dobro de Espanha nos principais indicadores”, destaca a Secretaria de Estado do Turismo (SET), liderada por Ana Mendes Godinho.

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Apesar da quebra do número de visitantes britânicos, o Governo destaca que as receitas têm continuado a crescer. “Nos primeiros quatro meses do ano, as receitas do Reino Unido subiram 8,3% – em Abril a subida foi de 12,2%”, avança a SET. O mesmo aspecto é sublinhado por Bernardo Trindade (que é também administrador não executivo da TAP e o presidente da Portugal In, estrutura criada pelo Governo para atrair investimentos para o pais na sequência do "Brexit"), ao afirmar que “cada turista britânico em Portugal está a gastar mais e isso é positivo”.

Os últimos dados oficiais do Banco de Portugal mostram que, nos primeiros três meses, as receitas turísticas geradas pelo Reino Unido chegaram aos 374,8 milhões de euros, 6,2% acima do mesmo período de 2017 (e equivalente a 14,4% das receitas totais).

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Estratégia de reacção

De acordo com o Governo, “nos últimos anos tem havido uma redução do peso dos quatro principais mercados emissores”, com o aumento de outros “como os Estados Unidos, Brasil, China ou Canadá”. Em 2017, e “pela primeira vez, o peso dos quatro principais mercados ficou abaixo dos 50%”.

Mesmo assim, a questão agora é que se trata de um recuo dos britânicos, não de um crescimento menor ou estagnação. E isso está a obrigar também a uma reacção: “Estamos a reforçar e a intensificar as acções de promoção de Portugal no Reino Unido com campanhas de marketing com companhias aéreas e operadores turísticos, especialmente para a Madeira e o Algarve, onde estamos a investir com um plano de sazonalidade agressivo”, diz o Governo.

No dia 22 de Junho, o Ministério da Economia comunicou que vai investir um milhão de euros para aumentar a atractividade do Algarve e da Madeira na época baixa, “aumentar as vendas, melhorar as taxas de ocupação e potenciar as ligações aéreas internacionais destes destinos entre Outubro de 2018 e Março de 2019”. No caso do Algarve, incluiu-se o Reino Unido entre os mercados-alvo, mas também a França ou os países da Escandinávia. Já em relação à Madeira, o Reino Unido está ao lado de países como a Polónia, EUA, Brasil e Rússia.

Para Bernardo Trindade, é preciso também “continuar a trabalhar em torno de uma proposta assente na diversidade dos nossos valores que torna o país como um dos mais procurados à escala global”.

De resto, o turismo nunca valeu tanto (15.153 milhões de euros em exportações no ano passado) e continua a crescer, mas já se nota um abrandamento. Nos primeiros quatro meses de 2017, as dormidas de estrangeiros subiram dois dígitos (13,3%), quando no mesmo período deste ano o crescimento foi de 1%. No caso de Espanha, assistiu-se mesmo a um ligeiro recuo, de 0,4%. Em termos de proveitos totais, a subida foi de 9,5%, para 787 milhões, quando entre Janeiro e Abril de 2017 tinham aumentado 18,7%.

“A concorrência de outros destinos é uma realidade que sempre existiu e sempre existirá”, diz Francisco Calheiros. “Haverá sempre destinos com características semelhantes, mas nós temos que trabalhar para manter esta conjugação que nos torna únicos”, realça o presidente da CTP.

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