"Saída de Santana pode criar dinâmica de crise interna no PSD”

António Costa Pinto vê dificuldades no aparecimento de um novo partido na área do centro-direita. Já Miguel Relvas arrasa estratégia de Rio e vaticina-lhe um “desfecho final de derrota", igual ao de Ferreira Leite.

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Santana Lopes deixa PSD e prepara-se para fundar um novo partido Nuno Ferreira Santos

Ao fim de 40 anos de militância, Pedro Santana Lopes abandona o PSD, mas diz que quer continuar a ter intervenção política e uma das formas de o fazer é criar uma nova “organização partidária” na área do centro direita. A ideia não é original. A primeira vez em que pensou distanciar-se do PSD e criar um novo partido com as siglas do seu nome PSL - Partido Social Liberal, foi em 1996, era Marcelo Rebelo de Sousa presidente do PSD.

Na entrevista à revista Visão desta quinta-feira, o ex-candidato à liderança do PSD, que perdeu para Rui Rio, fez um balanço sobre o seu percurso no partido e recupera declarações suas de Julho de 1990, num jantar na antiga Feira internacional de Lisboa, em que disse: “O PPD começa a estar cansado de aturar o PSD”. Quarta-feira, em declarações à TVI 24, Santana deixou claro que a sua “intervenção política não se fará mais no PSD. Isso acabou, é uma relação que acabou, deixamos de viver juntos”.

A saída de Santana Lopes acontece menos de uma semana depois de José Matos Correia se demitir de coordenador do Conselho Estratégico Nacional do PSD para a área da Segurança Interna e Protecção Civil, e do ex-ministro de Pedro Passos Coelho, Miguel Relvas, ter escrito no Expresso um artigo violento contra Rio, no qual afirma que a actual “liderança social-democrata não tem agenda para o país. O PSD perdeu ideal e afundou-se num tacticismo autodestrutivo, desde logo, quando permite anular os seus essenciais, vendendo-se como instrumento coadjuvante de um PS a quem cantou hinos de vitória antecipada”, acrescenta.

A pergunta que se coloca é: há condições para a criação de um novo partido político na área do centro-direita? Existe espaço na democracia portuguesa para novas forças partidárias?

O professor catedrático do ISCTE de Lisboa, António Costa Pinto, nota que “Portugal se tem caracterizado por ser uma democracia em que os partidos políticos têm uma enorme resiliência e em que tem sido, aparentemente, difícil novos partidos consolidarem-se”. Ao contrário de Espanha onde partidos como o Ciudadanos ou o Podemos vingaram, em Portugal houve várias tentativas - caso do PRD (Partido Renovador Democrático) de Ramalho Eanes, criado em 1986; PDR (Partido Democrático Republicano) de Marinho e Pinto, criado em 2014 -, mas apenas o Bloco de Esquerda, fundado a partir de outros partidos, se conseguiu afirmar.

Os líderes são conjunturais”

O investigador precisa que no caso português existem diferenças entre esquerda e direita, referindo que a esquerda é mais receptiva à criação de novos partidos, ao contrário da “direita que está congelada desde 1976, tendo um principal partido do centro-direita que é o PSD e um pequeno partido de direita que é o CDS”.

Focando-se na vontade do ex-provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa de se empenhar no lançamento de uma nova força politica, Costa Pinto recorda que “já no passado, numa tentativa de sobrevivência política, Santana Lopes, por várias vezes, agitou esse tema”. Ao PÚBLICO, o professor do ISCTE admite que Santana pode provocar “danos eleitorais ao PSD - não por ser alternativa, mas porque cria uma imagem de divisão e uma dinâmica de crise interna no partido, tendo em vista a pequena consolidação da nova liderança”.

Miguel Relvas mostra-se inconformado com a saída do antigo líder social-democrata do PSD e diz mesmo esperar que isso não aconteça. “Foi presidente do PSD, foi primeiro-ministro, é um político no activo há muitos anos”, afirma. Sobre si próprio, Relvas garante que as divergências que tem com Rui Rio em situação nenhuma o levarão a bater com a porta. “Nunca sairei do PSD por discordar do líder A ou do líder B. Os líderes são conjunturais, ao contrário do partido”, sublinha.

Ao PÚBLICO, o ex-ministro-adjunto de Passos Coelho não poupa Rui Rio e alerta para os “perigos” da sua estratégia. ”Não tenho estados de alma, mas tenho muitas dúvidas quanto ao caminho que está a ser seguido”, aponta, considerando incompreensível que o partido opte por criticar o BE e PCP, poupando o PS. E explica: “O PS tinha um nó górdio por ter vendido a alma à extrema-esquerda e a primeira coisa que o líder do PSD fez foi resolver-lhe esse problema”.

Acusando a liderança social-democrata de ter cometido um “pecado capital” ao fazer acordos com o PS, o antigo ministro-adjunto denuncia o receio de Rio em atacar o PS e o seu líder, António Costa. Diz que o “PSD não é o PS sem D” e incita a direcção do partido a apresentar “propostas suficientemente atractivas e capazes, que se diferenciem do PS” e defende que uma mudança de agulha: “O PSD tem de conquistar o espaço do centro-esquerda para chegar ao poder. Foi assim com Cavaco Silva, Durão Barroso e Passos Coelho”.

Os elogios aos três antigos líderes contrastam com os reparos à liderança de Manuela Ferreira Leite que – sublinhou – “seguiu noutra direcção e foi derrotada”. Quanto a Rui Rio, vaticina-lhe um “desfecho final igual”.

Afirmando não fazer crítica pela crítica, o ex-ministro de Passos deixa um apelo final a Rio para que conduza o partido numa outra direcção que passe pela “reconstrução do espaço político do centro-direita”. “Em momento algum podemos permitir a percepção de que o PSD caminha para o bloco central”, decreta, ao mesmo tempo que lamenta que o “país não veja hoje um “PSD moderno, ousado e com propostas inovadoras”.

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