A necessidade (de estar sempre a pedir) não aguça o engenho (para fazer)

Porque a vida tem mesmo que ser levada assim, senão seremos os eternos “givers” (e tansos) que farão tudo o que lhes é pedido, ontem, hoje e amanhã, sem ganhar absolutamente nada com isso

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Simon Shim/Unsplash

Já ouviram falar dos takers? Aqueles que pedem tudo a troco de nada, que chateiam como se tudo girasse à sua volta, que são detentores de um egoísmo tal que se o mundo tivesse um nome seria, certamente, o deles.

Ora bem, estes takers andam por todo o lado. Quase como uma praga disfarçada, mas pior. Chegam em silêncio, ninguém dá por eles no início e têm tendência para sumir quando a coisa dá para o torto. São colegas de trabalho, amigos da família, nossos conhecidos. Nos dias em que o tempo parece andar a uma velocidade ainda mais alucinante, lá estão eles, a espreitar e, claro, a pedir. Pedir que seja feito aquilo que eles precisam para ontem. Pedir o que não pode ficar para depois porque, para eles, aquilo é o mais importante naquele momento. Pedir, pedir, pedir sem nunca retribuir.

Também é bastante difícil chegar a estas pessoas. Principalmente quando somos nós que precisamos de alguma coisa. Nunca podem. Estão sempre extremamente ocupados, tão ocupados que às vezes até me pergunto como arranjam tempo para comer. Os dias deles têm 48 horas, ou assim parece. Andam sempre de um lado para o outro, a tratar disto e daquilo. Mas, note-se, tratam do que apenas às coisas deles diz respeito. Fica a promessa de que o resto também será, eventualmente, tratado. Não sabemos bem quando nem como, mas “não te preocupes, que eu depois trato disso.” Aqui, o prometido não é devido.

Outra coisa em que estes takers dão cartas é no “enxovalhanço”. Adoram criticar tudo o que é feito pelos outros. Dá-lhes um gozo enorme olhar de lado para o que não foi feito por eles. Porque, caso tivesse sido, seria fantástico, digno de um prémio. Mas como eles têm mais do que fazer, fica para os outros: o trabalho e o vexame em praça pública por algo em que, estes tais outros, despenderam tempo e esforço. A estes, os que são criticados, dou o nome de givers. Aqueles que dão tudo, os que estão sempre disponíveis e para quem o agradecimento fica sempre esquecido algures na última gaveta do armário do quarto mais recôndito da casa. Os givers a quem, se não tiverem cuidado, é-lhes passada a perna muito rapidamente. O mérito nunca será deles, será sempre dos outros.

Por isso, cá vão algumas dicas que podem ajudar a manter uma distância segurança destes nossos amigos, os fabulosos takers: primeiro, fazer orelhas moucas. “Sim, sim, sim já vou ver isso” e esquecer, tal como eles fazem. Segundo: fazer-se de parvo. “Estou nem aí”, tal qual a música. Mas fazer parecer que se está sempre lá, alerta para anuir aos pedidos que caem mais rápido do que a chuva no Inverno. Terceiro e último: adoptar uma postura a que gosto de chamar de “descontracção e estupidez natural”. Porque a vida tem mesmo que ser levada assim, senão seremos os eternos givers (e tansos) que farão tudo o que lhes é pedido, ontem, hoje e amanhã, sem ganhar absolutamente nada com isso.

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