Serviços mínimos: Governo arrisca-se a perder de vez os professores, alerta director

Governo vai avançar com a requisição de serviços mínimos para as greves às avaliações marcadas para Julho. Especialista defende que estas não deveriam ter sido consideradas lícita, já que a greve implica a "abstenção total" ao trabalho e não só a uma parte dele.

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Ministério justifica pedido de serviços mínimos por a greve poder afectar acesso ao ensino superior dos alunos do 12.º ano Rui Gaudêncio

Ao pedir serviços mínimos para a greve às reuniões de avaliação, que está a decorrer, “o Governo pode perder de vez os professores”, alertou nesta segunda-feira, em declarações ao PÚBLICO, o presidente da Associação Nacional de Directores e Agrupamentos de Escolas Públicas, Filinto Lima.

A informação de que o Ministério da Educação iria requerer serviços mínimos para as greves às reuniões de avaliação que estão marcadas para a primeira quinzena de Julho foi dada, nesta terça-feira aos jornalistas pelo líder da Federação Nacional de Professores, Mário Nogueira. Esta medida “nunca terá o acordo dos sindicatos”, anunciou.

Já ao princípio da noite, o Ministério da Educação (ME) confirmou que foi esta a solução encontrada para resolver o problema da avaliação dos alunos e que a decisão de solicitar serviços mínimos se deve ao facto de “o alargamento dos períodos de greve ao mês de Julho pôr em causa necessidades sociais impreteríveis, como sejam a conclusão do processo de exames e o consequente acesso ao ensino superior”.

Professores indignados

As greves às avaliações estão decorrer desde 4 de Junho e já há paralisações marcadas até 15 de Julho, sendo que a primeira fase do concurso nacional de acesso ao ensino superior inicia-se três dias depois (a 18 de Julho) e os alunos só poderão concorrer se tiverem a nota final lançada ou seja, se além da nota de exame tiverem também a classificação que lhes foi atribuída pelos seus professores nas reuniões dos Conselhos de Turma.

Apesar do argumento avançado para pedir os serviços mínimos, o ME indicou também nesta terça-feira, em resposta ao PÚBLICO que “a quase totalidade dos alunos [que vão a exame] tem a sua classificação interna atribuída”. As reuniões dos Conselhos de Turma para os anos que têm exame (9.º, 11.º e 12.º) realizaram-se na primeira fase da greve às avaliações, que foi convocada apenas pelo novo Sindicato de Todos os Professores (Stop). Os exames nacionais começaram nesta segunda-feira e prolongam-se até ao próximo dia 27.  

Falando pouco tempo depois de se ter ficado a saber que o Governo iria iniciar, nesta terça-feira, o processo para a requisição dos serviços mínimos, Filinto Lima adiantou que esta medida “poderá resolver a questão das avaliações dos alunos, mas vai criar muitos outros problemas no arranque do próximo ano lectivo.”

“Já se previa, até pelas greves já marcadas para este período [14 de Setembro e primeira semana de Outubro] que ia ser duro, mas agora vai ser pior porque, mesmo que os serviços mínimos não sejam decretados, os professores vão ainda ficar mais indignados só pelo mero anúncio de que o Governo pretende avançar por este caminho”, disse.

Filinto Lima insistiu que a situação se devia resolver pela via negocial, lamentando que exista “um extremar de posições tanto pela parte do Governo, como pela dos sindicatos”.

Greve ou incumprimento?

Para os sindicatos é “algo extraordinário e inusitado” que o ministério tenha aceitado as greves marcadas para Junho e tente travar as que estão agendadas para Julho, quando se trata de paralisações iguais. Isto significa que “o Governo está preocupado com a dimensão da greve”, afirmou Mário Nogueira, adiantando que, só na manhã desta terça-feira, a adesão impediu a realização de “mais de 95% das 300 reuniões de Conselhos de Turmas que estavam agendadas para esta data”.

“Se tomou a opção de aceitar estas greves então criou o problema de lidar com estas como se fossem greves legítimas, porque não é por se prolongarem no tempo que o seu conteúdo se altera”, indicou ao PÚBLICO Maria do Rosário Palma Ramalho, docente da Faculdade de Direito de Lisboa e um dos árbitros designados pelo Conselho Económico e Social para presidir aos colégios arbitrais, a quem compete a decisão de decretar ou não serviços mínimos.

Para esta especialista, quando se convoca uma greve “a apenas uma parte da prestação de trabalho, esta é ilícita porque a greve pressupõe a abstenção total”. Nos pré-avisos entregue pelos sindicatos que estão a decorrer especifica-se que a greve abrange a actividade de avaliação, com incidência nas reuniões dos Conselhos de Turma”.

Isto quer dizer, como têm também afirmado os sindicatos, que um professor pode fazer greve a uma reunião e já participar, uma hora depois, na que se realiza em seguida. E é essa a prática que está a ser seguida. “Este tipo de comportamento deve ser encarado como um incumprimento do contrato de trabalho e não como uma greve”, defendeu Palma Ramalho.

Mínimos ou máximos?

Por lei, basta que um professor falte a uma reunião de um conselho de turma para que este tenha de ser adiado. Esse poderá ser um problema no que respeita à fixação dos serviços mínimos que, segundo Mário Nogueira, se poderão assim tornar em "serviços máximos". Um  outro é o facto das reuniões de avaliação não estarem na lista das “necessidades sociais impreteríveis”, como acontece desde 2013 com os exames nacionais.

Quando os serviçõs mínimos são rejeitados pelos sindicatos, a decisão destes serem decretados ou não compete a um colégio arbitral, que é constituído por um juiz e dois árbitros, um nomeado pela entidade empregadora e outro pelos sindicatos.

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