O regresso triunfal dos LCD Soundsystem a Lisboa

O grupo de James Murphy parou alguns anos para regressar fortalecido. Nas próximas noites estará no Coliseu dos Recreios a apresentar o álbum American Dream. É o fim da digressão. E quem sabe se não será também o fim da banda, outra vez.

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Em Portugal, vimos os LCD Soundsystem ressuscitados em 2016, no festival Vodafone Paredes de Coura Paulo Pimenta

Não acontece muitas vezes. Uma banda anuncia o fim, cansada dos compromissos da indústria musical. Durante cinco anos está parada. E um dia acaba por regressar. Mas não é um retorno qualquer, porque lança aquele que é muito bem capaz de ser o seu melhor álbum – American Dream (2017) –, apesar de nos anos 2000 ter editado três registos (LCD Soundsystem, de 2005, Sound Of Silver, de 2007, e This Is Happening, de 2010) que ficarão para a História como alguns dos testemunhos mais relevantes desses anos.  

O cenário é este. Os LCD Soundsystem de James Murphy estão de regresso a Lisboa, para mostrar o novo álbum, e não vêm em perda. Pelo contrário, parecem mais fortalecidos do que nunca. Na agenda estão três datas no Coliseu (terça, quarta e quinta-feira) e uma festa no Lux-Frágil (quinta-feira) para assinalar o final da digressão, com várias sessões DJ proporcionadas pelos membros do colectivo: James Murphy, Gavin Russom (nos sintetizadores), Al Doyle (guitarra, membro dos Hot Chip também), Nancy Whang (teclados), Pat Mahoney (bateria), Tyler Pope (baixo) e Shit Robot, que tem feito as primeiras partes.

A história é conhecida. Em 2011, James Murphy dava por encerrada a actividade do grupo com uma série de concertos no Madison Square Garden, em Nova Iorque. Alguns meses antes, em entrevista, dizia-nos que queria apenas descansar de um modelo de operar, e não necessariamente desistir para sempre dos LCD Soundsystem: “Não quero ser profissional do rock e desaparecer de casa uma série de meses. Não significa que não possamos voltar a gravar. Não sei, a sério. Mas neste formato – andar em digressão durante um ano, fazer vídeos e esse tipo de coisas – não me interessa. É muito cansativo.”

Já depois dos concertos no Madison Square Garden, voltámos a falar com ele, e reafirmava essa ideia: “Apenas deixámos de ser aquela banda profissional que anda de digressão em digressão, pelo mundo. Não significa que um dia destes não me apeteça lançar um máxi-single e voltar ao espírito do início. Na época eramos apenas um projecto, depois tornámo-nos numa banda rock que, de álbum para álbum, se foi tornando mais famosa e actuando pelo mundo. Foi isso que tentei contrariar. O sucesso é óptimo, mas a vida tem outras coisas.”

Um dos aspectos mais aliciantes em James Murphy (que quem olha para a vida como uma realidade a preto-e-branco encarará como uma fragilidade) é a sua capacidade de expor, com verdade, os paradoxos que o atravessam – ou que nos compõem a todos, por mais que apenas alguns o assumam. Pressentia-se que estava dividido, nunca fechando totalmente as portas a um regresso. Que aconteceu primeiro, em 2016, com uma série de concertos em festivais, incluindo o Primavera Sound de Barcelona e o Vodafone Paredes de Coura. E que se consumou no ano passado com um novo álbum magnífico, American Dream, quando talvez já poucos o previssem. Acabou mesmo por ser o disco do ano para inúmeras publicações do mundo, entre as quais o Ípsilon.

Se, como individuo, James Murphy expõe as suas contradições, como criador também assume que ninguém cria a partir do nada mas sim a partir do caos de influências. E (mais uma vez) isso é visível em American Dream, e logo a partir da primeira canção, Oh baby, evidente piscar de olho aos Suicide. Do ponto de vista lírico é também o álbum mais conseguido dos LCD Soundsystem, marcado pela aceitação – mas não pela resignação. Aceitação das relações frustradas, sejam de amizade ou de amor. Aceitação de que o sonho americano se desvanece. Aceitação de que um dia todos morremos. E aceitação também de que – pelo menos metaforicamente – passamos o tempo a morrer e a renascer.

Os LCD Soundsystem fizeram-no. E também por isso, na presente digressão, os concertos têm girado à volta do último álbum, sem que sejam esquecidas canções como Movement, Dance yrself clean ou All my friends.

No caso de Portugal, depois da estreia em Paredes de Coura, em 2004, deram dois concertos seguidos no Lux-Frágil (e outro na Casa da Música do Porto) em 2005, passaram pelo Super Bock Super Rock em 2007 e pelo Nos Alive em 2010, tendo regressado a Paredes de Coura, já ressuscitados, em 2016. Agora terminam a digressão em torno do seu último álbum em Lisboa. Depois segue-se uma paragem. Quem sabe se não será, mais uma vez, a última vez dos LCD Soundsystem?

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