Porque é que os professores irritam tanta gente?

Não percebo como os professores aceitam que bons e maus tenham progressões semelhantes; e no meio está Mário Nogueira a misturar tudo com o beneplácito da classe.

Um dia os professores irão perceber que os Mários Nogueiras desta vida podem ter lutado ferreamente pelos seus direitos laborais e pela manutenção de alguns dos seus privilégios, mas têm aos poucos vindo a roubar à profissão o prestígio, a autoridade e a simpatia que ela deveria ter junto da comunidade que é suposto servir.

O meu último texto, sobre a questão das progressões automáticas, deu origem a numerosas reacções, a mais comum das quais vinda de professores que procuraram explicar-me que o automático não é assim tão automático – implica avaliações positivas (que todos têm), horas de formação e, nalguns escalões, observação de aulas (que todos podem ter). Chamem-lhe “automatizada”, se quiserem; a discussão semântica interessa pouco. É óbvio que a progressão está estruturada em torno do tempo de serviço, que é o que justifica o conflito entre governo e sindicatos. Se a progressão não fosse generalizada não andaríamos a debater milhões de euros.

No entanto, o que mais me impressionou foi ter encontrado professores a defenderem que este mecanismo burocrático de ascensão na profissão (e também de travão dessa ascensão, já que a obrigatoriedade de permanecer certos anos em cada escalão serve igualmente para impedir a rápida promoção dos melhores) é, ainda assim, o melhor sistema possível. O argumento usado foi este: se as promoções fossem deixadas à discricionariedade das escolas, aqueles que subiriam não seriam os melhores professores, mas sim os mais próximos de quem avalia.

Louvo a sinceridade do argumento, e é até possível que ele tenha fundamento. Mas conformarmo-nos com este facto é reconhecer, de forma tristemente fatalista, que vivemos num país condenado à perpétua mediocridade: os professores não podem ser avaliados porque é impossível pôr de pé um bom sistema de avaliação; e o mérito nunca será o motor de ascensão profissional dentro da função pública. Mais vale fechar o país e desligar a luz.

Analisando as centenas de reacções, sou obrigado a concluir duas coisas: 1) que os professores interiorizaram, de facto, a impossibilidade de um dia existir uma avaliação séria do seu desempenho; 2) que existe o sentimento profundo de uma classe acossada pelo Ministério da Educação e por todos os que não leccionam. Os professores falam como se ninguém na sociedade reconhecesse o valor da sua profissão e como se todos desmerecessem o enorme esforço que eles fazem diariamente.

Só para esclarecer: não é verdade. Em Setembro, a minha filha mais velha estará no nono ano, o meu segundo filho no sétimo, o terceiro no quinto e a mais nova vai entrar para a primeira classe. Todos em escolas públicas. Isso significa que já contactei, directa ou indirectamente, com largas dezenas de professores. E já vi de tudo: gente extraordinária que é um crime ser obrigada a saltar de escola em escola, e verdadeiras nódoas que coleccionam baixas, frustrações e incompetência. Qualquer pai deseja premiar os melhores e afastar os piores.

O que me choca, sempre chocou, e continuará a chocar, é a forma como uns e outros se misturam no sistema, e como este é incapaz de os diferenciar. Também não percebo como os professores aceitam que bons e maus tenham progressões semelhantes. Uns são escandalosamente mal pagos; outros escandalosamente bem pagos; e no meio está Mário Nogueira a misturar tudo com o beneplácito da classe. Isto, de facto, nunca compreenderei – e quem se irrita com tamanha injustiça está cheiinho de razão.    

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