“Nunca me diverti tanto com o râguebi como agora”

Tranquilo quanto ao futuro do RC Lousã, José Redondo mostra-se crítico em relação à forma como o râguebi português tem sido promovido

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Miguel Rodrigues

Perito na arte da publicidade e do marketing, armas que soube explorar para elevar a marca Licor Beirão ao sucesso, José Redondo deixa críticas à forma como a federação tem esbanjado o potencial de um dos seus melhores trunfos no momento: os sevens. Quanto ao futuro do RC Lousã, clube que “inventou” há mais de 40 anos e onde hoje é “apenas quase um irmão mais velho”, garante estar tranquilo, porque “a estrutura está bem montada e funciona em pleno”. E isso até lhe permite viver o clube de outra forma: “Nunca me diverti tanto com o râguebi como agora. Neste momento para mim, o râguebi é quase como folhear um bom livro.”

 

Concorda que a presença no Mundial 2007 foi um jackpot desperdiçado?

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Tal e qual. Não voltará a acontecer tão cedo. Foi um jackpot e foi fantástico, mas foi uma campanha tão fabulosa que no ano seguinte caíram centenas de miúdos e nós, a federação e o Estado não tivemos capacidade de resposta, as estruturas não funcionaram e acabou por ser uma frustração. Todos queriam fazer râguebi, mas depois chegavam aos clubes e não havia campo, não havia balneário… Os país dos miúdos chegaram à conclusão que nós éramos um logro. Que os estávamos a iludir. Na Lousã, não corri atrás disso. Continuei a procurar ter o mesmo número de atletas. Não fiz uma campanha para trazer tudo para o râguebi porque sabia que depois não lhes conseguia dar nada em troca.

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A prioridade dada neste ano aos sevens parece-lhe uma boa aposta?

Penso que sim e sou da opinião de que a federação devia apostar ainda mais. Nos sevens somos dos melhores a nível mundial e batemo-nos com todas as nações mundiais. Temos jogadores com uma vocação extraordinária para os sevens. O râguebi de XV envolve milhões e quando isso acontece, temos muitos países à nossa frente. Na final do campeonato francês o Stade de France enche com 80 mil pessoas e entram milhões de euros nos cofres da federação. Quantas pessoas estavam na final do campeonato português?

 

Isso não acontece, também, por responsabilidade do râguebi português? Referindo-se ao Licor Beirão, disse uma vez que “podemos ter o melhor produto do mundo, que se não tiver um bom marketing não vende”. O râguebi português sabe vender-se?

Não. Tem um bom produto nos sevens, mas não o sabe vender. Dou-lhe um exemplo: não entendo como vamos procurar patrocínios nacionais para a selecção de sevens. Os sevens são de nível mundial e têm de ser vendidos a uma multinacional, que até pode nem estar em Portugal, e que venda o produto para todo o mundo. Aí podem ir buscar verbas impensáveis para as empresas portuguesas. A federação é que tem que se mexer.

 

Nunca teve vontade de assumir um papel mais activo no râguebi nacional?

Eu sempre condenei aqueles empresários que apoiam os clubes de futebol por esse país fora para terem benesses municipais ou para promoveram o seu próprio nome. Nunca me servi do râguebi para me promover. Se quiser falar do meu nome, falo do Licor Beirão. A minha primeira paixão é a família, a segunda é o Licor Beirão e a terceira é o râguebi. Podia fazer do clube campeão nacional, mas o que ficava na Lousã? Nada! Zero. Daqui a uns anos de que é que as pessoas se lembrariam? Que o tipo teve uma maluqueira, meteu uns milhões na paixão dele, recebeu uns abraços, foi campeão, mas não ficou lá nada.

 

Como aconteceu com o Campomaiorense, no futebol?

É um exemplo. Veja o trauma que criou [à família Nabeiro] ter que abandonar o apoio ao Campomaiorense. Nunca pretendi isso. Quando se atingi um determinado patamar, começa a ser uma vergonha retirar o apoio. Podia dar-lhe o exemplo de centenas de pessoas que por este país fora estão queimadas por terem colocado um clube dois ou três patamares acima e depois retiraram o apoio. Valeu a pena? Para uma semana de festas e palmadinhas nas costas? Quando venho dar aulas para a Lousã para lançar o râguebi, em 1973, nunca pensei ter equipa sénior. O que queria era colocar juniores na Académica. Ao fim de oito anos tivermos uma equipa sénior. Conhece alguém que fique oito anos à espera?

 

Já passaram mais de 40 anos desde que deu essas aulas de Educação Física na Lousã para atrair jovens para a modalidade. Ainda não está cansado de râguebi?

Sei lá… Tive a felicidade de criar as estruturas necessárias para que, mesmo sendo o presidente, seja agora apenas quase como um irmão mais velho. Nunca me diverti tanto com o râguebi como agora. Neste momento para mim, o râguebi é quase como folhear um bom livro. A estrutura está bem montada e funciona em pleno, a todos os níveis….

 

Mas ao contrário do que acontece na empresa, no RC Lousã a influência familiar é praticamente inexistente…

Todos os meus filhos jogaram, mas estão praticamente desligados do râguebi. A empresa é uma estrutura familiar, o RC Lousã não.

 

Isso quer dizer que o RC Lousã já sobrevive sem o José Redondo?

A 200%. Tenho a garantia absoluta. Tenho três ou quatro directores que a qualquer momento, se por algum motivo eu precisar de abandonar ou afastar-me mais, assumem as rédeas. Tenho um lote de directores que me surpreende. Dá gosto reunir-me com eles.

Entrevista contínua aqui.

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