Turquia, um pot pourri de culturas

A leitora Manuela Santos partilha a sua experiência em Istambul.

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Envolvente e apaixonante, a Turquia embriaga-nos, baralha-nos os sentidos. É certo que sultões gorduchos, tapetes voadores e turcos conquistadores povoaram o meu imaginário infantil, mas não é razão suficiente. Que mistério é este que paira pelo ar nas ruas e ruelas de Istambul e, mesmo saindo para outros lugares, persegue-nos, cola-se à nossa pele. Respira-se quando olhamos do alto da Torre Gálata para uma cidade maravilhosa, dourada pelo sol que vai tombando em cada tarde que termina. Salpicada por numerosos minaretes, quais agulhas espetadas no céu no seu papel de sentinelas do culto, sempre prontos a chamar os fiéis à oração. Será porque esse chamamento místico, saído da voz de um qualquer muezzin e que ecoa em todos os cantos da cidade de Istambul, nos faz sentir um tanto profanos em terras do grande Mustafa Ataturk? 

A Turquia é mesmo surpreendente! Não é Ocidente mas também não é Oriente. É a porta para o mundo das diferentes civilizações que marcaram para sempre o seu território. Entro nos primórdios do cristianismo, apreciando a Casa da Virgem onde, alegadamente, terá vivido com o apóstolo João após a crucificação de Cristo e reparo que os fiéis, em rituais tão próximos a Fátima, acendem também a sua vela, rezam, depositam as suas preocupações num pequeno papel que colocam num dos muros envolventes. Olho para estes rostos sérios da solenidade e descubro culturas ocidentais e orientais a surpreenderem-me nesta devoção comum. Relativamente próximo da Casa da Virgem, o túmulo do apóstolo João pode ser visitado nas magníficas ruínas da Basílica de São João, erguida por Justiniano, no século VI, na região de Éfeso. Os vestígios da Civilização Romana são, na Turquia, de uma magnitude espectacular e Éfeso é um bom exemplo disso. Aqui, por entre o vastíssimo conjunto de ruínas desta cidade greco-romana e berço da filosofia, destaca-se a famosa Biblioteca de Celso.

Se as manifestações do Cristianismo se cruzam com as do Império Romano, Bizantino e Otomano em toda a Turquia, todas elas se vão homogeneizar numa elegância perfeita e extremamente bela na grande mesquita Hagia Sophia de Istambul, transformada em museu. Santa Sofia é uma obra-prima da arquitectura bizantina e espelho da História da Turquia. Os maravilhosos ícones do culto outrora ali praticado sob as três religiões, católica romana, ortodoxa e islâmica, expressos em toda a arquitectura interior, conferem-lhe um clima místico e até um pouco intimidante.

Mergulho em rios de gente que percorre, tranquilamente, as ruas de Istambul, gozando umas pequenas férias, consequência de dois feriados e do fim do Ramadão. A magia continua! O vai-e-vem de tantas famílias à minha volta dá a sensação de estarem em festa. A Ponte Gálata está engalanada. Não de balões, flores ou outros enfeites, mas sim de um emaranhado de canas e anzóis pendurados sobre o Corno de Ouro. A pesca é um hobby masculino de peso.

A pequena viagem pelas águas calmas do Bósforo revela-me a grandiosidade e beleza exterior do Palácio Dolmabahçe implantado junto a este canal. Construído ao estilo europeu de finais do século XIX, os seus interiores ricamente decorados, revelam, no entanto, o gosto dos ricos sultões de outrora, esparramados nos seus cadeirões, contemplando graciosas mulheres nas suas danças do ventre.

Hora de entrar no Grande Bazar. Ambiente alucinante! Gente rodopiando como quem dança aos sons de um oud ou de uma baglama que ecoam pelos corredores labirínticos deste vasto bazar, anunciando botequins de instrumentos musicais para mim desconhecidos.  Por entre todo o rebuliço de comerciantes e compradores, envolvidos num regateio aromatizado pelo cheiro das especiarias e couros que penetram bem forte nas narinas, no meio do colorido de tantos objectos, eis que me deparo com um calígrafo no seu pequeno estaminé. Fico ali a observar a leveza do gesto, a segurança da caligrafia para dali aparecer o meu nome ocidental cheio de arabescos. Uma recordação que guardarei para sempre da mágica Turquia.

Manuela Santos

viajarparaalimentarossentidos.blogspot.com/

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