A inteligência artificial está na moda e as marcas aproveitam

Em 2018, já há escovas de dentes, sistemas para encontrar peixes e produtos de cabelo "inteligentes". Cada vez mais empresas usam o jargão para vender produtos.

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Estamos rodeados de produtos "inteligentes". Incluindo aplicações para identificar peixes Kim Kyung Hoon/Reuters

Ainda há poucos anos, expressões como big data e computação em cloud dominavam o vocabulário de executivos e empresas. Hoje, é a inteligência artificial que está na moda. Cada vez mais empresas dizem usar a tecnologia, seja para lançar novos serviços ou dar nova vida a produtos mundanos.

Os exemplos abundam. Este ano, a Colgate e a Apple juntaram-se para criar uma escova (descrita como “inteligente”), que avalia e ajuda as pessoas a escovar os dentes para melhorarem a sua saúde oral através de sensores e jogos (custa cerca de 85 euros). A DeepFish é uma empresa lituana que usa redes neuronais, que são inspiradas no cérebro humano, para identificar espécies de peixe em fotografias. A Hoofstep analisa o comportamento de cavalos na Suécia. E, em Nova Iorque, há uma startup que diz utilizar inteligência artificial para criar produtos de beleza vegan, sem soja e sem glúten.

“A inteligência artificial é uma buzzword [palavra da moda], como já foi o Java, a Web (nos anos 2000), o big data e outros. Mas qualquer buzzword descreve aquilo que é actual”, diz ao PÚBLICO Andrzej Wichert, professor e investigador no Instituto Superior Técnico. Para Wichert, porém, é fundamental fazer a distinção entre inteligência artificial e machine learning (ou aprendizagem automática). A primeira é muito mais rara.

“O machine learning é quando as máquinas aprendem a realizar uma função a partir de bases de dados, por exemplo classificar imagens ou resolver tarefas específica”, explica Wichert. Por exemplo, a capacidade da escova  da Colgate para dar sugestões para melhor lavar os dentes. “Inteligência artificial, como um todo, vai muito além disso, incluindo resolução de problemas do zero e exposição de conhecimento. Por exemplo, aquilo que o Watson, da IBM, e a Siri, da Apple, começam a fazer."

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Várias marcas têm escovas "inteligentes" Reuters

É normal que cada vez mais empresas queiram esta tecnologia nos seus produtos, diz Ana Margarida Barreto, professora e investigadora de Marketing e Comunicação Estratégica na Universidade Nova de Lisboa. “Uma das grandes preocupações das marcas na actualidade é garantir que a experiência que o consumidor tem com a marca é diferenciadora, única”, explica Barreto. Desde os anos 1990, refere, isso não depende apenas da qualidade do produto, mas das experiências que a marca proporciona. 

Porém, as novas promessas – por exemplo, uma aplicação de 2018 da L’Oreal para escolher a melhor cor de cabelo e penteado para o formato da cara, com base em algoritmos capazes de aprender – têm de funcionar. “O que está em causa é a imagem da marca. Se esta for beliscada, a concorrência sai beneficiada”, lembra Barreto. “O benefício não reside na utilização dessas expressões, mas na sua capacidade de implementação para melhorar a experiência de consumo.”

São as primeiras empresas a desenvolver produtos na área, que são recordadas, diz a investigadora. “Não é qualquer empresa que pode desenvolver estratégias ao nível da inteligência artificial. Há uma corrida, sim, mas é para conseguir criar as experiências.”

De acordo com um relatório de 2018 da analista CB Insights, o número de referências à inteligência artificial aumentou cerca de cinco vezes nos últimos cinco anos, e em todos os sectores, desde a saúde ao desporto. Por outro lado, a popularidade do machine learning já está a diminuir.  Segundo o relatório, a tendência de associar esta parte da inteligência artificial a tudo, “e em produtos aparentemente absurdos, mostra que o machine learning não é uma tecnologia exótica”, mas, sim, “a base de todos os programas informáticos e aplicações modernas”.

“Se todas as marcas começarem a apostar no recurso à inteligência artificial como factor de diferenciação, esta deixará de cumprir o seu propósito”, diz a investigadora Ana Margarida Barreto. "Deixa de ser uma novidade e o consumidor passa a encarar essa oferta como algo previsível.”

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