Os desempregados fizeram a festa em Alfama

O grupo Alfama-te deu uma festa invulgar no Clube Lusitano, em Lisboa: encheu as paredes de anúncios de empregos e disponibilizou-se a distribuir currículos. Os jovens aderiram

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LauraMary/Flickr

Chegam de currículo na mão. Deixam-no numa caixa, pagam a entrada e vão, pelo menos durante uma noite, procurar emprego num ambiente descontraído. A Festa do Desempregado, que juntou sábado à noite jovens de várias áreas profissionais no Clube Lusitano, em Lisboa, pretendia ser um espaço onde (além de música, comida e bebida) fosse possível procurar emprego.

“Isto não é uma FIL [Feira Internacional de Lisboa], mas é um sítio onde nem tudo é triste, onde se pode conhecer e interagir com pessoas, ao mesmo tempo que estás a consultar propostas na parede”, diz Frederico Carvalho, um dos responsáveis pelo Alfama-te, que dinamizou o encontro. Lá dentro, há duas salas: uma com espaço para dançar, projecções vídeo e um DJ; e outra, mais iluminada, onde se pode consultar dezenas de anúncios afixados nas paredes.

Muitos dos que resolveram ir até ao Clube Lusitano fizeram-no por curiosidade. Grande parte soube da festa através do Facebook e pensou “por que não?”. O objectivo era o convívio, mas se, pelo meio, surgisse alguma oportunidade profissional, juntar-se-ia o útil ao agradável. Havia quem passeasse de copo na mão, mas também quem se concentrasse, de bloco em punho, a anotar possíveis saídas para o marasmo do desemprego.

João, o professor que já pintou casas

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Além da sala dos currículos, havia uma com espaço para dançar e projecções de vídeo Maria João Lopes

João Lopes, de 24 anos, desempregado desde Abril, é um deles. Dava aulas de inglês ao 1º ciclo, a recibos verdes, no âmbito das actividades de enriquecimento curricular, numa escola do distrito de Lisboa. Ao fim de um ano, houve cortes nas verbas da autarquia que, em conjunto com a associação de pais, financiava as actividades, e mandaram-no embora.

Desde então já ajudou a fazer mudanças, pintou casas, deu explicações. E também fez as malas: deixou a casa que repartia com amigos há dois anos (durante a licenciatura em Inglês na Universidade Nova de Lisboa, trabalhava num "call center") e voltou a morar com a mãe.

Agora passa horas ao computador, a ver se tem alguma resposta na caixa de e-mail, à procura de ofertas de emprego em sites. Alguns part-times que encontra dar-lhe-iam cerca de 250 euros por mês, “não chega”. O que João quer é um emprego que lhe permita emancipar-se.

Neste momento, conta a ajuda da mãe, que é escriturária numa empresa multinacional. O pai já faleceu. João, que tem ainda um irmão mais novo, só não aceitou que lhe tirássemos uma fotografia. Quer proteger-se: “Hoje nas entrevistas perguntam-nos tudo: se temos carro, por causa das greves nos transportes, se já fizemos greve ou participámos em manifestações, se queremos ter filhos…”.

Na sala decorada com anúncios que diversos empregadores enviaram à organização e com outros que os membros do Alfama-te pesquisaram, também encontrámos Raquel Dionísio, de autocolante ao peito no qual se lê: “Eu escrevo, faço revisões de texto e danço”.

Nas próximas duas semanas, a Alfama-te vai agrupar todos estes currículos e dá-los a conhecer, através de email e Facebook, às pessoas que fazem parte da base de dados do grupo. “Vamos estimulá-los a ter uma parte activa no emprego destas pessoas”, diz Frederico Carvalho. Na festa também participaram entidades que apoiam desempregados: uma de formação e outra que ajuda na criação do próprio negócio.

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