Número de crianças retiradas de urgência às famílias caiu para metade

Os primeiros dados sobre as comissões de protecção de crianças foram apresentados nesta segunda-feira. Lidaram com quase 70 mil menores.

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ADRIANO MIRANDA

Menos crianças e jovens foram em 2017 retirados de urgência às famílias, e sem o consentimento destas, por “estarem em perigo iminente”. O número de procedimentos de urgência caiu para quase metade: de 299, em 2016, para 160, em 2017. São dados que dão conta da actividade das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ), divulgados nesta segunda-feira.

“As CPCJ consideraram que houve menos situações urgentes”, em que a vida ou a integridade física das crianças estava em causa, diz Rosário Farmhouse, que preside à Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Protecção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ) desde Novembro de 2017. No ano de 2016 tinha-se registado um valor recorde no que diz respeito a retiradas à família, no âmbito do procedimento de urgência previsto no artigo 91.º da Lei de Protecção de Crianças e Jovens. Em 2015, tinham sido 264. E, no ano anterior, 234.

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O sumário executivo do Relatório Anual de Actividades das CPCJ, apresentado nesta segunda-feira no encontro anual das CPCJ, na Figueira da Foz, faz o ponto de situação do que foi o trabalho destas estruturas que acompanharam 71.021 processos ao longo de 2017, o que corresponde a um universo de 69.967 crianças (há processos de uma mesma criança que podem estar contabilizados em mais do que uma CPCJ). Perto de 45% destes processos já vinham de anos anteriores.

Houve cerca de mais 1000 abertos ao longo de 2017, relativamente a 2016, mas menos cerca de 1000 crianças acompanhadas (porque mais processos foram arquivados).

A negligência ganhou peso – representa 40% das novas situações de perigo diagnosticadas em 2017, quando em 2016 não passava dos 29% – mas não ganha necessariamente importância: esse aumento tem a ver com o facto de em 2017 a negligência, enquanto situação de perigo, ter passado a incluir a chamada exposição a comportamentos que comprometem o bem-estar e desenvolvimento da criança. Já a exposição de uma criança a violência doméstica passou a ser uma categoria autónoma no relatório de actividades, refere a presidente da CNPDPCJ.

“Na negligência, juntámos o consumo de álcool, o consumo de estupefacientes, a prostituição dos pais, e outros comportamentos que possam comprometer o bem-estar e desenvolvimento das crianças”, detalha Rosário Farmhouse. “A violência doméstica passou a ser uma categoria de perigo independente e inclui a violência física sobre a criança em contexto de violência doméstica." Em 2017, estas últimas situações representaram 12,5% (1915 crianças) do total de novos casos diagnosticados.

Homogeneizar procedimentos

Rosário Farmhouse diz que não vê qualquer ligação entre a redução significativa do número de procedimentos de urgência (que permitem às CPCJ retirar as crianças às famílias, sem o consentimento destas, antes mesmo de essa medida ser decretada por um juiz) com as recentes polémicas relacionadas com retiradas de crianças aos pais, para acolhimento em instituição.

“Foram feitas menos retiradas de crianças, quer no momento da sinalização quer no momento do diagnóstico em que era preciso fazer procedimento de urgência”, diz Rosário Farmhouse. "Naturalmente, nós temos tentado, cada vez mais, homogeneizar procedimentos e criar igualdade de resposta perante casos semelhantes." Ou seja: face a uma situação de perigo actual ou iminente para a vida ou integridade física da criança usar idênticos critérios em diferentes CPCJ. E não haver umas que fazem uma avaliação distinta da que outra faria. Comparativamente a esse ano recorde de 2016, “houve menos situações em que foi preciso fazer uma retirada de urgência”, limita-se a explicar Farmhouse.

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Menos crianças em acolhimento residencial

No ano passado, foram comunicadas às CPCJ 39.293 situações de perigo – mais 99 situações do que em 2016 –, sendo que cerca de 30% acabaram por ser arquivadas. Continuam a ser as polícias as principais entidades sinalizadoras, responsáveis por um terço das denúncias. Seguem-se as escolas (22,5%). As comunicações feitas por cidadãos anónimos, familiares e vizinhos representam cerca de um quinto do total.

Estas sinalizações, quer as feitas em 2017, quer as que transitaram de outros anos, foram avaliadas pelas comissões. No ano passado, após esse processo, 36.650 situações de perigo resultaram na aplicação de medidas de promoção e protecção. Ou seja, a cerca de metade das crianças acompanhadas pelas comissões foi aplicada uma medida de promoção e protecção.

O apoio junto dos pais mantém-se como a medida mais comum (em 79,3% dos casos), seguindo-se o apoio junto de outro familiar (9,7%). O encaminhamento para uma instituição de acolhimento com consentimento das famílias ou na sequência de uma decisão do tribunal – a terceira medida mais aplicada (8,8% dos casos) e vista como opção de fim de linha – voltou a recuar face ao ano anterior, confirmando a tendência dos últimos anos. Foram 3229 menores, o número mais baixo dos últimos seis anos. Em termos percentuais – quando se mede o peso desta medida no universo de todas as medidas de promoção e protecção aplicadas num ano – é preciso recuar a 2010 para se encontrar um valor semelhante.

Para além das medidas já referidas, que constam do sumário executivo, podem ser aplicadas medidas de confiança a pessoa idónea, apoio para autonomia de vida e acolhimento familiar.

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