Actualização e resgate eclesiais: um chamado do Santo Padre

O mundo actual é cada uma das nações, é cada povo e identidade cultural. Numa escala de especificidade ainda maior, Francisco refere-se a cada cidade, e mais, que em cada uma, existem imaginários colectivos

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Remo Casilli/Reuters

Em encontro realizado em 2013, à época da Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro, o Papa Francisco, reunido com representantes episcopais latinos e caribenhos, levantou um chamado: a Igreja, a fim de não se tornar obsoleta, precisa desenvolver um diálogo com o mundo actual.

Entender o significado de “mundo actual” é reconhecer um processo premente de actualização da Igreja, o que não quer dizer a perda dos valores essenciais e fundamentais desta instituição. Não se fala em reforma, em revolução, fala-se em actualização. Tornar algo actual é manter a sua essência e dar-lhe nova roupagem. Mantem-se o essencial, tornando-o actual, por meio da linguagem.

O mundo actual é cada uma das nações, é cada povo e identidade cultural. Numa escala de especificidade ainda maior, Francisco refere-se a cada cidade, e mais, que em cada uma, existem imaginários colectivos. A Igreja ramificada deve lançar as bases para o fenómeno da actualização. Actualização que só pode ser obtida através de diálogo, por não se tratar de uma perspectiva externa em que a Igreja olha, de fora, o povo, mas sim de uma Igreja que vai ao povo, que conversa com o povo, que é a própria manifestação de uma face popular. A instituição, como um todo, depende de aderir à actualização, a fim de alcançar a perenidade de que tanto anseia.

O discurso do Papa, naquele episódico evento, buscou afastar qualquer tendência de defesa do tradicionalismo exacerbado, do anacronismo eclesial e de seus penduricalhos dogmáticos. É um chamado a manter a essência e a actualizar a linguagem. A linguagem é a criação do povo, das bases populares, logo a actualização deve emergir dessa mesma fonte: as bases populares.

Francisco, ao mesmo tempo em que firma uma perspectiva futura de Igreja actualizada, estuda o presente e retira o essencial do passado. É, pois, tanto uma perspectiva, quanto uma prospectiva, que propõe. Nesse contexto, a noção de actualização acompanha a de resgate eclesial, pois a sociedade caminha sobre a esteira do tempo e, se também quiser sobreviver de pé nesta esteira, deve a Igreja caminhar ladeada. Na sociedade vigora, não a certeza de avanço, mas de futuro, isto é, mesmo um possível retrocesso acontecerá no porvir. A noção de progresso ou retrocesso social não tem nada que ver com tempo cronológico, senão com uma perspectiva sociológica.

Na Igreja que reza Francisco, o binómio é: actualização e resgate. Quando propõe uma Igreja presente no imaginário colectivo de cada cidade, acaba, também, por tocar na génese fundante da própria Chiesa. Afinal, onde reside o cristianismo, enquanto filosofia? No imaginário colectivo, difundido pela fé, fundamentado no verbo popular e num profeta singular. É um chamado de actualização dialógica com o mundo: resgatem o imaginário colectivo original e actualizem a linguagem eclesial.

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