Da natureza do álcool e felicidade

O álcool pode ser benéfico em pequenas quantidades; porém a sociedade de hoje em dia faz uma lavagem cerebral às pessoas, levando-as ao exagero, ao mundano

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Monica Silva/Unsplash

Quando estamos na taberna, não pensamos na morte, ou que cor seja ela, preto, cinza, o abominável e imparável destino. Porém, apesar de o álcool afectar cerca de quase todos os órgão do ser humano, em destaque o cérebro (as células nervosas não se regeneram), o fígado e o coração. O alcoolismo é uma epidemia mais grave que a peste das idades médias. Famílias desestruturadas, sem-abrigos, pedintes ou até mesmo crimes e assaltos ou a prostituição – tudo consequência de algo tão veneno e perigoso do álcool. Mas esquecemo-nos da outra parte: que álcool dá prazer. O álcool alegra a pessoa, pois pensar é uma verdadeira doença, pensar é ir contra todas as leis da natureza, e fazemo-lo a toda a hora, martirizando-nos. Se a dor de pensar é elevada, se o homem é mesmo uma aberração da natureza, como pode sentir a sua velha natureza macaca e não intelectual de novo? Como pode o homem continuar a ter certeza de que pode ser feliz, se um dia tudo acabará com a morte – são esses pedaços de nada, que o fazem agarrar e experimentar de forma quase gulosa todos estes momentos de prazer, para que um dia a vida não seja vista como desperdiçada. O medo de «o que está a faltar» é muito preenchido pelo álcool, sendo que o álcool primeiramente dá uma euforia desmedida, levando a pessoa a pensar que está de facto a desfrutar a sua vida.

No momento em que uma pessoa descobre a garrafa, e os seus encantos, a pessoa invade-se num mundo de devaneios e quase que transe – estes devaneios implicam uma quebra nos processos cognitivos das pessoas, levam-nas a querer desfrutar o momento e etc., etc. É dessa alegria passageira que se foge dos traumas de infância. Uma criança, um ser tão belo e inocente, sofre grandes traumas na vida, muito antes de ter sequer começado a vivê-la. Descobrir que a sua paixão, a primeira, corresponde ao progenitor do sexo oposto e que é um amor proibido em sociedade – isto torna-se excessivamente doloroso para os pequenos –, sendo isto suportado pela teoria de Complexo de Édipo, pois o jovem rapaz começa a desenvolver a sua sexualidade, idealizando a mãe como sua parceira, mas isto tudo num nível inconsciente, sem qualquer pensamento crítico ou reflectivo. Afinal, quem é que consegue ter controlo sobre o seu próprio inconsciente? Esses traumas mais tarde serão acumulados e terão como consequência o sentimento feliz que o álcool providência, dado que esta substância invade a mente e «limpa-a», deixando-a rasa e com pouco espaço para raciocínios. Daí que as pessoas bebem para esquecer.

É desse sentimento do «eu posso vir a ser feliz, eu posso esquecer o passado!» que lança cinzas na fogueira do possível alcoólico. É como uma distorção no pensamento e lógica que leva ao bebedolas a pensar «Bem, afinal agora sinto-me bem, livre» Livre?, pergunto eu. Esse sentimento de fugir da prisão dos traumas turbulentos da infância para a bebedeira desenfreada é o que transforma um alcoólico num alcoólico. Um mero exemplo destes traumas: a ida para a escola primária, em que se é obrigado a aprender a estudar desde tenras idades ou a socializar com pessoas que mal sequer desenvolveram o seu carácter, estando sempre a serem controlados por instituições, como a escola, os pais, os professores ou quando são adolescentes têm que estudar, experimentar perdas, experimentar o isolamento e o ódio e ver os miúdos mais populares a terem uma vida aparentemente pior. Em conclusão, durante essas duas fases da vida, o ser humano é saco andante de dor interna, a dor de viver, o eterno abismo que nos consome a todos. Tudo no ser humano é dor ao mais alto nível (afinal o macaco foi uma má herança).

Mas dessa dor sem fim, desses tormentos, raios, tempestades, relâmpagos, mares turbulentos, isto tudo vai afectar a vida de qualquer um e do momento em que se descobre o álcool pensa-se «pois bem, agora estou livre da dor, agora posso manifestar o que quiser na vida, entreter o povo, fazer de mim palhaço», etc. Um dos problemas disto, e eu cada vez fico mais chocado é a falta de competência na comunicação dos sentimentos. Os sentimentos negros todos os guardam, os nossos pecados só são conhecidos por Deus. Mas os sentimentos bons deitam-nos e jorram-nos lá para fora. É mil vezes mais fácil exprimir uma falsa felicidade, só para se gabar em frente dos outros, do que admitir verdadeiros sentimentos de tristeza ou ansiedade. O álcool, primeiramente, quando um grupo de amigos começa a beber, começa a ser notado com fala distorcida dos que bebem, pensamento nebuloso até que chega a fase de estupor, em que a pessoa começa a denegrir a sua vida e a dos próximos. Em conclusão o álcool é só uma fuga temporária de todos os problemas; mas há uma condição para que esta lei Universal seja perfeita: o álcool é a fuga temporária de problemas que existem e estão escondidos e amarrados a sete chaves (e hoje em dia, as emoções negativas, os traumas, as desilusões, etc. contribuem um ser a beber para demonstrar a sua «falsa felicidade»).

Quanto mais «esqueletos no armário» o ser humano tem, mais propício é de se entregar à bebida. E depois bebe, depois crucifica-se. Os alcoólicos bebem para banhar a dor «com óleo», para a glorificar, para formarem uma ceita de religião de dor e sofrimento, mas ao mesmo tempo esquecendo o sofrimento – no fundo gera-se um vazio pois o sofrimento antigo é esquecido mas o do momento presente é enobrecido. O álcool é veneno, mas os alcoólicos adoram-se torturar com o álcool, numa espécie de masoquismo, de puro prazer pela dor, de correntes de água que um dia pararão de correr.

O problema disto tudo não é o que os alcoólicos fazem – disso ninguém tem nada a ver. O problema é que a sociedade está a criar alcoólicos – os anúncios televisivos afirmam que «é bom beber, que se ao beber está-se a socializar a divertir-se, etc.» Quando na realidade aquilo é propaganda barata, que na vida real os bebedolas apenas estão a glorificar o seu sofrimento e a deitar para fora uma imagem de ser-se feliz, quando na realidade estão mortos por dentro. A ideia é que a felicidade parece que está incumbida numa garrafa de álcool, o fruto que todos querer provar para alcançar o estatuto de «feliz». A felicidade vem de outras formas para além do álcool e todo esse comércio sujo, podre e barato não passa de um engodo, um comércio, como o próprio nome diz.

Estão de momento milhares de pessoas em todo o mundo a tentarem fugir do álcool. E o Senhor gritar-lhes-á «Porque não largais isso e viveis e desfrutais dos milhares de tons de cores que é a vida?» e eles responderão «Senhor nós não achamo-nos dignos disso, fomos feito para sofrer e sofrer é a nossa condição – apenas temos o consolo do pecado, que no fundo é a felicidade numa garrafa». O Senhor gritará «Vinde bebedolas, vós sois o pecado, mas vinde também vós, ó eruditos e puritanos, pois nenhum de vocês achava-se consolado de tanto amor que Eu posso dar.» E assim será o julgamento final do álcool. E os alcoólicos sairão dos seus buracos e abraçarão o amor de Deus, sem medo de ser julgado, porque no fundo, procuravam não ser julgados e antes a compreensão mútua e a vivência de algo com emoções fortes.

Em resumo, o álcool pode ser benéfico em pequenas quantidades; porém a sociedade de hoje em dia faz uma lavagem cerebral às pessoas, levando-as ao exagero, ao mundano. O álcool transformou-se numa fuga da realidade, um mero brinquedo que se dá aos gatos para eles se esquecerem da própria existência – assim é o álcool, um brinquedo dado às pessoas (que não têm poder nenhum sobre a vida, que estão inseguras, deprimidas, pois a sociedade em que vivemos corta todas as possibilidades com o mundo das estrelas) para esquecerem-se da sua própria existência miserável. Todos nós não temos poder… a sociedade é constituída por zeros e uns… somos todos zeros que aspiram ser uns, mas até lá bebemos, sonhamos, martirizamo-nos e morremos.

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