Vale a pena trabalhar oito horas por dia?

Desde o início do século XX que as greves gerais dos sindicatos conseguiram instituir que o dia de trabalho seria constituído por oito horas. Mas 100 anos depois, esta medida tomada por razões humanitárias e não de produtividade, faz ainda menos sentido do que antes

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Timon Studler/Unsplash

Vale o que vale mas está cientificamente comprovado que a produtividade do trabalhador médio declina drasticamente ao fim de seis horas, e periodicamente ao fim de cerca de 50 minutos, requerendo nessa altura um intervalo de cerca de 15 minutos para repor a concentração. Sim, é verdade, apesar de tratados como estatísticas e rodas dentadas, as massas trabalhadoras são compostas por pessoas reais. Só isto é o suficiente para tornar literalmente absurda a jornada laboral de oito horas, como ela está pensada actualmente, pois é uma inevitabilidade da natureza humana que existam picos de produtividade e momentos de ócio e isso é algo que tem de ser reconhecido por todos, empregados e patrões.

Talvez as oito horas diárias fizessem sentido se o tempo de deslocação fosse incluído no tempo de trabalho, assim como a hora de almoço, já que esses momentos existem em benefício do empregador. Antes que alguém diga que o português não quer trabalhar, certamente que a relação laboral também é do interesse do contratado mas não vamos fingir que os pratos da balança não têm vindo a pender cada vez mais para o lado da entidade patronal, com medidas governamentais que privilegiam de forma encapotada os detentores dos meios de produção, por serem considerados os principais estimuladores da economia. Exactamente como se ainda vivêssemos a realidade Fordista, em que apenas andamos a apertar porcas e parafusos e a motivação e personalidade de cada trabalhador não fosse uma mais valia para as empresas, que se reflecte no resultado final.

Continua a tratar-se o trabalhador como alguém que tem uma obrigação em vez de o tornar parte integrante da empresa a que pertence, responsabilizando-o. Tudo isto com a agravante de, cada vez mais se disseminar a ideia de que os empregadores estão a fazer um favor aos empregados ao contratá-los e por isso “é bico calado e toca a trabalhar se queres receber alguma coisa ao fim do mês”.

A verdade é que oito horas de trabalho diário não só nos desapropriam de um terço da nossa vida, como contribuem ainda mais para o exacerbar das desigualdades sociais, falta de solidariedade, problemas ambientais e para a nossa decadência pessoal e enquanto espécie, quer seja física, espiritual ou psicologicamente.

Qual é o trabalhador que pode ser realmente feliz oito horas por dia a desempenhar a mesma função, no mesmo local, quando ainda perde pelo menos mais uma hora em deslocações, isto se tiver sorte? Ainda por cima não tirando praticamente nenhum benefício real da relação, que não o ter dinheiro suficiente para aumentar ainda mais a clivagem social, ao injectá-lo noutras corporações.

O problema é que hoje em dia a felicidade ou é apenas mais uma comodidade que vem como bónus quando se compra um refrigerante ou o telemóvel mais recente ou então é uma mariquice de “quem não sabe o que o que a vida custa”. E mesmo assim temos poucas horas livres para lhe dedicar.

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