Lázaro

Ronca-se, toca a máquina, murraça na máquina, vinte minutos de "snooze", dia negro com raios e trovões, lava, veste, morde, café no café a resmungar baixinho inanidades

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Kyle Meck/Unsplash

Ronca-se, toca a máquina, toque na máquina, cinco minutos de "snooze", dia cinzento, lava, veste, morde, café no café a olhar só para o empregado. Trânsito para lá, trabalho chato e sem segredos, chefe tolo, diz-se-lhe que sim. Almoço, mais trabalho menos segredos, trânsito para cá, beijo à patroa, piparote ao puto, dá-se para a novela: treta! Mete um tinto: de nada! Jantar, dar rua ao cachorro, chichi, cama, volta na cama, “qu’é da coragem?”, ronca-se.

Ronca-se, toca a máquina, encosto na máquina, dez minutos de "snooze", dia cinzento com chuviscos, lava, veste, morde, café no café a olhar só para o negrume do café. Trânsito para lá, trabalho chato e sem segredos, chefe parvo, diz-se-lhe que sim. Almoço, mais trabalho menos segredos, trânsito para cá, apalpão na patroa, calduço no puto, dá-se para a bola: calões, malandros! Mete um calcitrim: de nada! Jantar, passear o cão, chichi, cama, volta na cama, “qu’é do carinho?”, ronca-se.

Ronca-se, toca a máquina, empurrão na máquina, quinze minutos de "snooze", dia cinzento com chuva a sério, lava, veste, morde, café no café a olhar os outros com olhos maus. Trânsito para lá, trabalho chato e sem segredos, chefe pulha, diz-se-lhe que sim. Almoço, mais trabalho menos segredos, trânsito para cá, encontrão à patroa, ralho ao puto, dá-se para a bruxa ou para o padre: cambada de pulhas! Mete um bagaço: de nada! Jantar, puxar a rédea ao rafeiro, chichi, cama, volta na cama, “qu’é da força?”, ronca-se.

Ronca-se, toca a máquina, murraça na máquina, vinte minutos de "snooze", dia negro com raios e trovões, lava, veste, morde, café no café a resmungar baixinho inanidades. Trânsito para lá, trabalho chato e sem segredos, chefe cabrão, diz-se-lhe que sim. Almoço, mais trabalho menos segredos, trânsito para cá, berro à patroa, estalo no puto, dá-se para o voto: ladrões, bandidos! Mete uma linha (que a branca está barata): de nada! Jantar, pontapé no bicho quando ele arranha a porta, chichi, cama, volta na cama, “qu’é do amor?”, ronca-se.

Ronca-se, toca a máquina, porradão na máquina, meia hora de "snooze", dia lindo mas não se nota, lava, veste, morde, café no café a vociferar obscenidades. Trânsito para lá, trabalho chato e sem segredos, chefe filho da puta, dá-se-lhe a coragem e o carinho e a força e a música e o amor todo duma só vez, e consciente do preço a pagar, orgulhoso do descaramento: diz-se-lhe que “não”...

Trava tudo: coisa nova, ao largo... no mar!

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