A vida nunca foi tão boa

Estado Islâmico, homofobia, racismo, fome e problemas ambientais sempre houve, e em maior número – apenas as nomenclaturas eram diferentes

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Aly Song/Reuters

As notícias que nos arrombam as casas e entram por elas adentro só nos deixam duas alternativas. Ou saímos janela fora, olhamos para a bela luz do sol e comentamos com os poucos vizinhos que nos prestam atenção que está um lindo dia. Ou deixamo-nos estar, engalfinhados no negrume do medo, do horror e do pessimismo. Acontece-nos, portanto, com frequência em demasia, os desabafos: este mundo é um nojo, as pessoas precisam de sete palmos de terra sobre elas, a vida não faz sentido. Solução ideal para isto? Um equilíbrio, quiçá.

Até aqui, tudo certo, embora se exagere no exagero. Os tempos não estão a ficar piores e o mundo já esteve menos agradável. Há muito mais motivos para ter esperança no ser humano, seja devido às evoluções científicas ou por causa da crescente sensibilização que os humanos vão tendo uns para com os outros. Estado Islâmico, homofobia, racismo, fome e problemas ambientais sempre houve, e em maior número – apenas as nomenclaturas eram diferentes. Existiam, contudo, menos duas coisas: notícias que nos alertassem para os problemas e a humanização que nos daria força para os resolver.

A vida é uma arte mágica

Os livros de História são obras magníficas que nos permitem compreender que, bem vistas as coisas, estamos no bom caminho. Os livros de História são os jornais sobre o ontem – e, convenhamos, já vivemos dias bem mais marados. Uma das obras que me fez entender este facto é o recente "O Dia-a-Dia em Portugal na Idade Média", da historiadora Ana Rodrigues Oliveira. É que, pelo menos, nos dias que correm não estamos dependentes de mezinhas e bruxedos que nos safem da esterilidade, não estamos circunscritos a uma religião pejada de moralismos que nos obriga a fazer o que não queremos com as nossas vidas nem andamos por aí a “condenar todos os que embarguem por alguma maneira que a mulher não conceba”. Confiem em mim, são trezentas páginas que colocam muito bem em perspectiva quem somos, especialmente se tivermos em conta o lugar macabro de onde vimos.

A vida é uma arte mágica com a qual um deus ou o omnipotente acaso nos enfeitiçou. Com o mesmo vigor que duas semanas nos podem parecer eternas, também 500 anos podem assemelhar-se a um piscar de olhos. E a verdade é que nesse espirro temporal, a Humanidade tornou-se numa outra coisa, ainda cruel, mas tão melhor, tão menos carregada de prisões e presilhas. Os nossos antepassados, se ainda estiverem conscientes, algures no espaço ou no tempo, hão-de estar a rogar-nos todas as pragas do universo, clamando: “Porque raio é que eu não tive a sorte daqueles que vivem no século XXI?”

Espero não ser mal entendido. Não estou com isto a dizer que o mundo está para sempre livre de todos os malefícios. Não. A Humanidade continua a ser um bicho podre, capaz do melhor e do pior em simultâneo, agarrada aos condicionalismos biológicos, como a agressão, o ódio, o amor, a morte e todos os escolhos que se nos interpõem no caminho para a glória. Mas, caramba, seríamos pouco atentos se não mostrássemos uma pontinha de gratidão pelo sítio onde viemos parar, que, por conseguinte, nos permite empurrar a evolução mais uns passinhos adiante. Ou não é assim?

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