A escrava Isaura é protagonista de um jogo "português"

Isaura foi levada para o Brasil por traficantes de escravos portugueses e forçada a trabalhar nas plantações de açúcar em Pernambuco. A acompanhá-la está o seu filho bebé que lhe será retirado

Thralled” é o nome de um novo jogo que está a ser desenvolvido por uma equipa de estudantes e que será lançado em 2015. A história do jogo foca-se no tema da escravatura passada no Brasil colonial.

O jogo conta a história de Isaura, uma mulher oriunda do antigo Reino do Kongo, que foi levada para o Brasil por traficantes de escravos portugueses e forçada a trabalhar nas plantações de açúcar em Pernambuco. A acompanhá-la está o seu filho bebé que lhe será retirado. Isaura eventualmente acaba por fugir, percorrendo uma versão distorcida do Brasil colonial, de modo a procurar o seu filho e lutar pela sua liberdade.

“O Thralled consiste numa representação algo metafórica das experiências de Isaura, na qual ela percorre uma versão distorcida do Brasil-Colónia, revivendo o pesadelo que foi a vida cativa e a memória dos eventos que levaram a separar-se do seu bebé. Tentamos principalmente representar o estado psicológico e emocional da personagem, tentar compreender as tribulações por que uma pessoa na situação dela terá passado, de forma a invocar empatia nos jogadores, sublinhando o aspecto humano e as coisas que são comuns entre o jogador e a Isaura e, de facto, todos nós”, explicou ao P3 Miguel Oliveira, “creative lead” deste projecto.

Miguel Oliveira, natural de Lisboa e ex-estudante na Universidade do Sul da Califórnia, teve a ideia de desenvolver um jogo focado no tema da escravatura, inicialmente no âmbito de um projecto de faculdade. Neste momento estão seis pessoas envolvidas no projecto: uma desenhadora, um programador, um animador, um compositor e um "sound designer", sendo Miguel o responsável pela gestão da equipa, marketing e design do jogo.

Admitir erros do passado

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Para Miguel a ideia surgiu da necessidade de falar do papel de Portugal neste tráfico: o jovem português considera que a escravatura é um tema “pouco discutido” em Portugal e critica a forma como os portugueses são apresentados nas aulas de História como sendo homens que “sempre foram virtuosos, sempre foram capazes de gloriosas proezas que a todos beneficiaram”.

“Penso ser uma forma profundamente irresponsável de contar a nossa história: Devemos admitir os erros do passado e confrontarmo-nos com as suas consequências. De facto, a escravidão foi uma calamidade de tal categoria que nos afecta ainda hoje de forma profunda; muitas desigualdades socio-economicas e o fenômeno do racismo são factores contemporâneos que podem ser directamente ligados à instituição escravocrata, a forma mais moderna da qual foi criada pelos portugueses no século XV”.

“Thralled” apresenta uma variedade de desafios para os interessados. Num dos desafios Isaura terá que colocar o seu bebé no chão de modo a poder usar ambos os braços para ultrapassar determinados obstáculos. No entanto o bebé começará a chorar, o que atrai a atenção de um fantasma que seguirá a protagonista. O jogador terá de resolver a situação rapidamente antes que o fantasma chegue ao bebé.

Há quem considere que “Thralled” é um puzzle platformer, contudo para Miguel essa categorização está incorrecta. “É difícil encaixar o Thralled em categoria alguma – Eu gosto de o chamar experiência interactiva ou thriller interactivo, mas não sei. Há pessoal que chama Thralled um puzzle platformer, o que não acho correcto, já que tiraremos qualquer aspecto “puzzle” que o Thralled possa ter de momento, e a jogabilidade não tem muito de “platformer”, embora tenha algumas coisas em comum.

O projecto já esteve em exposição em eventos, entre os quais na conferência anual de videojogos, a E3. Além da E3 "Thralled" esteve também na Game Developers Conference em São Francisco, no Serious Games Showcase and Challenge na Florida, na Serious Play Conference em Los Angeles, e mais recentemente na Indiecade em Los Angeles e na SBGames em Porto Alegre, Brasil. As críticas e expectativas têm-se revelado positivas. “Contrariamente ao que esperava, não tem havido muita controvérsia por conta do tópico que o Thralled aborda, e as discussões sobre o Thralled têm-se focado na promessa do jogo e o que pode significar para os videojogos como médium artístico. Para as pessoas que jogaram Thralled, a opinião geral é que está a ir bem – conseguimos basicamente invocar as emoções que queremos invocar - que é muito promissor, embora haja muito trabalho para fazer ainda”.

O lançamento de “Thralled” está previsto para o final de Verão ou Outono do próximo ano. O jogo estará disponível para Ouya, PC e Mac, embora haja a possibilidade de sair também para PlayStation, Xbox, Wii e iPad.

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