(In)justiça, no tribunal ou nas redes sociais?

No tribunal, o dia do julgamento é o último. Nas redes sociais, é o primeiro, até porque o que acontece no último dia já ninguém quer saber

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Dimitris Kalogeropoylos/FLICKR

No tribunal, analisa-se minuciosamente todos os factos antes de qualquer veredito. Nas redes sociais, quatro palavras de um título noticioso sensacionalista chegam.

No tribunal, leva-se meses a recolher prova, a fazer interrogatórios, a apurar factos. Nas redes sociais, demoram-se dois minutos.

No tribunal, há jurisprudência. Nas redes socias, não há prudência nenhuma.

No tribunal, há escutas que não podem ser usadas como matéria de prova. Nas redes sociais, não é preciso escutar nada para ser dado como provado.

No tribunal, é crime a violação do segredo de justiça. Nas redes sociais, crime é não se clicar no botão de partilha e existirem segredos.

No tribunal, o dia do julgamento é o último. Nas redes sociais, é o primeiro, até porque o que acontece no último dia já ninguém quer saber.

No tribunal, o caso é arquivado porque prescreve. Nas redes sociais, vinte anos depois ainda se escreve.

No tribunal, um recurso pode tornar um culpado inocente. Nas redes socias, não há nada a que recorrer capaz de inocentar quem outrora foi esmagado pelo escrutínio público. 

No tribunal, há um juiz. Nas redes sociais, há muitos juízos. 

No tribunal, a sentença de um caso complexo tem centenas ou milhares de páginas de fundamentada argumentação. Nas redes sociais, tem quatro palavras seguidas sem verbo, acentos ou pontuação.

No tribunal, regem-se pelo princípio da presunção de inocência. Nas redes socias, esquecem-se os princípios, há muita presunção e pouca inocência.

No tribunal, tudo é “alegadamente”, até ao último dia. Nas redes sociais, a partir do segundo dia, tudo é classificado como “mente” cada vez que o arguido ousar começar uma frase.

No tribunal, o processo só termina quando “transita em julgado”. Nas redes sociais, o processo inicia-se com a transição para “julgado”.  

No tribunal, interpõem-se "habeas corpus". Nas redes sociais, não se dão abébias e só se deseja que os corpos paguem por tudo o que andaram a fazer.

No tribunal, tomam-se decisões idóneas. Nas redes socias, também se tomam decisões.

"A Lei (e o Tribunal) é feita para o Homem e não o Homem para a Lei." (Jonh Davison Rockefeller). A tecnologia (e as redes socias) também.

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