Um caçador (de imagens) à solta no Vodafone Paredes de Coura

É, desde 2005, a semana mais longa do seu ano. Com 31 anos, Hugo Lima é o fotógrafo oficial do Festival Paredes de Coura e, diga-se, um fenómeno de popularidade nas restantes semanas, graças aos cursos de fotografia que orienta

Queens of the Stone Age (2005) Hugo Lima
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Queens of the Stone Age (2005) Hugo Lima
Rita Carmo
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Rita Carmo

Às vezes sente-se um caçador. De câmara na mão, armado de teleobjectiva, à espera “que o momento se dê”. Pode ser um olhar, um sorriso, um gesto, uma qualquer expressão que conte uma narrativa, que revele a história. É assim nos festivais de música, nas viagens, nos cursos que lecciona, é assim em todo o seu trabalho.

Com 31 anos, natural da Trofa, mas a viver e a trabalhar no Porto, Hugo Lima é o fotógrafo oficial do Festival Paredes de Coura (PdC) há nove edições — prepara-se agora para a décima. Paralelamente, orienta cursos de fotografia (de Abril a Julho teve 132 alunos), fotografa um ou outro casamento (apenas do “seu” ponto de vista) e dentro de algumas semanas vai coordenar a sua primeira viagem fotográfica a Marraquexe. Numa área criativa em que o trabalho escasseia e se somam anúncios que não garantem remuneração, Hugo não tem mãos a medir. Como? “É preciso trabalhar imenso, ter um cunho pessoal e depois há o factor sorte.”

Praticamente autodidacta na área, Hugo saiu das artes gráficas para a fotografia há dez anos. Aproveitou os seus contactos na área dos espectáculos para desatar a disparar. 2005, o ano zero: aquele em que foi, pela primeira vez, o fotógrafo oficial de PdC, em que acompanhou os Blasted Mechanism em 55 concertos, em que correu o país para captar outros festivais. Hoje, defeito de profissão, já mal consegue assistir a um concerto por puro prazer. “Mesmo que não esteja com a câmara não consigo deixar de estar a fotografar. Estou sempre com o cérebro a trabalhar.”

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M.I.A. (2007) Hugo Lima

Coura, a semana mais longa do ano

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Ornatos Violeta (2012) Hugo Lima

Trabalhar no Vodafone Paredes de Coura é “muito duro”, mas, óbvio, dá “muito prazer”. “É a semana mais longa do meu ano. Cinco dias a dormir três horas por noite, sempre a correr, seguidos de duas semanas sem sair de casa, a produzir todo esse trabalho.” Meses antes já passou pelo NOS Primavera Sound, onde também é o fotógrafo oficial desde a primeira edição. É ao festival portuense que cabe o prémio fotogenia, considera, culpa de elementos como “as coroas de flores e os girassóis”, mas também da “diversidade” de nacionalidades entre o público.

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Belle and Sebastian (2013) Hugo Lima

“Pelo espectáculo e pelo espaço”, a escolha é Coura. Faça chuva ou faça sol: “Se tiver ambos, melhor.” Como em 2012, quando a lama no campismo se foi transformando, ao longo do festival, em terra árida. Em tantas edições (vê a galeria de imagens), as histórias acumulam-se. Como aquela vez em que estava no fosso no final do concerto de Justice e, “de 30 em 30 segundos”, tinha de esquivar-se das aterragens dos "crowdsurfers". Ou quando Alice Glass, dos Crystal Castles, esteve uma (quase) eternidade fixada nele, o único fotógrafo autorizado a captar o concerto. “Fazia expressões, caía em frente à câmara e eu pensava que ela era estava a interagir comigo.” De algum modo, estava. “De repente, agarrou numa garrafa de vidro que caiu a dois centímetros de mim.” Só uma outra forma de dizer “no photos, please”.

Há dois anos, quando deu por si, Hugo estava a fechar o palco principal do festival, ao lado de uns Ornatos Violeta em êxtase. Tinha autorização para fotografar a partir do palco, até que a banda o chamou, e a outros “amigos”, para testemunhar na primeira fila (literalmente) o final do concerto. “De repente, eu estava ali nas últimas músicas a fechar Paredes de Coura perante milhares de pessoas.” Uma das imagens que captou correu meia Internet.

Hugo Lima não vê perigo na democratização da fotografia.

Como fotógrafo oficial tem de estar em praticamente todos os concertos. Já perdeu alguns, por questões de “timing” ou porque a banda não autorizou. Há um, em especial, que é a sua “kryptonite”: Arcade Fire, 2005. “Tinha de produzir umas imagens, por isso não fui fotografar. A partir daí tornaram-se ‘grandes’ e eu hoje arrependo-me de não os ter fotografado.” Agora, diz, tenta sempre fazê-lo, nem que seja um minuto.

Da sala de aulas à Índia

Para além dos festivais, Hugo reparte-se entre viagens, cursos e outros trabalhos. Desde 2007 que vai regularmente à Índia e, para o ano, guiará outros como ele. Através da empresa Fotoadrenalina será o líder de uma viagem fotográfica à “sua” Índia; antes, já em Setembro, experimenta o modelo numa incursão a Marraquexe.

E, desde 2008, lecciona cursos de fotografia com a duração de três meses (55 horas) que ameaçam tornar-se num fenómeno de popularidade. No último, que decorreu de Abril a Julho, as inscrições esgotaram em Dezembro. Oito turmas, 132 alunos, o que resultou em mais de 320 imagens nas paredes do Contagiarte, no Porto, na expoxição final (e uma lista de espera de 200 pessoas). Durante estes meses vive quase só para o curso. “Tive de rejeitar trabalhos porque não tinha capacidade de resposta.” Agora, já estão abertas as inscrições para o próximo, que arranca em finais de Setembro — no Contagiarte, entidade com que já colabora há dez anos, mas também no seu próprio espaço, o Estúdio 151.

Viver da fotografia “não é nada fácil”, diz. “Tenho, infelizmente, imensos colegas que têm imenso talento e não têm trabalho. Eu vivo para o trabalho. Sete dias por semana, meses a fio, sem qualquer pausa e a dormir muito pouco. Isso proporciona-me resultados.”

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