A luta pela alma da União Europeia

A tensão entre órgãos de cariz mais intergovernamental (os Conselhos) e órgãos de cariz mais federal (a Comissão e o Parlamento Europeu) está no cerne das principais tensões institucionais que hoje afligem a União Europeia

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futureatlas.com/Flickr

Neste momento, trava-se uma importante batalha entre o Conselho Europeu e o Parlamento Europeu. Em causa encontra-se quem deverá ser escolhido como novo Presidente da Comissão Europeia. Mas não só. Encontra-se também o equilíbrio de forças institucional entre o Conselho Europeu e o Parlamento Europeu. No fundo, entre uma visão mais intergovernamentalista e uma visão mais federalista da União Europeia.

O Tratado de Lisboa prevê que o Conselho Europeu deve nomear, por maioria qualificada, e com base nos resultados das eleições europeias, um candidato a Presidente da Comissão, que o Parlamento Europeu depois aprovará (ou não). Nas últimas eleições europeias, cada partido europeu apresentou o seu “candidato” à presidência da Comissão. A maioria dos grupos parlamentares europeus (embora não todos) declarou que apenas aprovaria algum desses candidatos.

As eleições europeias foram ganhas pelo PPE. Assim, o Parlamento Europeu, e não só, tem vindo a pressionar o Conselho Europeu para nomear Jean-Claude Juncker, o candidato indicado pelo PPE, para que este procure, em primeiro lugar, obter uma maioria que o aprove no Parlamento Europeu. No entanto, existe forte resistência ao nome de Juncker em círculos eurocéticos, devido em parte às suas posições, vistas como demasiado federalistas. Por outro lado, esta nomeação abriria um precedente político importante, inclinando a balança institucional para o lado do Parlamento Europeu.

Quando surgiu nos anos 70, aquilo que viria a tornar-se no Parlamento Europeu não tinha qualquer relevância institucional ao nível do processo de tomada de decisão europeu. Ao longo das décadas, no entanto, o Parlamento Europeu tem assumido competências cada vez mais relevantes. A este fortalecimento do Parlamento Europeu não foi alheia a crítica de falta de democracia no funcionamento das instituições europeias – o chamado “défice democrático”. Dar maiores poderes legislativos e de controlo político da Comissão ao Parlamento Europeu tem sido a forma mais emblemática de lidar com essa crítica.

A tensão entre órgãos de cariz mais intergovernamental (os Conselhos) e órgãos de cariz mais federal (a Comissão e o Parlamento Europeu) está no cerne das principais tensões institucionais que hoje afligem a União Europeia. A batalha sobre a nomeação e aprovação do Presidente da Comissão mostra o quão longe o Parlamento Europeu já chegou após inícios humildes. E tem algum precedente na forma como o Parlamento Europeu reagiu no passado à nomeação de candidatos a Comissários que considerava pouco qualificados para o efeito, ameaçando não aprovar a Comissão como um todo.

Diversos argumentos têm sido apresentados de um lado e de outro, defendendo ou criticando a posição do Parlamento Europeu. Ninguém ignora, no entanto, a relevância deste braço de ferro institucional. Em causa está a alma, intergovernamentalista ou federalista, da União Europeia.

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