Ser cientista é abdicar, e muito

A ciência está em perigo. O financiamento público não abunda, e temos de encontrar alternativas. Não está fácil, mas esta palavra nunca fez parte do nosso dicionário

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Snre/Flickr

Ser cientista é abdicar, e muito. Ser cientista é adorar o trabalho que se faz (cliché?, mas é verdade). Ser cientista é ser-se um ginasta do tempo e esperar trabalhar longas horas sem picar o ponto.

A maioria nasce com este bichinho inquisidor. Uns, desde pequenotes preferem as experiências explosivas, outros os números ou os planetas, outros preferem apanhar sapos mesmo que levem raspanetes das mães! De certeza que dentro de cada um de nós, cientistas, há uma primeira memória que terá sido o inicio de tudo. Recordo perfeitamente a minha primeira memória “cientista”. Tinha 8 anos e estava numa livraria com o meu pai e vi este livro. De alguma maneira fascinou-me. Era sobre plantas e os insectos que as polinizavam. Não consegui desprender a minha atenção para com aquele livro, recheado de imagens que me cativaram e perguntei ao meu pai: “Podemos levar este livro?”. E levámos. Feliz e sorridente, lembro-me de abraçar aquele livro como se um novo amigo fosse. Ainda hoje o tenho.

Os anos passaram e o meu interesse pela biologia continuou a crescer, e transbordou até chegar ao secundário, e aí tinha certeza que sim; queria ser bióloga quando fosse uma pessoa “grande”. Hoje sou entomóloga(cientista que estuda os insectos) e estudo insectos polinizadores. Engraçado, que depois de passar por várias áreas de interesse dentro da biologia, parece que desde aquele dia onde tinha 8 anos, no fundo, sabia que queria para todo o sempre estudar os insectos polinizadores e a relação amorosa que eles têm com as flores. Querer estudar e conservar estas criaturas é um dos meus grandes desafios como cientista.

A primeira memória

Nos dias de hoje, a ciência está em perigo. O financiamento público não abunda, e temos de encontrar alternativas. Não está fácil, mas esta palavra nunca fez parte do nosso dicionário. Alguns infelizmente desistem, porque, sim, é desgastante. E com o tempo, a instabilidade que é adereço na nossa vida, torna-se um peso demasiado doloroso, e há responsabilidades que não podem esperar os resultados daquela bolsa.

Os tempos podem ser negros, mas vamos lutar contra isso. A Ciência é um pilar chave da nossa sociedade. É importante que todos percebam isso. Assim, comunicar ciência, também se torna cada vez mais imperativo e valorizado pela comunidade científica. Explicar ao público em geral o que fazemos, porque o fazemos e onde a sociedade tem benefícios com essa investigação é outro desafio. Este sim é um desafio que alegremente nos bateu à porta.

Ser cientista é rir e dar pulos de alegria quando temos aqueles resultados! É ter dias maus, muitos. Mas quando temos os bons? Ninguém nos pára. Ser cientista é nunca esquecer aquela primeira memória. 

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