Duas portuguesas e um escocês escreveram “Troikapocalypse” para explicar a crise

A seis mãos, escreveram um livro em inglês para explicar a crise e ajudar uma geração. “Troikapocalypse” está à venda na Amazon

Foto
Rita, Gary e Inês, os autores do livro Rui Gaudêncio

Quando o escocês Gary Dougall perguntou no Facebook às irmãs Rita e Inês Costa como estava a situação económica em Portugal, mal sabiam — ele e elas — que estavam a começar um livro. “Troikapocalypse”, livro-desafio-"básico-económico-humorístico” à venda na Amazon, partiu dessa mesma conversa. “Tornou-se muito complicado explicar, a conversa durou horas”, recorda Rita, em entrevista ao P3 pelo Skype, já com o livro na mão, PDF no computador e à solta por aí.

Tradutora de formação, controladora de tráfego áereo de profissão, Rita, agora com 30 anos, queria fazer “qualquer coisa diferente” em 2012. Os três juntaram-se (virtualmente, já que Rita era a única que estava em Portugal) e, abusando do Google Docs, escreveram um primeiro livro em inglês, em formato e-book, chamado “Damn It!”, um manual de “drinking games” para melhor acompanhar séries como “24”, “Dexter” ou “Californication”.

A “brincadeira” correu bem — tão bem que a “vontade de explicar a crise de uma perspectiva humorística a pessoas que não são de Gestão ou Economia” se concretizou neste segundo livro, lançado em Outubro. Também totalmente em inglês (está dirigido a um “público internacional” porque os portugueses, bem ou mal, “já sabem o que é a crise e o que se está a passar”), escrito a seis mãos no Google Docs, “Troikapocalypse” é ainda o resultado directo de uma campanha de “crowdfunding” na plataforma Indiegogo que reuniu 2.307 dólares dos 3 mil solicitados. Graças a este apoio, o livro foi impresso, com direito a ISBN, numa parceria com a Lulu, onde também está à venda, tal como na Amazon, que também distribui o formato electrónico, lançado no site em finais do ano passado.

Foto
O livro tem 24 capítulos e mais de 200 páginas Rui Gaudêncio

“The over-qualified studious ‘idiot’”

Foto
Os três quando receberam a primeira cópia física do livro DR

O título, assumidamente “provocatório”, tal como toda a prosa, refere-se não tanto ao potencial colapso da União Europeia (UE), mas principalmente ao afamado fim do mundo previsto para 21 de Dezembro de 2012. Não se concretizou, ficou o mote, bem visível no subtítulo: “How To Survive The Economic Crisis”. Vinte e quatro capítulos, os primeiros dedicados ao contexto histórico e social actual, outros mais vocacionados para a procura de emprego e respectiva fuga ao desemprego. “Nós não somos economistas”, ressalva Rita. “O livro cai numa área que não é ficção, mas também não é um livro técnico.”

O livro faz o serviço público que os média deveriam fazer?

É também a vida deles e de outros desta geração entre os 20 e os 35 anos, encalhada num “sentimento de desilusão”, que preferiu ser o “estudioso idiota sobre-qualificado” (“the over-qualified studious ‘idiot’”) ao invés do “espírito livre”, que já sabe que nunca vai conseguir fazer nada da vida (“the ‘you will never accomplish anything in life’ free soul”), mas que hoje já terá poupado mais dinheiro com o trabalho no centro comercial. Ok, estamos em crise. Quem culpar? Respostas dadas no capítulo 5 (“Who do we blame?”) — não, não vamos ser “spoilers”. Depois, adivinham-se soluções: Em quem votar? E, no final, quem se salvará deste “troikapocalypse”? Possivelmente, os “geeks”, mote do 8.º capítulo. “Toda a gente tem salvação”, diz Rita, um pouco mais optimista. “As pessoas não se podem é contentar com pouco e ter aquela mentalidade de que as coisas podem ficar piores. (...) Não podem baixar os braços, quanto mais não seja para não deprimir.”

Se tivesse ficado na minha área de formação seria uma idiota sobre-qualificada, diz Rita, tendo em conta a situação portuguesa

Há uns quantos capítulos em “Troikapocalypse” sobre isso, aliás. Diz Rita que, de todos os comentários que tem recebido, o que mais gostou foi ouvir amigos do estrangeiro exclamar coisas como “finalmente, percebi a crise!” ou “já sei quem é Angela Merkel, o que é a troika, o que se passa na UE e na Grécia”. “O nosso objectivo principal era informar as pessoas.”

Rita deixa um conselho para os jovens portugueses que estão no desemprego

Do mesmo modo, a irmã Inês, a principal responsável pelas dicas para melhorar currículos e cartas de apresentação (capítulo "Pimp Your Life"), tem recebido solicitações para rever os CV de amigos e conhecidos (abaixo o formato Europass, diz o livro). A procura de trabalho, sugestões de entretenimento a baixo (ou zero) custo, conselhos para emigração, possibilidades de mudança de carreira e ideias para negócios paralelos são outros temas úteis e amplamente desenvolvidos. Profissões de futuro? Só dizemos duas: político (mas nunca na Islândia, onde, “horrivelmente”, os “políticos roubam e vão para a prisão”) e agente funerário (por razões óbvias).

Sugerir correcção
Comentar