Uma história com tulipas

A meio do século, as tulipas já eram cotadas na bolsa e ofereciam-se grandes prémios pelo desenvolvimento de variedades novas e raras de tulipas

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Tobias Schwarz/Reuters

Numa livraria encontrei há dias o livro "A Tulipa Negra", de Alexandre Dumas. Li-o na adolescência, numa coleção de clássicos juvenis, e nunca mais esqueci a violência do primeiro capítulo, sobre um dos episódios mais sangrentos da História dos Países Baixos, e o fascínio da história de Cornelius van Baerle, um floricultor preso e condenado à morte, sem qualquer culpa, cujo único sonho da atrás da grades é fazer crescer a tulipa negra perfeita. Este sonho explica-se no seu contexto histórico: a grande febre das tulipas da Europa do século XVII.

Esta flor, originária da Turquia, havia sido descoberta pelo naturalista Conrad Gesner num jardim de Augsburgo e rapidamente se tornou na flor da moda, cobiçada por todas as famílias ricas da Alemanha e da Holanda. Quem não tivesse uma tulipa era olhado de lado, como tolo ou pobretanas, e o preço da flor depressa atingiu níveis estratosféricos.

Conta-se que um mercador de Harlem chegou a pagar metade da sua fortuna por um bolbo a fim de o exibir aos amigos. E a popularidade da tulipa não se devia à sua beleza nem odor, mas à dificuldade do seu cultivo, que a tornava preciosa aos olhos dos floricultores, embora facilmente os menos conhecedores confundissem bolbos de tulipa com meras cebolas, o que podia gerar danos tanto ao bolbo como àquele que o resolvesse usar para temperar a salada.

A meio do século, as tulipas já eram cotadas na bolsa e ofereciam-se grandes prémios pelo desenvolvimento de variedades novas e raras de tulipas. E era com um desses prémios que o encarcerado van Baerle sonhava.

No entanto, a febre, como todas as febres, durou pouco, e os mercados acabaram por descobrir que a riqueza das tulipas era afinal de contas a riqueza de coisa nenhuma. Exigiu-se a intervenção do Estado para resolver a situação, mas o Estado não podia socorrer a loucura de uma sociedade inteira, e quem tinha trocado casas, joias e fortunas por alguns bolbos, viu-se por fim sem nada para comer a não ser os próprios bolbos. E o nosso herói van Baerle?

Cabe ao livro de Dumas contar o que lhe aconteceu. Mas posso adiantar que o nosso floricultor encarcerado, tal como os seus compatriotas holandeses, também acabou por ganhar algum juízo.

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