Dentistas do Bem tratam de graça bocas a jovens

Há dois anos em Portugal, a organização criada no Brasil já realizou tratamentos a mil jovens

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Mohamed Nureldin Abdallah/Reuters

Crianças e jovens sem escovar os dentes por falta de dinheiro para a pasta dentífrica e famílias que partilham uma só escova são situações com que os Dentistas do Bem se deparam nas consultas gratuitas que oferecem aos mais desfavorecidos.

Há dois anos em Portugal, a Turma do Bem — uma organização criada no Brasil que proporciona cuidados dentários às crianças e jovens carenciados nesse país, na América Latina e em Portugal — já realizou tratamentos a mil jovens. Os tratamentos são feitos gratuitamente nos consultórios dos cerca de 400 médicos que aderiram à iniciativa: os Dentistas do Bem.

As crianças e os jovens são escolhidos durante uma triagem que é realizada por um profissional de saúde e um elemento da Turma do Bem, os quais se deslocam a instituições e escolas para averiguar quem precisa de cuidados dentários e não os pode pagar. A agência Lusa acompanhou uma dessas visitas ao Lar António Luís Oliveira, uma instituição que acolhe irmãos, dos três aos 18 anos, enviadas pelos tribunais e provenientes de famílias desestruturadas.

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A visita da dentista Virgínia Milagre foi recebida com euforia e vários foram os jovens que se prontificaram a abrir a boca e a ouvir a “sentença” da médica. Alguns já estão a ser seguidos nos consultórios destes profissionais e mostraram saber “a lição”: “Escovar os dentes a seguir às refeições”. No final da triagem, Virgínia Milagre salientou à Lusa o esforço que a instituição tem feito para dar os melhores cuidados a estes jovens, mas foi o próprio director do Lar, António Henrique, que reconheceu que sem esta ajuda os jovens dificilmente seriam tratados.

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Alguns dos tratamentos passam por intervenções cirúrgicas e a colocação de aparelhos que são proporcionados gratuitamente. António Henrique frisa que estes cuidados são ainda mais importantes, tendo em conta a aproximação da idade para os jovens entrarem no mundo laboral. “Tentamos que estes jovens tenham cursos profissionais para serem integradas no mercado de trabalho e sabemos que os entrevistadores têm em atenção a sua postura e também a sua dentição”, disse.

É o Bilhete de Identidade

Daniel, de 16 anos, um dos jovens prestes a procurar emprego, receava não conseguir concretizar o seu sonho de “servir às mesas” por causa do mau estado em que tinha a dentição. Virgínia Milagre ainda se lembra quando o Daniel se sentou na sua cadeira de dentista: “Ele vinha num estado deplorável, com cáries, raízes retidas. É um indivíduo que tem vindo pontualmente, não falta e cumpre o programa. Tem parte do tratamento feito, mas ainda muito para fazer”. A intervenção no Daniel visou, inicialmente, aumentar a sua autoestima: “É a fachada, o Bilhete de Identidade, o sorriso dele”. Apesar de confessar que ficou surpreendido com tão elevado número de visitas ao dentista, Daniel é hoje um jovem agradecido e com “mais um motivo para sorrir”.

A dentista sente-se reconhecida ao ver o antes e o depois, um final feliz que não apaga a lembrança dos casos graves com que esta profissional se depara nas triagens. “A situação das crianças é má. Trabalhamos num meio em que procuramos crianças desfavorecidas, sem cuidados higiénicos. Alguns disseram-nos que não tinham escova nem dentífrico porque não tinham dinheiro ou que a escova era para a família toda”, contou.

Camila Carnicelli, gestora da Turma do Bem em Portugal, sublinha a generosidade dos dentistas portugueses, sem a qual estes mais de mil jovens não teriam certamente acesso a cuidados de saúde oral. Em Portugal, foi surpreendida com a quantidade de jovens que, aos 12 anos, já não têm dentes definitivos. “É uma realidade muito dura e muito difícil. Simplesmente eles arrancam os dentes, pois têm dores e não têm dinheiro para os tratar”.

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